balde branco

Animais do Tambo Rhoden, em Salvador das Missões-RS

LEITE NO RS

Avanços em meio a desafios

Produção gaúcha recua, mas existem ganhos na produtividade, na formalização e nos resultados iniciais de aplicação das INs 77/76

Luiz H. Pitombo

A  pecuária de leite no Rio Grande do Sul vive um processo intenso de seleção e especialização dos produtores, exigindo, dos que ficam, escala, maior produção por animal e o correto gerenciamento. Os preços pagos pelo leite têm preocupado os produtores, como também a falta de mão de obra, reflexo em boa parte da questão da sucessão familiar, quando os filhos não mais desejam ficar na atividade, limitações estas que são trabalhadas pela extensão rural. Mas representantes do setor não perdem de vista o potencial de desenvolvimento existente no estado e na região Sul.

Em 2018, último dado oficial disponível referente à Pesquisa Pecuária Municipal (PPM/IBGE), o estado produziu 4,2 bilhões de litros de leite, com redução de 2,7% sobre ano anterior, mantendo sua participação na região em 37%. O número de vacas ordenhadas recuou bem mais, 6,8% sobre 2017, porém registrou-se um aumento da produção por cabeça para 3.441 litros de leite/ano, ou seja, 4,3% maior. O maior rendimento médio obtido no estado foi no município de Xanxerê, com 6.300 litros/ano.  O leite com inspeção, por sua vez, beirou a 80% do volume total produzido no estado, com aumento de 1,4 ponto percentual sobre o ano anterior. 

“Nos últimos tempos o número de produtores tem diminuído em 8.500 ao ano. Se em 2015 eram 84 mil no estado vinculados às cooperativas e laticínios, em 2017 ficaram em 67 mil, com redução de 20%”, afirma o zootecnista Jaime Ries, da Emater-RS e responsável pela coordenação dos trabalhos com pecuária de leite no estado.  Ele conta que em breve será apresentado um novo perfil da atividade no Rio Grande do Sul e que esses números serão atualizados, estimando que possam atingir 50 mil produtores formalizados em 2019.

O maior contingente de abandono da atividade ocorre com os produtores familiares até 100 litros/dia e com as propriedades de porte médio, que não possuem condições de ganhar escala. Os que ficam, segundo Ries, têm aumentado sua produção na média de 20 litros de leite/dia.  Ele informa que 96% dos produtores já possuem meios de resfriar o leite e que tem melhorado o sistema de ordenha e também a mecanização. A contagem bacteriana total (CBT) abaixo de 300 mil foi atingida por cerca de 90% dos produtores, com a vigência das INs 77/76, percentual que é considerado bom e que deverá subir.

O tamanho médio das propriedades leiteiras gaúchas é de 19 hectares no total, área reduzida que tem levado à intensificação dos sistemas de produção com o compost barn, que é o que mais cresce. “Isso quando existe gente jovem para tocar o negócio”, afirma.

TENDÊNCIA É DE INTENSIFICAÇÃO DA PRODUÇÃO COM A ADOÇÃO DO SISTEMA DE CONFINAMENTO COMPOST BARN

Entre 40% e 45% de propriedades não estão com a questão da sucessão familiar resolvida e, quando permanece só o casal de certa idade, este não se interessa em investir. “Temos trabalhado muito nisso, mostrando aos jovens que a atividade leiteira bem conduzida é um negócio muito bom”, avalia o zootecnista. Ao melhorar os resultados da atividade também é possível investir e mecanizar, reduzindo a limitação de mão de obra. Também está sendo bem trabalhada no estado a sanidade do rebanho, que conta com fundo indenizatório para os casos de abate sanitário.

O coordenador da Emater/RS indica que produtores precisam buscar eficiência e que podem receber assistência técnica para aumentar a produção para muito além dos 100 litros, alcançando até mil litros/dia. No entanto, adverte que “isso só não adianta se não houver consumo no País, que tem caído e pode levar o produtor a uma situação ainda pior por redução de preços pela maior oferta”. Aumentar a produção considerando a exportação também diz que é arriscado – será ideal só quando o País tiver bom volume sendo vendido ao exterior, para vários mercados.

ARQ. EMATER-RS

“96% dos produtores já possuem meios de resfriar seu leite e têm melhorado o sistema de ordenha e a mecanização.”
Jaime Ries

Conquista paulatina – “Os diversos agentes da cadeia precisam estar harmonizados para exportar. De imediato, trabalhamos nichos de mercado para depois pensarmos no médio e longo prazos. É um trabalho a ser feito passo a passo”, afirma Alexandre Guerra, presidente do Sindicato da Indústria de Laticínios e Produtos Derivados do Estado do Rio Grande do Sul (Sindilat/RS). Para dar apoio às pequenas e médias empresas na exploração de novos mercados, foi contatada a Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex-Brasil).

Ele conta que o Rio Grande do Sul já é um exportador para outros estados, atingindo 60% do volume processado, mas que em termos de país ainda somos importadores. Ele defende que é necessário dar competitividade ao setor por intermédio da conquista de maior produção animal e por propriedade, diluindo custos até a indústria.

“O estado  tem atuado muito forte com foco na sanidade, em  especial contra tuberculose e brucelose, que  têm reflexos também no mercado externo”
Alexandre  Guerra

Mas a questão, como diz, ultrapassa o âmbito do produtor e da indústria e chega ao governo, com a necessidade de melhoria das estradas, energia elétrica, simplificação e redução de tributos. 

“Reivindicamos também um Prêmio de Escoamento da Produção, PEP, como forma de compensar limitações de logística”, diz. O dirigente demonstra igualmente preocupação com o acordo Mercosul/União Europeia e a concorrência que será gerada sem condições de igualdade.

Existem no Rio Grande do Sul laticínios de diferentes portes e origens, incluindo os multinacionais, “que veem no estado e na região Sul uma grande oportunidade de negócio, por seu foco cultural na produção de leite”, comenta.  O dirigente estima que a capacidade ociosa do setor esteja entre 20% e 25% em certos períodos do ano e, quanto às margens de 2019, “estiveram bem justas, como também a dos produtores pela situação econômica do País e queda no consumo”, diz.

Quanto à adaptação da indústria às INs 77/76, Guerra diz que em sua quase totalidade ela atendeu aos requisitos de temperatura no transporte.  Guerra reconhece que o clima ameno ajudou para isso e que, no período quente, se terá um novo desafio.  Em relação aos produtores, conta que foi realizado um intenso trabalho de campo com resultados positivos já nas avaliações iniciais e que, com o novo cálculo que será realizado, acredita que menos de 6% vão enfrentar problemas em relação à CBT, que representa a linha de corte. Este é um diferencial a ser explorado visando a outros mercados, como salienta.

No suporte ao produtor, informa que foi grande a adesão ao programa Mais Leite Saudável no estado, quando recursos tributários originários dos laticínios podem ser aplicados em assistência técnica e gerencial aos produtores. “O estado tem atuado muito forte com foco na sanidade, em especial contra tuberculose e brucelose, que têm reflexos também no mercado externo por barreiras sanitárias.” 

Dificuldades e demandas – O produtor Leonel Rodrigues Fonseca, coordenador da Comissão de Pecuária de Leite da Federação da Agricultura do Rio Grande do Sul (Farsul), aponta sérias dificuldades por quais passa o produtor no estado, reiterando a questão dos preços praticados abaixo dos custos de produção e a posição adotada pela indústria. A questão da entrada no País de produtos importados do Mercosul e da União Europeia igualmente traz preocupação pelo impacto na economia do setor. 

“Necessitamos de condições para concorrer, por meio de preços competitivos de insumos, desoneração no uso da energia elétrica e combustíveis”, diz Fonseca. Ele também defende outro tipo de seguro agrícola para as propriedades que produzem alimentação do rebanho. “Quando há perda de uma lavoura de milho, perco duas vezes, na silagem e no leite que ia tirar lá na frente”, explica. 

 

Fonseca avalia que os produtores gaúchos têm recebido assistência técnica por meio da Emater, do Senar/Sebrae e de indústrias com ênfase no gerenciamento. No entanto, diz que existem aqueles que se encontram acomodados, sem disposição de mudar. “A tecnologia existe, mas não está sendo aproveitada”, lamenta.

Sobre os avanços na melhoria da qualidade do leite, reconhece a situação favorável dos gaúchos, já identificada nesta fase inicial de adoção das INs 77/76. Mas aponta duas questões que preocupam. A primeira é referente a certas cooperativas, indústrias e pecuaristas que querem postergar a implantação das INs. “O que se cobra é higiene do produtor, afinal o leite é um alimento”, enfatiza. Ele também fala da necessidade de uma linha de financiamento para a aquisição de resfriadores.

Outro aspecto que lamenta é quanto ao contraste que existe na aplicação prática da nova legislação, considerando que, enquanto os estados do Sul avançam, vários estão longe da sua real aplicação.

Como elo mais fraco da cadeia, diz que o produtor precisa se fortalecer e melhorar a relação com a indústria, pois reconhece que um necessita do outro. O coordenador da comissão aponta que foi criada a Aliança Láctea Sul-Brasileira, que procura unir numa mesma linguagem os produtores, a indústria e o governo.

A maioria dos produtores do estado é de propriedades familiares e indica que aqueles que se profissionalizarem vão continuar na atividade e “vamos sobreviver à crise”, afirma o dirigente.

O compost barn tem contribuído para o bem-estar animal e produtividade, como no Tambo Rhoden

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