balde branco

A sanidade do rebanho leiteiro está diretamente relacionada a protocotlos de vacinação voltados a cada categoria animal

PROTOCOLO DE VACINAÇÃO

Calendário de vacinação

não é receita de bolo

Os protocolos de vacinação integram as medidas de biosseguridade das fazendas. No entanto, segundo especialistas, cada produtor deve ter o seu próprio rito de vacinação para assegurar, efetivamente, a sanidade do rebanho leiteiro

Erick Henrique

O programa de vacinação recomendado por um médico veterinário a uma fazenda leiteira dificilmente surtirá o mesmo efeito positivo no rebanho de propriedades vizinhas. Quando se trata de sanidade, a complexidade desse tema, em si, não dá brechas para improvisos no combate às doenças que causam prejuízos, por vezes muito elevados, como a redução do desempenho zootécnico, quadros de surtos, mortalidade de animais e perdas econômicas que, em alguns casos, são irreversíveis, forçando o produtor a deixar a atividade.

“A vacinação dos animais para algumas doenças vai reduzir a possibilidade de transmissão. Consequentemente, o produtor reduz a circulação de agentes patogênicos na fazenda. Desse modo, o protocolo de vacinação é uma medida que entra conjuntamente com outras técnicas de biossegurança para manutenção da sanidade de bovinos leiteiros”, explica o médico veterinário e professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Rodrigo Otávio Silveira Silva.

De acordo com o professor, para evitar deficiências no manejo vacinal, um correto calendário de vacinação permite que o produtor de leite racionalize o uso das vacinas em bezerras, novilhas e vacas leiteiras. “A primeira coisa a se evitar é que o criador perca dinheiro vacinando em excesso; ele deve fazer a aplicação conforme as categorias, no tempo certo. Com isso, aumentam as chances de obter uma boa cobertura vacinal, que impede ou previne o contágio de doenças nas quais a fazenda esteja focando naquele momento”, diz Silva.

Na análise do veterinário, na pecuária leiteira existem inúmeras enfermidades a serem citadas e muitas delas variam por categoria animal. Dentre elas, vale destacar aquelas do trato reprodutivo: leptospirose, IBR, BVD, que causam impacto importante, até porque há uma prevalência muito alta no ambiente. “Além disso, as diarreias, principalmente em bezerras leiteiras, têm um efeito muito grande, com morbidade elevada e grande número de animais acometidos. É bom lembrar que mais de 50% dos bovinos terão pelo menos um quadro de diarreia ao longo da vida”, afirma o especialista da UFMG. Ele destaca também que a raiva ainda é problema na pecuária brasileira, bem como as clostridioses. “Penso que esses são os principais grupos de doenças nos quais a gente pode abordar em relação às vacinas e que são de alta prevalência nas propriedades rurais de todo o Brasil.”

Em linhas gerais, para a grande maioria das vacinas, o professor da UFMG informa que os veterinários devem realizar a revacinação do plantel. Caso contrário, não será possível garantir uma imunidade suficiente para prevenir doenças. Mas há exceções. Por exemplo, a vacina contra a brucelose, que o produtor pode optar por não revacinar.

Existe ainda a possibilidade de imunizar o animal na fase adulta, com uma vacina específica contra a brucelose, que não vai atrapalhar o diagnóstico dessa doença. No geral, ela pode ser feita com apenas uma dose. Portanto, para a grande maioria das vacinas, os médicos veterinários precisam fazer a revacinação.

 

Revacinação e vacinação de reforço – “É interessante diferenciar o que é revacinação da vacina de reforço. A maioria das vacinas precisa de uma dose de reforço, após 21 a 30 dias. Ou seja, o pecuarista precisa aplicar uma nova dose para reforçar o sistema imune, com intenção de mostrar uma resposta contra aquele antígeno. Já a revacinação é uma nova dose da vacina de tempos em tempos, que varia a cada seis meses a 1 ano, segundo a necessidade de cada rebanho leiteiro”, ressalta o professor da UFMG.

Para ele, o melhor a se fazer é seguir a bula de cada produto, bem como a recomendação do médico veterinário. Outra mensagem importante do especialista é com relação ao calendário vacinal, que não deve ser copiado entre os produtores de leite, pois cada propriedade possui o seu próprio sistema produtivo.

“Apesar disso, é muito comum encontrarmos erros de imunidade em rebanhos leiteiros por causa de um protocolo vacinal que foi repassado para inúmeras pessoas. Através do boca a boca entre os criadores, eles começam a utilizar o mesmo calendário vacinal, o que é muito prejudicial, dada a grande necessidade de se realizar o esquema de vacinação recomendado para cada fazenda.”

Toda categoria animal merece igualmente muita atenção e cada uma deve ter um protocolo específico de vacinação, segundo o rebanho da propriedade

 


Para cada fazenda é preciso ter o protocolo específico de modo a evitar deficiências no manejo vacinal


A eficiência da vacina contra as clostridioses, aplicada nos primeiros meses de vida das bezerras, está sendo prejudicada devido a uma prática de manejo comum entre os produtores de leite: a aplicação de várias vacinas ao mesmo tempo. É o que prova uma dissertação de mestrado em zootecnia, pela Escola de Veterinária da UFMG realizada no campo experimental da Embrapa Gado de Leite, em Coronel Pacheco (MG).

 A equipe de pesquisadores verificou uma interferência na resposta vacinal dos animais imunizados contra brucelose e clostridioses, quando vacinados simultaneamente. De acordo com o pesquisador Hilton Diniz, a vacinação simultânea resulta em decréscimo significativo nos títulos de anticorpos contra doenças causadas por bactérias do gênero Clostridium. Isso pode culminar em bovinos não protegidos nas propriedades leiteiras. O mesmo estudo demonstra que a vacina contra brucelose não sofreu interferência na resposta imunológica, permanecendo eficaz.

 

Suspeita adveio de relatos dos produtores – Envolvido também no projeto, o professor da UFMG disse que esse estudo surgiu após o questionamento recorrente de vários pecuaristas que não gostam de aplicar algumas vacinas, pois acreditam que os animais ficam “sentidos”, acabam ingerindo menos alimento, e com isso há interferência no desempenho zootécnico.

“Em razão disso, decidimos avaliar os animais na sede da Embrapa Gado de Leite. Para tanto, dividimos o rebanho em três grupos: no grupo 1, de bezerras leiteiras,  vacinamos somente contra a clostridiose; no grupo 2, os animais foram vacinados somente contra brucelose; e no grupo 3, os animais foram vacinados  simultaneamente, algo comum nas fazendas, contra brucelose e clostridioses”, explica Silva.

Os pesquisadores perceberam que o impacto no desempenho dos animais é minúsculo. Logo, os produtores não precisam ficar preocupados com isso. Existe no primeiro e no segundo dia uma leve redução no consumo alimentar, mas é algo tão brando que rapidamente é superado.

Apesar disso, o achado mais interessante dessa pesquisa acabou sendo a resposta desses animais às vacinas. Pois se o pecuarista vacina simultaneamente (clostridioses, brucelose), os animais tendem a ter uma resposta pior para a vacina contra clostridioses.

“Tudo sugere que a vacina B-19 incita uma resposta tão forte no animal que o organismo acaba dando pouca atenção para os antígenos da clostridiose, consequentemente, os animais que eram vacinados simultaneamente tiveram uma resposta mais fraca contra a clostridiose, inclusive alguns deles não responderam à vacina. Foi como se não tivéssemos dado o medicamento. Assim, percebemos que é interessante tentar separar essas vacinas não pelo desempenho zootécnico do animal, mas conforme a performance de resposta a proteção do rebanho”, pontua Silva.

O experimento foi executado em uma área automatizada, com cochos com medição de consumo alimentar, e os alunos da UFMG ficaram internados na unidade, aferindo a temperatura das bezerras leiteiras várias vezes por dia, medindo até a temperatura da pele onde foram administradas as vacinas, a fim de ter o monitoramento mais completo possível. Essa pesquisa será publicada, provavelmente, neste mês de julho, em uma revista científica.

Pesquisa demonstra que não se deve vacinar simultaneamente contra brucelose e clostridioses, pois isso prejudica a eficácia da vacina

Um perigo chamado clostridioses – São consideradas como um grupo de doenças bem diferentes entre si. Dentro das clostridioses, encontram-se botulismo, tétano, endotoxemia, que é uma doença bastante importante, assim como a manqueira, também conhecida como carbúnculo sintomático, com muita prevalência no País.

O que associa todas essas doenças é o gênero da bactéria Clostridium, além do fato de que essas clostridioses são infecções e intoxicações agudas, que comumente levam o animal ao óbito. “Então, de forma geral, não há tempo para tratar esse gado. Logo, é fundamental manter uma resposta contra esses patógenos para que não ocorram perdas por morte súbita”, assinala Silva.

Conforme ele, outro detalhe importante das clostridioses deve-se ao fato de não serem doenças erradicáveis. Nenhum veterinário vai conseguir limpar o rebanho completamente e garantir que não tenham clostridioses em nenhum momento. Essa é uma doença de convívio, portanto os criadores não devem, em hipótese nenhuma, retirar a vacinação contra clostridioses, sob pena de ocorrer um quadro clínico na fazenda e provavelmente um surto, com alta taxa de mortalidade no rebanho.

A vacinação contra clostridioses varia de acordo com a composição da própria vacina e pelo risco ou não de outras doenças. No geral, os veterinários recomendam a vacinação por volta dos 3 a 4 meses de idade das bezerras, dando duas doses – é muito importante que se aplique a dose de reforço. Então, o animal deve receber a vacina dos 90 até 120 dias de vida e depois tem de receber mais uma dose após 21 dias. Sem esse reforço, a vacinação contra clostridiose não funciona. Já a revacinação deve ocorrer de 6 em 6 meses em todo o rebanho.

“Tenho uma experiência nesse sentido em rebanhos que foram vacinados contra o botulismo: a mortalidade dos animais que fazem ingestão da silagem contaminada é de 90% a 100%. Isso praticamente fecha a fazenda. Enquanto nas propriedades que vacinam regularmente, essa mortalidade cai em torno de 30% a 20%”, afirma o especialista da UFMG.

O cuidado rigoroso na vacinação dos animais também é garantia para a segurança e qualidade do leite

Surtos que prejudicam a reprodução podem ser evitados com a vacinação – Os protocolos de vacinação buscam conter também as doenças reprodutivas, bastante desafiadoras, o que eleva a necessidade de vacinação constante. Isso é muito importante, visto que a prevalência no Brasil destas três enfermidades, IBR, BVD e leptospirose, é muito alta.

Qual a frequência ideal de vacinação? Essa é uma dúvida muito comum entre os produtores. Os veterinários informam que normalmente a vacinação contra IBR, BVD e leptospirose ocorra na entrada dos animais na reprodução. Dessa forma, quando a novilha leiteira receber a primeira inseminação ou monta natural, deve ser feito o protocolo vacinal, administrando duas doses. Aplicando a primeira dose e a segunda de reforço depois de 21 a 30 dias.

Sem esse protocolo, Silva destaca que o animal não vai adquirir uma resposta imune adequada. A propósito, o professor da UFMG também alerta que é necessário a revacinação contra esses três antígenos. Não tem como fugir disso.

Quando ocorrem surtos de leptospirose na propriedade leiteira, é preciso alterar a frequência da vacinação, já que é um dos mecanismos mais efetivos para tentar conter a infecção pela bactéria lepitospira.

“Nesses quadros reduzimos o intervalo tradicional, de seis em seis meses, para vacinar o plantel a cada quatro meses. Porém, dependendo de alguns casos, uma redução pode ocorrer de três em três meses, com o intuito de elevar a resposta positiva contra o surto. Todavia, o protocolo mais comum em casos de surto de leptospirose é administrar a vacinação de quatro em quatro meses, durante o período de um ano, no mínimo, mas comumente até os próximos dois anos. Assim, os casos de aborto por leptospirose serão reduzidos”, assinala o veterinário mineiro.

Outro agente causador dos abortos é a tripanossomose, sobretudo em fazendas que fazem o compartilhamento de agulhas entre os animais, devido à utilização de hormônios à base de ocitocina para vacas leiteiras, com registros de surtos bastante preocupantes. A doença é um parasita que ataca a corrente sanguínea do animal e rouba seus nutrientes.

Recomenda-se o não compartilhamento de agulha entre os animais como no caso da aplicação de ocitocina, o que provoca a contaminação de uma vaca para outra, sobretudo da tripanossomose

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