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Embora já tenham melhorado muito os cuidados com as bezerras, muitos produtores ainda devem se conscientizar da importância desse trabalho

BEZERRAS

Como está o aleitamento de bezerras

em sua propriedade?

Especialistas em manejo de bezerras leiteiras afirmam que investir na nutrição da cria, na fase de aleitamento, é fundamental para garantir o pleno desenvolvimento dos animais e obter bons índices produtivos já na primeira lactação

Erick Henrique

Muitas fazendas produtoras de leite no Brasil ainda não compreenderam que o manejo e a alimentação de bezerras são pontos fundamentais que interferem nas taxas de mortalidade, assim como no desempenho do animal durante a fase de aleitamento e na fase subsequente, o que terá forte influência na planilha de custo de animais de reposição. “É notório que a atenção e o cuidado com as bezerras vêm melhorando. Mas ainda existe muito espaço para evoluir, pois não é difícil encontrarmos altos índices de morbidade e mortalidade (incidência de diarreia acima de 25% e mortalidade superior a 3%). São índices que muitas vezes são considerados normais, quando na verdade não são, devido a falhas no processo de colostragem, bem como equipe que carece de um perfil adequado e treinamento específico, situações que têm sua parcela de culpa sobre tais índices”, destaca Mellory Martinson Martins, doutoranda em Zootecnia pela FZEA/USP, co-orientadora da Liga da Bezerra Leiteira (LBL), um grupo de estudos voltado à criação de bezerras leiteiras de alta produção.

Ainda segundo ela, a fase de cria é desafiante, mas fazer o básico bem feito (limpeza, nutrição, sanidade e treinamento de equipe) traz resultados fantásticos. “Ou seja, o desafio é grande, mas deve ser visto como uma oportunidade de aumento da rentabilidade da atividade leiteira. O primeiro ponto que o produtor deve ter em mente é que a criação de bezerras é um investimento e não um custo.”

Mellory Martins: O primeiro ponto que o produtor deve ter em mente é que a criação de bezerras é um investimento e não um custo

Além disso, para Mellory Martins, apesar de essa fase representar um período curto, quando comparamos com toda a vida produtiva do animal, as decisões que são tomadas nessa fase influenciam em todo sistema produtivo. Conforme ela ressalta, estudos recentes têm demonstrado que animais que recebem uma boa colostragem, consequentemente, apresentam eficiência na transferência de imunidade passiva. E que, na sequência, recebam uma dieta que atenda às exigências de mantença e crescimento (acima 15% do peso vivo do animal), apresentam melhor desenvolvimento, menores taxas de morbidade e mortalidade, assim como maior produção de leite na fase de lactação.

Já na avaliação da zootecnista e consultora técnica Marília Ribeiro de Paula, a Doutora Spryfo, da Trouw Nutrition, o que ela vê de importante nessa fase de aleitamento das bezerras é justamente acompanhar se o que o tratador está fazendo tem dado bons resultados. “Por isso, faço questão de frisar com muita frequência a necessidade de pesagem periódica das bezerras, pois o ganho de peso em cada fase é um indicativo que nos mostra se o animal está se desenvolvendo segundo o esperado. Caso contrário, é urgente que tomemos algumas medidas”, salienta, explicando que, muitas vezes, nos animais na fase inicial, logo nos primeiros 15 a 20 dias de vida, há uma incidência maior de doenças, que prejudicam o seu desempenho. “Eles acabam não ganhando peso, o que vai comprometer o seu crescimento na fase de aleitamento como um todo.”

Por tal razão, a consultora acha muito importante medir o desempenho, justamente para conseguir tomar a melhor decisão durante o período de aleitamento. “E, atualmente, o departamento de pesquisa da empresa em que trabalho tem feito a meta-análise, que consiste num levantamento das pesquisas que avaliaram os bons aleitamentos das bezerras nas fazendas. A conclusão é de que, cada 1 grama de ganho de peso adicional que esses animais tiveram na fase de aleitamento, pode resultar em até 4 litros de leite a mais na lactação futura”, informa Marília Ribeiro.

Quando a zootecnista fala em ganho adicional, isso significa que se espera que uma bezerra sadia dobre o peso de nascimento aos 56 dias de vida, ou seja, se o animal nasceu com 40 kg, o esperado é que atinja pelo menos 80 kg após 56 dias de nascimento. “Assim, fica claro que devemos fazer um aleitamento correto, um bom acompanhamento dos animais nesse período, pois isso pode interferir positivamente na lactação futura”, diz a consultora técnica.

Marília Ribeiro: “É essencial trabalharmos bem a fase de aleitamento, pois isso vai se refletir no pós-desaleitamento, possibilitando produzir uma bezerra pesada, com uma boa estrutura e capaz de manter esse desempenho no desaleitamento”

Investir em sucedâneos de qualidade é fundamental – “A gente tem o conceito muito mal implementado no Brasil sobre o uso de sucedâneos lácteos. Além disso, há produtos que não deveriam ter esse nome. Quando se fala em sucedâneo, já deveria vir estampado no rótulo a palavra qualidade, mas ainda existem produtos de má qualidade. Infelizmente, convivemos com essa realidade, mas é algo que precisamos mudar, porque é em prol dos benefícios para as bezerras”, pontua ela.

Ainda sobre essa questão, para aferir a qualidade do produto, a zootecnista explica que o teste mais rápido é o de estabilidade, que o produtor pode realizar na propriedade. Basta diluir dois dedos de sucedâneo numa garrafinha plástica, transparente, de 500 ml, completar com água morna, depois agitar e descansar a mistura, sem mexer, por algum tempo.

“O criador observará que, quanto mais rápido o sucedâneo decantar, pior é a qualidade produto. Afinal, se a gente trabalha com tecnologia, esse produto deve se manter estável o maior tempo possível. Imagine que a gente esteja no bezerreiro para aleitar 200, 300 ou mais animais, e o sucedâneo não tenha estabilidade. Por isso, essa solução precisa manter-se homogênea o tempo inteiro, que seja um ingrediente lácteo clarinho e possua as características do leite”, explica ela, assinalando que sucedâneos à base de produtos de origem vegetal têm uma coloração mais escura e ficam mais espessos na hora de diluir, decantando muito rápido. “E isso com certeza vai se refletir no desempenho do animal, pois é um sucedâneo de baixa qualidade”, diz a consultora.

Além disso, ela sempre orienta os produtores a olharem o rótulo do sucedâneo lácteo, pois nele pode haver uma indicação muito importante: “eventuais substitutos”. Isso significa a ausência de algum ingrediente da lista principal, que o fabricante substituiu por ingredientes secundários.

Vale reforçar também este alerta: o fabricante está contando para o produtor, no condicional (pode haver “eventuais substitutos”), sem afirmar se houve a troca. Isso é um problema, porque as bezerras são animais de rotina, gostam de consumir sempre tudo igual, todos os dias. Logo, o sucedâneo para bezerras não deve conter “eventuais substitutos”. Outro quesito que vale destacar é que não devem existir ingredientes com as palavras farinhas ou farelos, pois isso significa que há ingredientes de origem vegetal no sucedâneo. Também não pode haver açúcares no produto, já que as bezerras não possuem a sacarose, uma enzima que digere o açúcar.

As fases de colostragem e aleitamento vão determinar o nível de desenvolvimento da bezerra no futuro

Benefícios dos sucedâneos de qualidade – Marília salienta alguns benefícios dos sucedâneos para a vida dos animais nessa fase: o primeiro ponto positivo é a respeito da independência do horário de ordenha, pois o tratador pode utilizar a água de qualidade na temperatura indicada para preparar o sucedâneo, sem depender do término para realizar o serviço.

Outro ponto importante refere-se à manipulação de sólidos, que permite entregar mais sólidos em uma determinada fase, na qual os animais precisam ganhar mais peso, podendo ser desaleitados mais cedo, com pesos equivalentes ao aleitamento tradicional. Assim, a fazenda leva essa fase a cerca de 90 a 100 dias, enquanto com uso do sucedâneo é possível desaleitar a bezerra por volta de 65 a 75 dias, garantindo o mesmo desempenho/peso. Isso facilita a questão do alojamento dos animais, garantindo um vazio sanitário dentro do bezerreiro.

“Se nós trabalharmos muito bem a fase de aleitamento na propriedade, isso vai se refletir no pós-desaleitamento, em que é possível produzir uma bezerra pesada, com uma estrutura muito boa e conseguir manter esse desempenho no desaleitamento. E ao mesmo tempo oferecendo uma dieta adequada e boas condições de instalação, conforto e sanidade – esse animal estará pronto para a inseminação mais cedo”, avalia a zootecnista.

Como saber se as bezerras estão prontas para desaleitamento? – Segundo a co-orientadora da LBL, a base para tomada de decisão para o desaleitamento é preparar o animal, mais especificamente o sistema digestivo das bezerras, para o consumo de dieta sólida. O principal é o consumo de concentrado. O ideal é que as bezerras sejam desaleitadas consumindo no mínimo 1,2 kg de concentrado, para raças pequenas, e 1,5 kg de concentrado para raças grandes (Azevedo et al, 2022).

“A idade e o peso são fatores que podem ajudar a nortear a tomada de decisão, tanto para lotes mais homogêneos na recria quanto para o planejamento das instalações do bezerreiro, mas não como critérios eletivos para o desaleitamento. Afinal, apesar de a idade e o peso darem uma noção de que o animal possa estar pronto, eles não são números mágicos que, quando alcançados, nos dão garantia de que a bezerra está apta ao desaleitamento, pois dependem de todos os eventos que aconteceram durante o aleitamento”, diz Mellory Martins.

Em outras palavras, na avaliação da especialista, somente estabelecer uma idade para o desaleitamento pode não funcionar, pois se a bezerra não estiver preparada para o desaleitamento, isso pode acarretar problemas na recria, como baixo desempenho e maiores índices de mortalidade e morbidade. Ademais, haverá uma transferência de problema para outra categoria animal dentro da fazenda”, conclui.

DICAS SOBRE O FORNECIMENTO DAS DIETAS LÍQUIDAS

 
De acordo com a equipe da LBL, é importante que o produtor forneça no mínimo 6 litros/leite/dia comercializáveis ou 750 gramas de sólidos totais por dia, segundo o livro Nasem 2021 (referência na área de nutrição de gado de leite), para que o animal consiga desempenhar o seu potencial produtivo.

• É importante fornecer a dieta liquida na temperatura adequada, próximo da temperatura corporal do animal, de 38 a 39°C, por questões comportamentais do animal, e para evitar perdas energéticas;
•Vale ressaltar também que, caso seja possível, deve-se iniciar o aleitamento pelas bezerras mais jovens e saudáveis e finalizar com as mais velhas e/ou as doentes, para evitar a contaminação (Azevedo et al, 2022). Quanto mais nova for a bezerra, mais sensível às adversidades ela será;
•Não forneça leite de descarte: o primeiro passo é entender o porquê de ter tanto leite de descarte na fazenda. É um problema que deve ser mapeado para diminuir vacas em tratamento e, consequentemente, o leite de descarte disponível para bezerras, o que facilita na tomada de decisão de não usar, quando a quantidade for pequena. Afinal, os principais prejuízos do aleitamento com leite não vendável são menor desempenho, devido à maior incidência de diarreia, a depender da qualidade microbiológica do leite fornecido, possível resistência bacteriana, o que tem se tornado uma questão de saúde pública.

(Fonte: Mellory M. Martins – Liga da Bezerra Leiteira/FZEA/USP)

Equipe qualificada é crucial – Para Marília Ribeiro, a questão da mão de obra é fundamental, principalmente porque o sucesso do bezerreiro está atrelado à pessoa que cuida dos animais. “Esse colaborador (a) precisa ter muito cuidado, atenção, carinho, e, grosso modo, os homens e mulheres que trabalham no bezerreiro são os pais adotivos das bezerras, logo precisam tratá-las como tal, pois são crianças que demandam uma atenção especial: precisa fazer as coisas no horário certo, com o máximo de higiene possível.”

Às vezes, conforme a consultora, as pessoas pensam que só porque estão trabalhando com animais, não é necessário se preocupar em ter uma boa higiene. Saibam que a saúde das bezerras está muito atrelada a esse quesito. Por isso, a mão de obra contratada precisa ser atenta aos sinais que as bezerras dão, o tempo todo, sobretudo quando alguma coisa não está certa.

“Além disso, é impreterível se atentar ao horário da alimentação dos animais, verificar se estão comendo e bebendo água direito, pois são pontos estratégicos para o produtor tomar decisão dentro do bezerreiro, porque, se algumas dessas coisas não estiverem certas, o risco de fracasso é muito grande”, finaliza.

Alimentação correta em cada fase, carinho, atenção, conforto, higiene e sanidade é a receita para se produzir uma ótima vaca leiteira

IMPORTÂNCIA DE ESCOLHER UM BOM SUCEDÂNEO

 
1. A composição bromatológica: Segundo o Nasem 2021, é importante que o sucedâneo tenha concentração de proteína entre 22% e 27% de PB, fibra bruta abaixo de 0,15%, concentração de gordura entre 15% e 20% e minerais e vitaminas adequados;

2. Além dos níveis de garantia, é necessário estar a atento à composição dos ingredientes, visto que a fonte é tão importante quanto o nível de garantia, pelo menos 50% de proteína deve ser oriunda de fontes lácteas; em relação à energia é preciso ficar atento à quantidade de lactose;

3. Outro fator importante é ser de fácil diluição, o sucedâneo deve estar entre 12,5% e 15% de sólidos totais.

(Fonte: Mellory M. Martins – Liga da Bezerra Leiteira/FZEA/USP)

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