Balde Branco – Que ele continua um problemão sabemos, mas há algo de novo em relação a este parasito?
Welber Lopes – Na verdade, as infestações de carrapato estão piorando. Já existem estudos mostrando que o carrapato consegue desenvolver uma geração a mais por ano, em comparação a 20, 30 anos atrás. Isso não acontece em todas as propriedades, em todos os lugares. Mas, por causa do aumento da temperatura global, o carrapato está conseguindo fazer uma geração a mais.
Quando falamos em uma geração a mais, isto resulta, aproximadamente, em dois meses a mais de controle desse ectoparasito. Temos escutado de muitos produtores relatos de que está mais difícil tratar o carrapato, tendo que aplicar carrapaticidas mais vezes. Tudo isso vai ao encontro desses dados apresentados pelos estudos divulgados recentemente.
Aliado a isso, se observamos o histórico de produtos químicos que foram lançados ao longo de toda história, estamos presenciando um período de cerca de 30 anos sem a descoberta de novas moléculas para combater o carrapato. Isso é um processo natural, no qual a eficiência dos produtos está diminuindo conforme o tempo de uso. A indústria está tentando minimizar esse impacto, associando os ativos que existem, contudo, infelizmente, não temos nenhuma novidade. Dessa forma, aliando esses dois fatores, podemos afirmar que o carrapato está bem pior do que décadas atrás. A perda de eficiência ao longo dos anos é resultado da resistência do carrapato aos produtos químicos.
BB – Nesse cenário, quais são as estratégias mais eficientes para o controle do carrapato?
Welber – Existem algumas estratégias no controle do carrapato que nós devemos considerar: a primeira medida é aplicar o produto que melhor funciona na propriedade. Nas fazendas leiteiras, temos o teste do biocarrapaticidograma, que é muito efetivo, pensando em vacas em lactação. A Embrapa Gado de Leite, em Juiz de Fora (MG), realiza esse tipo de teste gratuitamente, a própria UFG também faz essas análises para definir qual será a melhor ferramenta. Feito isso, uma estratégia eficiente que tem tido um resultado satisfatório seria aproveitar esse período de início das chuvas das Regiões Sudeste e Centro-Oeste, por exemplo, quando aumenta a infestação por carrapatos nos animais, com aplicação de banhos estratégicos a partir dessa primeira geração de parasitos, que é menos abundante no ambiente e também nos bovinos.
À medida que vai caminhando para a segunda, a terceira e até a quinta geração, a tendência é aumentar o número de carrapatos no ambiente e no rebanho. Se o produtor deixar para atuar, por exemplo, na quarta geração, que é lá pelo mês de abril/maio, como alguns fazem, o resultado de eficácia do produto será inferior, sobretudo quando compararmos quem utiliza essa estratégia nesse período do ano (outubro/novembro/dezembro). Segundo apontam alguns estudos, quanto maior o grau de infestação de carrapatos no animal menor será a eficácia do produto aplicado. Às vezes, o que as pessoas fazem com relação ao biocarrapaticidograma é procurar ajuda por volta do mês de abril e maio. Porém, costumo dizer, esse teste será útil para o produtor só na próxima “estação de carrapatos”, na época do início das chuvas. No entanto, tem muita propriedade que somente tenta apagar “incêndio” bem no auge da infestação.
BB – Como essa operação pode ser realizada na prática para combater a primeira geração do carrapato?
Welber – Quem vai dar ao pecuarista o resultado do produto a ser aplicado é o teste do biocarrapaticidograma, indicando a solução A, B, X, Z, e seu porcentual de eficácia. Depois que o produtor inicia o controle estratégico, acontece outro gargalo importante que é determinar o período de reaplicação do produto nos animais durante o controle estratégico. O produtor não deve retratar os animais, quando muitas teleóginas “jabuticabas” são visualizadas nos animais durante o controle estratégico. Desta maneira, o ciclo do carrapato não é “interrompido”, e certamente o controle estratégico nestas situações não terá bons resultados.
Isso é muito importante porque, na maioria das vezes, não dá para fixar os dias de protocolo. O produtor precisa compreender que não é possível estabelecer os dias de tratamento, como se faz nos protocolos de reprodução. No caso do carrapato, se ele fixar, corre o risco de não dar certo o controle estratégico desses ectoparasitos. O tempo médio de tratar novamente o rebanho com pulverização, em gado de leite, varia de 21 a 28 dias após o banho realizado anteriormente. Intervalos menores que esses, às vezes, são necessários em casos de elevadas infestações.
Já a número de banhos varia de acordo com a região. Em algumas localidades da Região Centro-Oeste, como a temperatura média anual é maior, temos um pico de infestação por carrapatos muito elevado em julho. Regiões do Sudeste também apresentam cinco gerações, entretanto a última geração possui um volume mais baixo de parasitas em função da temperatura entre os meses de maio e junho serem menores.
No Centro-Oeste, os produtores estão aplicando de 7 a 8 pulverizações para conseguir suprimir o último pico de infestação por carrapatos. É possível que, na Região Sudeste, o produtor consiga controlar a estação de carrapato com menos banhos. De modo geral, no mínimo o pecuarista deve realizar de 6 a 8 banhos com produto de pulverização, dependendo da região. Sempre lembrando que é necessário repetir o tratamento no momento certo para interromper o ciclo de infestação do carrapato a cada geração.
BB – Você acha necessário contar com orientação técnica nesse trabalho?
Welber – Acho que um ponto importante, onde acontecem as principais falhas no manejo do carrapato em bovinos, é porque o produtor não procura orientação técnica para fazer o controle estratégico. Para mim, a ausência de assistência técnica também é um dos principais gargalos, visto a necessidade de aplicar os produtos na hora certa, no intervalo certo. O controle precisa ser assistido, jamais em período fixado por conta do produtor. E essa é a grande dificuldade, pois a maior parte das fazendas não tem pessoas que acompanhem de perto o esquema de controle estratégico.
Se não houver um protocolo assistido, tudo isso que eu disse anteriormente vai por “água baixo”. Se o produtor tem uma ferramenta boa, uma assistência técnica acompanhando, a chance de sucesso no controle desses ectoparasitos é maior.
BB – Que outras falhas você destacaria?
Welber – Uma falha importante é a falta de maior comunicação entre a academia com o produtor rural. Existe uma lacuna muito grande entre o meio acadêmico e o produtor, de modo que as informações acabam não chegando de maneira apropriada ao pecuarista. Portanto, falhas existem, só que elas estão incluídas dentro do sistema, pois não acho justo jogar toda culpa nas costas do produtor.
Falha na aplicação – Na pulverização ocorrem as maiores falhas por parte do produtor, já que é aquela que mais depende do ser humano. Logo, é a que mais está sujeita a sucessão de falhas, como o volume correto de calda aplicada. Em gado adulto, por exemplo, tem de ser 5 litros por animal, algo que muitas vezes não ocorre. Já o pH da água influencia na eficácia do produto. Quanto mais próximo ao pH de 4,5 a 5, ela tende a desenvolver um efeito melhor na pulverização, isso para a maioria dos produtos carrapaticidas.
Pour-on – Quando a aplicação é feita via pour-on em épocas chuvosas, pode acontecer a diminuição do efeito residual do produto. Ou seja, se aquela solução funciona por 35 dias, normalmente pode funcionar até uma semana a menos, de 28 a 30 dias. Portanto, são fatores aos quais o produtor deve estar ligado. Sempre digo que a resistência não aparece do dia para a noite, nem de um ano para outro. A resistência dos carrapatos apresenta sinais que o pecuarista percebe quando usa determinado produto, principalmente quando essa solução durava cerca de 50 dias, mas agora está durando 30, 20 dias e até nada. Ou seja, são fatores que o pecuarista consegue avaliar ao longo dos anos.
BB – Todo cuidado é pouco no processo de tratamento, sobretudo na aplicação, não?
Welber – Uma coisa que preciso ressaltar é que devemos tomar cuidado com resíduos deixados em leite e carne. O momento ideal de fazer a pulverização é nas horas mais frescas do dia, e sempre a favor do vento, de baixo para cima no animal, atingindo todas as regiões do corpo, incluindo cabeça e orelha, para entrar em contato com o produto. O produtor não deve aplicar o produto em dias chuvosos, até inclusive no protocolo de controle estratégico é preciso levar isso em conta. Observar sempre a bula de cada medicamento para respeitar o período de carência. Além do uso correto de todos os equipamentos de proteção individual (EPIs).
* Welber Daniel Z. Lopes é membro do Instituto de Patologia Tropical e Saúde Pública (IPTSP) e professor no Departamento de Parasitologia veterinária da UFG
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