A história da família Sparremberger na atividade leiteira tinha tudo para não dar certo, como relata a médica veterinária Eduarda Cristina: “Temos a propriedade há 12 anos. Viemos da cidade de Xavantina (SC) para a zona rural. Eu e minha mãe, Edriane, vivíamos basicamente no centro urbano. O projeto começou mesmo por causa de um desejo de meu pai, Nilson, que há tempos planejava sair um pouco da área comercial. Ele acabou adquirindo a Fazenda Estrela do Oeste, em Xaxim (SC), mas continuava tocando os negócios paralelamente na cidade”, diz Eduarda.
Em 2015, a família de produtores encontrou a primeira dificuldade em conseguir mão de obra contratada e, por essa razão, acabou assumindo os trabalhos na fazenda praticamente sozinha. “Isso partiu muito por parte de minha mãe, que ficou à frente dos negócios, sobretudo da atividade leiteira, uma vez que meu pai nunca teve muita afinidade com vacas, porque sua aptidão sempre foi a avicultura”, conta Eduarda, lembrando que a ideia do pai era vender as vacas, quando ela se formasse em medicina veterinária pela Unoesc de Xanxerê: “Não concordei, já que estava bastante envolvida com a produção leiteira. E isso gerou certo atrito entre nós, o que é algo normal, pois, na maioria dos casos que conheço, os projetos nunca começam em plena harmonia. Ou seja, é comum acontecerem algumas ‘brigas’ entre gerações”, brinca a jovem produtora.
Como Eduarda e seu pai não estavam se acertando, ela resolveu fazer estágio em outras propriedades da região, por alguns anos. “Mas como meu pai não contava com respaldo técnico e eu não estava sempre à disposição, nossas conversas foram evoluindo, até nos tornarmos sócios, logo após eu terminar a faculdade de veterinária”, conta ela, acrescentando que passou a gerenciar boa parte dos negócios da família
Com essa estratégia adotada pela família Sparrembeger, Eduarda, que desde os 15 anos ajuda nos negócios da família, comanda a pecuária de leite, com apoio da mãe, enquanto seu pai coordena a avicultura e a lavoura (milho e aveia) voltada para alimentar os bovinos. A propriedade conta com 72 hectares de área e, atualmente, contabiliza 51 vacas em lactação. A produção de leite supera os 40 mil litros/mês.
“Quando decidi retornar para a propriedade, em 2019, começamos a investir com mais seriedade na atividade leiteira, sabendo aonde poderíamos chegar. Até então, meu pai tocava a fazenda da forma que conseguia, sem muita objetividade”, assinala Eduarda, observando que nesse período começara trabalhar na ATeG/Senar-SC, conciliando essa atividade com o trabalho na Fazenda Estrela do Oeste.
Em sua análise de extensionista da ATeG, ela nota que um dos principais motivos para fazer com que o filho de produtor de leite fique na propriedade, hoje, não é tanto a questão da qualidade de vida, ou financeira, mas sim a importância de haver confiança de pai para filho, de dar liberdade para o jovem se sentir valorizado dentro da fazenda.
“Às vezes, o desestímulo é ver que o filho quer fazer alguma coisa, pensando em melhorar o desempenho da propriedade, mas é barrado pelo pai. Recentemente tive um caso entre pai e filho, em que o jovem só queria mudar a ração pré-parto, mas o pai não permitia fazer essa alteração, sendo que o rapaz está lá todo dia trabalhando na produção. São tais atitudes que desestimulam as novas gerações, pois os pais não acreditam na capacidade dos filhos de assumir responsabilidades.”
CAPACITAÇÃO, TECNIFICAÇÃO E DEFINICÃO DE LIMITES PARA AVANÇAR NO NEGÓCIO LEITE
Segundo Eduarda Sparremberger, a capacitação técnica e gerencial é indispensável em qualquer sistema de produção leiteira para obter produtividade e lucratividade, com base no profissionalismo. “É preciso muito conhecimento. Adotamos novidades e experiências em nossa propriedade, que vivenciei tanto durante minha formação na Unoesc, como trabalhando como técnica de campo pela ATeG, atendendo cerca 25 famílias produtoras na região de Chapecó (SC). Isso tem comprovado como a tecnificação é fundamental.”
Segundo relata Eduarda, ela era muito imediatista quando assumiu os trabalhos na fazenda, aos 21 anos, mas logo foi percebendo que esse não era o melhor caminho. “Por isso a sucessão deu certo. Não só porque o meu pai mudou, mas também porque mudei nessa trajetória. Tanto que, hoje, já consigo lidar com os negócios, com as pessoas envolvidas no projeto, de uma forma mais madura e tranquila. Por aqui, dizemos que houve uma transformação mútua entre a gente, nunca unilateral”, destaca.
Hoje, há delimitação dos setores, cada um dos sócios ficando a cargo daquele no qual tem mais experiência e afinidade. “Por exemplo, se amanhã eu decidir trocar a empresa que fornece ração para as vacas, meu pai vai dar a opinião dele, mas a decisão final é minha. Outra situação parecida aconteceu recentemente, quando meu pai trocou o fornecedor do alimento do aviário. Ele me mostrou as três propostas, trocamos ideias e a decisão final dele foi respeitada”, explica Eduarda.
Ela observa que esse é o grande diferencial da fazenda, a troca de ideias e o respeito entre eles, tendo sua mãe como conciliadora para tudo chegar a termo. “Além disso, meus pais são formados em administração de empresas, e minha mãe é responsável por toda parte de ordenha e de cria, trabalhando diretamente com os funcionários com a mão de obra contratada.”
Unidos contra os desafios – As transformações que ocorreram num ritmo rápido na propriedade de Xaxim, nesse processo sucessório, e a adoção de novas tecnologias juntamente com uma gestão profissionalizada, têm contribuído bastante para superar os desafios impostos nos últimos dois anos, como a estiagem que castigou a região.
“Com os entraves da seca, nossa produção de volumoso foi bastante comprometida e o pouco que conseguimos colher tinha qualidade muito baixa. Isso encareceu sobremaneira a dieta dos animais, tanto que, hoje, a gente precisa comprar muitos produtos de fora, inclusive volumoso e trabalhar com muito concentrado”, diz Eduarda, notando que está, por causa disso, uns dois anos atrasada no projeto inicial, que era encerrar 2021 com 60 vacas em lactação, meta que só vai concluir este ano.
Aliás, o projeto da Fazenda Estrela do Oeste para o ano que vem seria 120 vacas em ordenha, mas provavelmente serão 80 animais, uma vez que a família Sparremberger precisa avançar conforme a disponibilidade de volumoso. “A gente também adquiriu animais de fora, que era o plano, porém numa escala bem menor do que desejávamos, visto que não tínhamos comida suficiente. Depois, a estiagem afetou também a parte reprodutiva, já que a reprodução praticamente entra pela boca. Quando não se consegue oferecer um alimento de qualidade, não tem como a parte reprodutiva ficar 100%”, explica Eduarda.
De acordo com a produtora, a fazenda vinha de uma situação relativamente confortável do ponto de vista econômico, já que em anos anteriores o investimento na pecuária de leite tinha sido baixo. Assim, havia um pouco de reserva de caixa para manter a propriedade funcionando, e, mesmo com alguns meses fechando as contas no vermelho, dava para ter o giro de caixa.
“Contudo, o nosso custo por litro de leite é alto, não está dentro do que a gente gostaria. Além disso, ainda temos quase 50 animais sem produzir leite dentro da propriedade, e isso é um volume muito grande, considerando que o nosso rebanho da raça Holandesa contabiliza 110 animais. Tudo isso pesa bastante no caixa da fazenda, mas a gente entende que tal situação é por um futuro melhor, pois sabemos que essas vacas estarão parindo e o jogo vai virar em breve”, diz ela.
ADOÇÃO DE TECNOLOGIAS TRAZ BONS
RESULTADOS EM POUCO TEMPO
Nos últimos dois anos, a Fazenda Estrela do Oeste tem melhorado a recria, investindo em tecnologias reprodutivas como IATF (inseminação artificial em tempo fixo) e FIV (fertilização in vitro), utilizando uma rodada de sêmen sexado nas novilhas da raça Holandesa, que culminou com o nascimento de muitas novilhas, de mesmo lote contemporâneo, no qual estão trabalhando a reprodução desse rebanho. “Graças a isso, a gente já tem novilhas emprenhando com 12 meses, que vão parir supercedo, sendo algo que não acontecia anteriormente. Conforme esses animais vão parindo, o nosso fluxo de caixa vai ficando mais leve também, pois atualmente preciso fornecer sal mineral, pré-secado e concentrado para esses animais, que é um valor bem alto”, calcula a sócia da propriedade.
Hoje, a família Sparremberger conta também com a plataforma de gestão do Ideagri, que, segundo Eduarda Cristina, mudou completamente sua percepção sobre o rebanho. Todos os dias, ela entra no software, identifica os animais que estão com a reprodução atrasada, os que foram inseminados, bem como aqueles que carecem de cuidados especiais.
“Os indicadores possibilitam a tomada de decisão mais precisa, assim como uma melhora nos resultados da propriedade. A minha mãe sempre foi muito boa em anotar os dados do plantel, mas faltava fazermos a gestão das informações coletadas. Agora, com os dados compilados pelo software, consigo enxergar o que está acontecendo na propriedade e ajustar os principais pontos que precisavam ser melhorados: recria e a reprodução”, destaca a produtora.
Há dois anos, o rebanho está 100% confinado em compost barn, com sistema de aspersão e ventilação, que, na avaliação da Eduarda, foi o principal ponto para a melhora da qualidade de vida de sua família e dos funcionários, bem como do conforto dos animais.
Conforme a gestora do setor leiteiro, a propriedade é bem recente com relação aos investimentos em tecnologia, mas já avançou em muitos aspectos rumo ao melhor desempenho, produtividade e qualidade do leite. Já dispõe de algumas soluções, como medição eletrônica do leite, que é muito mais precisa; análise individual de CCS, de gordura, de proteína e ureia, que viabiliza ajustes na nutrição do rebanho, e a prática da secagem das vacas.
“Além disso, trabalhamos com a ferramenta da OnFarm, que possibilita fazer o isolamento da cultura bacteriana dentro da propriedade, com resultado em 24 horas, e controlar mais efetivamente a mastite. Essa ferramenta agilizou muito o processamento das amostras na fazenda”, destaca ela.
Atualmente a dieta fornecida para o rebanho é na forma de TMR (ração total misturada), utilizando vagão forrageiro, que é um modelo lançado recentemente, adquirido há cerca de 18 meses. “Estamos empregando a técnica do plantio direto de milho para a produção de silagem. Lembrando também de como não tínhamos muito foco no leite antes de eu assumir a gestão do setor, metade dos serviços de produção de alimento era terceirizada. Porém, já no último ano, a gente conseguiu tomar conta dessas tarefas para reduzir os custos de produção.”
Metas da Estrela do Oeste – O objetivo, até 2025, é trabalhar com cerca de 120 vacas em lactação. Para isso acontecer, será preciso construir um galpão específico para cria e recria, que será iniciado no próximo ano. Além disso, a fazenda tem o objetivo de ser autossuficiente na produção de volumoso, contando também que o clima na Região Sul do Brasil seja adequado.
“Temos outras atividades na propriedade, porém o nosso foco atualmente é o leite, destinando boa parte dos investimentos à atividade. Por isso, um dos objetivos é o meu retorno para casa, que sempre falo que é o meu sonho, e aplicar tudo o que aprendi trabalhando pela ATeG. Junto a esse sonho, vem outro um pouco menor, que é trabalhar com gado de corte também. Já em 2023, vamos organizar esse projeto, claro, numa escala menor”, arremata Eduarda.
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