CRÔNICA
Paulo do Carmo Martins
Economista, doutor em Economia Aplicada pela Esalq/USP, professor da Escola de Negócios (FACC/UFJF)
O nosso consumo per capita de leite é 65% do consumo de um europeu. Então, temos uma perspectiva de crescimento razoável e ainda será possível gerar muito emprego e renda com leite e derivados”
EMBRAPA 50 ANOS, SOB NOVA DIREÇÃO!
Meu envolvimento com a Embrapa começou em 1983, como bolsista de Iniciação Científica do CNPq. Eu, com vinte anos, a Embrapa com dez. Portanto, alguém veio antes de mim e montou uma estrutura que me acolheu e deu rumo à minha vida. Isso gera sentimento de gratidão! As instituições moldam as pessoas, que moldam as instituições.
Há cinquenta anos, produzíamos cerca de 7 bilhões de litros de leite para 100 milhões de brasileiros. Agora, produzimos cerca de 35 bilhões de litros para 208 milhões de habitantes. Portanto, em cinquenta anos, a produção de leite mais que quadruplicou e cada brasileiro tem agora o dobro de leite disponível.
A Embrapa participou dessa mudança de maneira decisiva, gerando e adaptando tecnologias para a produção de leite nos trópicos, em termos de melhoramento genético animal e vegetal, saúde animal, nutrição, manejo, além de aportar soluções para a gestão das propriedades e contribuir na formulação de políticas públicas.
Nos anos setenta, a produtividade de uma vaca era de pouco mais de 4 litros/dia. Então, quando a Embrapa decidiu criar um sistema de produção de leite, os pesquisadores da época propuseram uma meta de 10 litros/vaca/dia para animais chamados meio-sangue.
Meta difícil, já que, naquela época, o máximo alcançado eram 8 litros/vaca/dia. Esse sistema de produção foi criado em 1977, numa área de 100 ha, com 25 vacas que logo já produziam 250 litros de leite por dia. Ali continha o melhor da tecnologia disponível para a região da mata atlântica do Brasil que, de Minas Gerais para cima, praticamente nada tinha de gado holandês.
Nos anos oitenta as tecnologias geradas ou adaptadas pela Embrapa, Universidades e institutos estaduais de pesquisa começaram a serem disseminadas e isso alavancou a produção de suínos, aves, gado de corte, milho, soja e outras culturas. No caso do leite, somente nos anos noventa o processo começou a mudar, quando o Governo parou de tabelar preço do leite ao produtor. A partir daí a velocidade de mudança tem sido intensa.
Mas ainda é grande o número de produtores com baixos indicadores de desempenho. Boa parte destes tem dificuldade de acesso à assistência técnica e por isso não sabe como adotar as tecnologias disponíveis para o setor. Para esses, é preciso tornar abrangentes as políticas públicas que o auxiliem a evoluir.
O nosso consumo per capita de leite é 65% do consumo de um europeu. Então, temos uma perspectiva de crescimento razoável e ainda será possível gerar muito emprego e renda com leite e derivados. É por isso que produtores e laticínios estrangeiros estão vindo para o Brasil.
Ao completar cinquenta anos, a partir deste mês a Embrapa tem como sua principal liderança Sílvia Massurhá, pesquisadora há 34 anos. Sílvia chega à Presidência da Embrapa trazendo credenciais fundamentais e caras, por serem escassas numa só pessoa.
Ela tem sólida formação profissional, tem experiência de gestão, tem o respeito e o reconhecimento do corpo técnico e administrativo da Embrapa. Tem vínculos sólidos com o setor produtivo e empresarial e proximidade com as Universidades, com as instituições federais e estaduais de pesquisa e com agências de fomento. Sílvia dialoga com muita facilidade com os órgãos de Governo e com o mundo político, em seus diferentes matizes. Sílvia é aberta ao diálogo.
Sílvia foi fundamental para o nascimento do Ideas For Milk, que gerou o primeiro ecossistema de inovação do agro brasileiro. Ela assumiu a responsabilidade de realizar a etapa Campinas desse movimento, ainda em 2016. A Embrapa agropecuária Digital sediava o Caravana 4.0, pilar do Ideas For Milk na motivação de jovens de diferentes cursos universitários, que eram apresentados ao mundo do leite e desafiados a criarem suas startups.
Em 2017, sua Unidade participou da criação do primeiro Vacathon, outro braço do Ideas For Milk, realizado em Juiz de Fora. Ela esteve presente nos eventos realizados no Cubo Itaú, em 2018 e 2019, quando escolhíamos as melhores startups do ano e também entregávamos o Prêmio Ideas For Milk de Inovação para as empresas. Em 2020, Sílvia foi palestrante para os jovens do Vacathon.
Várias iniciativas na Embrapa ocorreram durante o seu período de gestão como Chefe geral, apoiando e estimulando o início de jornadas digitais. Coleciona também iniciativas compartilhadas com o setor privado. Por dominar um tema transversal, Sílvia criou elos com diferentes cadeias produtivas.
Estamos todos muito esperançosos com a sua chegada à Presidência da Embrapa, construída por mérito em sua trajetória acadêmica e profissional. Chega no momento mais difícil da história da Embrapa que, ao completar cinquenta anos, precisa se reinventar, se refundar.
Não é somente a Embrapa que ganha com sua chegada, mas toda a sociedade brasileira. Afinal, todo dia tem um pouquinho de Embrapa no que ingerimos, vestimos e usamos, na forma de alimentos, remédios, cosméticos, fibras e energia. Onde tem Agro, tem Embrapa. Sucesso pleno, presidente Sílvia!