Vamos ter um foco maior na elaboração e implementação do Plano de Competitividade do Leite Brasileiro, atualmente em discussão pelo setor, a partir de proposições emanadas da subcomissão do leite da Comissão de Agricultura da Câmara dos Deputados. Este plano abrange as questões ligadas à profissionalização dos produtores, à melhoria das relações comerciais entre produtores e indústrias, ao avanço nas questões sanitárias do rebanho, aos instrumentos de política agrícola e à inovação e ao acesso aos mercados

ENTREVISTA

RONEI VOLPI

Com qualificação profissional e acesso à assistência técnica, produtores conseguem os

RESULTADOS DESEJADOS

Ronei Volpi é médico veterinário formado pela Universidade Federal de Santa Maria (RS), com atividade profissional há 47 anos no Paraná, com destaque à atuação em defesa sanitária animal e na cadeia produtiva leiteira. Há 30 anos é produtor de leite, com atuação como presidente da Comissão Técnica de Bovinocultura de Leite do Sistema Faep/Senar-PR, fundador do Conseleite Paraná e da Aliança Láctea Sul-Brasileira. Por 18 anos, foi superintendente do Senar-PR e diretor executivo do Fundepec-PR por 15 anos. Atualmente, assumiu a presidência da Comissão Nacional de Pecuária de Leite da CNA e da Câmara Setorial da Cadeia Produtiva de Leite e Derivados do Ministério da Agricultura.

BALDE BRANCO - Para iniciar a conversa, como o senhor vê a situação da cadeia produtiva do leite, principalmente no elo da produção primária – seu potencial, os principais e atuais gargalos e problemas à produção?

RONEI VOLPI – Provavelmente, essa cadeia produtiva é a mais complexa de todo o agronegócio, com grandes diferenças regionais e uma excessiva dispersão da produção primária e do setor industrial. Temos, por um lado, uma minoria de propriedades e indústrias altamente qualificadas, com tecnologia e escala de produção compatíveis com o mercado, e um grande número de propriedades e indústrias com pouca escala e tecnologia, o que dificulta bastante a sustentabilidade da cadeia. Por outro lado, temos um enorme potencial de crescimento ao vencer gargalos dentro da porteira, com a necessidade de qualificação dos produtores, adoção de tecnologias já disponíveis ao campo, assistência técnica e extensão rural, com a consequência de uma maior produtividade e volume de produção. Fora da porteira, em muitas regiões temos grandes obstáculos ao crescimento da atividade, especialmente os ligados à infraestrutura, tais como a qualidade do fornecimento de energia elétrica, condições viárias que permitam adequado acesso a insumos, captação e escoamento da produção.

BB - Quanto aos pontos que o sr. destaca, que ações, em termos de políticas públicas, devem ser implementadas para superá-los? E, no momento, há alguma ação em andamento?

RV – Em primeiro lugar, aos produtores, a qualificação profissional e o acesso à assistência técnica e gerencial. Quando atendidas, naturalmente as questões ligadas à sustentabilidade, tais como a viabilidade econômica e os requisitos socioambientais, passam a ter o resultado esperado. Quanto a políticas públicas, existem muitas ações em andamento, por exemplo, os programas Leite Legal, Mais Leite Saudável, ATeG do Senar, Balde Cheio, Educampo e tantas outras ações de cunho regional que estão sendo desenvolvidas em todo o Brasil. Quanto às questões de infraestrutura, são problemas recorrentes e comuns a todo o agronegócio, que requerem constante atenção de todos os níveis governamentais, buscando suprir as graves deficiências em energia elétrica, estrutura viária, segurança no campo, entre outros. A adoção das Instruções Normativas 76 e 77, desde o ano passado, deve contribuir para colocar a produção láctea brasileira em condições de competitividade no mercado internacional, especialmente no tocante à qualidade. Contudo, temos ainda um gargalo importante a vencer, que seriam os custos internos de produção, que nos levam a trabalhar a produtividade dos animais, da terra e das pessoas.

BB - Para o senhor, o que representa, em sua trajetória ligada ao leite, ser presidente da Câmara Setorial do Leite e Derivados?

RV – Sem sombra de dúvida, uma grande responsabilidade frente aos desafios da cadeia produtiva, uma vez que estamos passando por uma total reestruturação, que deverá reduzir o número de produtores e de indústrias, em busca da efetiva sustentabilidade econômica dos empreendimentos. A esta realidade já assistimos no Brasil em outras cadeias produtivas, notadamente na avicultura e na suinocultura. Portanto, embora muito honrado em assumir essa função, tenho plena consciência dos grandes desafios que teremos de enfrentar.

BB - No contexto nacional da cadeia produtiva do leite e derivados, qual a importância da Câmara Setorial do Leite e Derivados e no que ela pode contribuir para o fortalecimento do setor como um todo?

RV – Partindo do princípio de que a Câmara Setorial é composta por um colegiado representativo de todos os segmentos ligados ao setor lácteo, públicos e privados, existe um ambiente propositivo, que colabora com as decisões a serem tomadas pelo Ministério da Agricultura na elaboração de políticas públicas e legislações pertinentes. A Câmara pode e deve contribuir decisivamente com as decisões ministeriais.

BB - Pode-se dizer que sua eleição representa uma renovação na Câmara Setorial do Leite e Derivados? O senhor poderia destacar alguns pontos nesse sentido?

RV – Não necessariamente uma renovação, mas uma continuidade no trabalho, uma vez que a Câmara Setorial tem sido reconhecidamente bastante atuante e colaborativa na elaboração e adoção de políticas públicas pelo Ministério da Agricultura. Podemos destacar os vários regulamentos técnicos de produção definidos recentemente, as próprias INs implementadas e a criação do Comitê Técnico Consultivo da Câmara, em apoio à instituição das INs que regem a qualidade do leite nacional.

Temos um enorme potencial de crescimento ao vencer gargalos dentro da porteira, com a necessidade de qualificação dos produtores e adoção de tecnologias já disponíveis ao campo.”

BB - Em seu mandato, quais serão os principais pontos e ações em que pretende focar a gestão?

RV – Com certeza, a elaboração e adoção do Plano de Competitividade do Leite Brasileiro, atualmente em discussão pelo segmento a partir de proposições emanadas da subcomissão do leite da Comissão de Agricultura da Câmara dos Deputados. Esse plano deverá abranger as questões ligadas à profissionalização dos produtores, à melhoria das relações comerciais entre produtores e indústrias, ao avanço nas questões sanitárias do rebanho, aos instrumentos de política agrícola e à inovação e acesso aos mercados. É um plano em elaboração e que deverá ocupar boa parte do esforço da Câmara Setorial da presente gestão.

BB - Em sua gestão, o que os produtores de leite podem esperar, já que há tempos eles vêm reclamando do desequilíbrio das decisões entre o setor primário e a indústria láctea? Ou seja, nas crises do setor, quem sempre acaba pagando as contas são os produtores?

RV – A própria elaboração do plano de competitividade que acabamos de comentar deve atender a essa demanda. Também como representante dos produtores, procurarei levar a experiência de quase duas décadas da metodologia do Conseleite, que, utilizando o princípio da transparência, os ganhos e/ou as perdas do setor são igualmente divididos entre seus elos. Devemos sair da ultrapassada relação perde-ganha para investir em relações ganha-ganha.

BB - Em termos da relação entre a indústria láctea e produtores, o que precisa ser feito não só quanto à questão de preço justo, que realmente remunera o produtor (mais transparência, contrato...), mas também no que se refere a programas de assistência técnica e gerencial, visando a ganhos de eficiência, produtividade, qualidade e rentabilidade? E mais: fortalecimento da competitividade dos lácteos quando se pensa em exportações?

RV – Como já abordamos na implantação das INs, elas mesmas remetem, pela primeira vez, às indústrias a responsabilidade de elaboração e adoção de capacitação e assistência técnica aos produtores, por intermédio do Plano de Qualificação dos Fornecedores de Leite. Não menos importante, temos também os inúmeros programas implementados por instituições como Senar, Sebrae, cooperativas, serviço público de assistência técnica e extensão rural, entidades de pesquisa, como a Embrapa e órgãos estaduais, a atuação de agências estaduais de defesa agropecuária, entre tantos outros. O que precisamos adotar em nível dos estados brasileiros é uma melhor governança para trazer mais celeridade ao desenvolvimento dessa cadeia produtiva. A meu ver, seria utópica a implementação de uma estratégia nacional única frente às enormes diferenças regionais existentes. O exemplo da Aliança Láctea Sul-Brasileira seria um caminho para que, regionalmente ou apenas um estado fortaleça suas estratégias de desenvolvimento.

BB - Já dá para se fazer um balanço quanto aos resultados das INs 76 e 77, que entraram em vigor há quase um ano? Já é possível perceber mudanças? Em que sentido?

RV – Embora ainda não tenhamos dados oficiais, é visível a mudança de postura do setor. As indústrias estão conduzindo ações de melhoria não só junto aos produtores, mas também na captação e até mesmo em seus processos industriais. Com certeza, a catástrofe que se anunciava não aconteceu, e o setor vem rapidamente se adequando à nova realidade. Ajustes, com certeza, ao longo do tempo devem ser discutidos e empregados.

BB - No dia 13 de março, em reunião da Aliança Láctea Sul-Brasileira tirou-se um documento com sugestões do setor que será apresentado ao Ministério da Agricultura como contribuição ao Plano de Competitividade Leite Brasil (CompeteLeite BR). Pode dizer algo sobre essas sugestões, quais seus principais pontos, e o que elas significam para o setor?

RV – A partir das minutas existentes, foram discutidas as sugestões para construção do referido plano, cujos pilares enumeramos anteriormente. As sugestões da Aliança Láctea serão incorporadas às demais contribuições de outras instituições. Após, serão levadas à apreciação dos órgãos decisórios, e a adoção das medidas demandará novas políticas públicas de legislação, crédito ou de programas de fomento para o setor
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