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Produção de leite na caatinga baiana vem crescendo, mesmo sob os desafios do semiárido

BAHIA

Graças a programas de fomento,

pecuária leiteira ganha força

Produtores de leite da Bahia, cooperativas e a iniciativa privada somam forças para o incremento da produção na caatinga, bem como no oeste do Estado

Erick Henrique

Com um trabalho constante para o incremento da produção leiteira, a Bahia vem colhendo resultados interessantes ao longo dos anos, graças a ações que envolvem entidades oficiais, consultorias e laticínios. O exemplo bastante ilustrativo é o que trazemos nesta edição: o município de Manoel Vitorino, em pleno bioma caatinga, que reúne produtores familiares que fornecem leite para um laticínio local. No início, eram coletados em torno de 250 litros por dia e hoje o total já ultrapassa os 10 mil litros.

No semiárido nordestino, o município de Manoel Vitorino, com mais de 2.000 km² e baixa pluviosidade média – de apenas 400 mm de chuvas concentradas no ano –, encontrou na pecuária leiteira uma alternativa sustentável e viável economicamente. Segundo o médico veterinário que presta assistência técnica aos produtores, Francisco José Pereira, desde 2004 o Laticínio Sol enxergou o potencial dos produtores e incentivou a atividade, instalando resfriadores de leite na região e garantindo a compra do que fosse produzido.

“O laticínio deu incentivos para aquisição de vacas mais especializadas, fez parcerias com o Banco do Nordeste, viabilizou o dia de campo com pesquisadores da Embrapa, como Luiz Gustavo Ribeiro Pereira, e a vinda do consultor Paulo Suassuna por várias vezes, com o objetivo de fomentar o cultivo da palma forrageira, hoje a base da alimentação do rebanho local”, informa Pereira.

A evolução leiteira na caatinga baiana se deve aos investimentos em alimentação à base palma forrageira, feno de buffel, concentrado e, quebrando conceitos anteriores, em animais geneticamente melhorados

Dos 250 litros diários da primeira coleta do laticínio, hoje passam de 10 mil/litros/dia, com propriedades produzindo acima dos 500 litros diários. Atualmente, são 15 pontos de coleta, com tanques resfriadores comunitários, que armazenam o leite de vários produtores. “A média por produtor está acima dos 90 litros/leite/dia, com fazendas alcançando mais de 200 litros. Quero enfatizar que são propriedades que variam de 20 a 100 hectares, em área de sequeiro, com água salobra que impede o uso de irrigação”, relata o médico veterinário.

Conforme o especialista, essa evolução se deve aos investimentos feitos em alimentação à base de palma forrageira, feno de buffel, concentrado e, quebrando conceitos anteriores, investimento em animais geneticamente melhorados. Aliás, Pereira relata que há produtor registrando médias diárias acima dos 22 litros/vaca/dia. Não são raras as vacas com picos de 30 litros de leite/dia. Lembrando que a pecuária leiteira na caatinga baiana é tocada pela agricultura familiar.

Com os vários pontos de coleta, o laticínio ganhou em qualidade da matéria-prima. O limite máximo de 10 km para cada ponto de coleta vem permitindo que o leite esteja no resfriador, no máximo, meia hora após a ordenha.

PRODUTORES VÊM EVOLUINDO EM EFICIÊNCIA QUANTO À PRODUTIVIDADE E À QUALIDADE DO LEITE

A evolução leiteira na caatinga baiana se deve aos investimentos em alimentação à base palma forrageira, feno de buffel, concentrado e, quebrando conceitos anteriores, em animais geneticamente melhorados

O casal Rosilvaldo de Jesus Neves sua esposa, Maria de Fátima, da Fazenda Januária, e Romenildo Meira Barros, da Fazenda Parabéns, estão entre os produtores de Manoel Vitorino que passaram a controlar minimamente os dados da propriedade e a buscar melhorias na qualidade da matéria-prima. Eles anotam parições, coberturas, fazem pesagem de leite, monitoram índices de chuva e dados financeiros. Além disso, de acordo com Pereira, entenderam a importância de realizar a ordenha com higiene, com pré e pós-dipping, assim como a necessidade dos testes da caneca telada e do CMT.

Em relação à sanidade do plantel das propriedades localizadas no semiárido baiano, na criação das bezerras eles seguem os protocolos de vacinação contra a brucelose e todo o rebanho é submetido ao calendário de vacinas contra febre aftosa, raiva e clostridioses. Também os animais são vermifugados duas vezes ao ano.

Cooperativismo impulsiona o leite – Quem também não mede esforços para estimular a produção leiteira no oeste da Bahia é o médico veterinário e consultor Ubirajara Zapponi. Ele relata que a extensão rural é fundamental para o sucesso da atividade na região, notadamente para o pequeno e médio produtor, que não dispõe de muitos recursos para contratar profissionais independentes ou empresas especializadas para lhes prestar consultoria técnica.

“A única forma de esses produtores de leite receberem assistência técnica de qualidade, regular e comprometida com os resultados é por meio da união, do associativismo e, de um modo mais consistente, do cooperativismo, como está ocorrendo com a Cooperativa dos Produtores do Oeste da Bahia (Cooperleite), que, com recursos de todos, pode contratar técnicos extensionistas para uma adequada assistência dentro da realidade e dos recursos regionais”, informa Zapponi.

Segundo o gestor da Cooperleite, o município de Barreiras, tal como todo o oeste do Estado, é rico em recursos hídricos para a produção de alimentos com baixo custo dentro da fazenda (pastagens irrigadas e silagem, entre outros). Aliado a isso, tem-se a oferta de subprodutos da intensa produção de grãos e fibras na região, uma das mais representativas do País, cujos recursos, juntamente com uma assistência técnica regular e capacitada, possibilitam potencializar a atividade, somado à dedicação dos produtores.

“Nesse quesito de fomentar a assistência técnica, o Projeto Bahia Produtiva, do governo estadual, tocado pela Secretaria de Desenvolvimento Rural, e pela empresa CAR (Companhia de Desenvolvimento e Ação Regional), contempla o atendimento aos produtores por intermédio da contratação de técnicos e profissionais graduados das ciências agrárias, treinados em curso de especialização em pecuária leiteira, com duração de um ano”, descreve o médico veterinário baiano Ubirajara Zapponi.

Romenildo Meira Barros deposita a produção diária em um dos resfriadores de leite instalados pela iniciativa privada para vários produtores da região de Manoel Vitorino

Na avaliação do produtor de leite e presidente da cooperativa, José de Jesus Domingues, este é um dos pilares do sucesso esperado dentro do projeto e da própria Cooperleite: prover técnicos capacitados orientando os pecuaristas a adotarem as tecnologias mais adequadas ao sistema de produção de cada um, objetivando a máxima produtividade e lucratividade por vaca/hectare/ano.

“O perfil de pecuaristas da região é familiar, com produção média, entre os cooperados, de 70 litros diários, tendo alguns que chegam a tirar 1.500/litros/dia no período de entressafra. A média de produção tem registrado ligeiro crescimento, porém poderia ser mais expressiva se as tecnologias disponíveis fossem aplicadas. Um exemplo é uma maior oferta de energia para que os criadores possam dispor de tanques de resfriamento do leite. Somente com essa medida, permitindo a segunda ordenha (da tarde), aumentaria a produção em aproximadamente 30%”, frisa Domingues.

Esse cenário está muito próximo de ser alcançado, pois a Secretaria de Desenvolvimento Rural assinou convênio no valor de R$ 2,3 milhões, em 6 de outubro, com a Cooperativa dos Produtores de Leite do Oeste da Bahia para a construção de um laticínio em Barreiras.

O investimento vem do projeto Bahia Produtiva, da Companhia de Desenvolvimento e Ação Regional, empresa pública vinculada à secretaria, a partir de acordo de empréstimo entre o governo do Estado e o Banco Mundial. O empreendimento será o maior laticínio da agricultura familiar na região, e vai gerar emprego e renda para 186 famílias agropecuaristas. A expectativa é dobrar a produção anual da Cooperleite, que atualmente está em torno de 9 milhões de litros.

A Cooperleite ficará responsável pelo laticínio e também já foi contemplada com equipamentos, como tanques resfriadores, semeadeira, quatro plantadeiras, quatro colhedoras de forragem, distribuidor de calcário e adubo, pulverizador, roçadeira, grade aradora, triturador de grãos, misturador de ração, trator e um caminhão.

O presidente da Cooperleite, José Domingues, afirma que os investimentos do Projeto Bahia Produtiva vieram não só para aumentar a produção, mas também para elevar a autoestima do produtor rural e fortalecer a bacia leiteira local. Conforme Domingues, agora será possível produzir ração com mais qualidade e ter competitividade no comércio da bovinocultura de leite.

Ubirajara Zapponi: "A única forma de esses produtores de leite receberem assistência técnica de qualidade, regular e comprometida com os resultados é por meio da união, do associativismo e, de um modo mais consistente, do cooperativismo"

PONTOS POSITIVOS E GARGALOS DA PRODUÇÃO LEITEIRA NA CAATINGA

 

Segundo o médico veterinário Francisco Pereira, entre os avanços e problemas, a produção leiteira na região ainda tem grandes desafios, mesmo com a evolução que já conquistaram:

• Boa parte das fazendas adota a ordenha mecânica.
• Muitas fazendas envolvidas com o projeto estão se preparando para iniciar a utilização da inseminação artificial no rebanho.
• A utilização da palma forrageira é uma ótima alternativa para reduzir custos de produção.
• O concentrado representa um custo altíssimo para os produtores. Eles ainda não fazem compra coletiva direta e estão longe do centro produtor de grãos.
• A energia elétrica é outro problema. Vem limitando a instalação de mais resfriadores na região.
• As estradas carecem de manutenção e, no período das águas, é comum o caminhão de coleta ficar impossibilitado de chegar a alguns pontos. Sem contar as ocasiões em que fica atolado na estrada.

PROJETO LEITE OESTE BAHIA

 

Outra iniciativa importante é o Projeto Leite Oeste Bahia, que está sob coordenação do médico veterinário Ubirajara Zapponi. Entre os objetivos do projeto, o coordenador explica que o sucesso na produção leiteira passa rigorosamente por ter um rebanho com boa base genética, que, aliada a boa nutrição, manejo, instalações, conforto e baixo estresse, permitirá às matrizes expressarem todo o seu potencial genético na forma de mais leite produzido por dia e por lactação.

“Por isso, realizamos, desde 2017, em parceria com a Agropastoril Antonio Balbino, a produção de animais superiores, produtos de fertilização in vitro (FIV) de fêmeas meio-sangue Girolando, cujas mães são provenientes dos melhores criatórios brasileiros e de países que estão no topo do ranking da raça Holandesa para produção de leite. Esta é uma ação pioneira, que já vem apresentando resultados expressivos em cada uma das fazendas onde estão mais de 200 novilhas fruto desse programa.”

O projeto promove anualmente o Encontro da Cadeia Produtiva do Leite, com a presença de centenas de bovinocultores, especialistas em diferentes áreas, pesquisadores da Embrapa, gestores de cooperativas renomadas, como a Castrolanda, entre outros.

De acordo com Zapponi, com o efeito da pandemia, toda a programação do 3º Encontro teve de ser alterada. Agora, é realizado mensalmente o “Debate Leite Oeste Bahia”, em parceria com a Associação Brasileira dos Produtores de Leite (Abraleite), sobre temas de elevada importância para o setor, não apenas da região baiana, mas de todo o País. “A partir desses eventos, os debates e ações promotoras ganharam corpo na busca de soluções para melhoria da produtividade das fazendas”, conclui.

O laticínio vai gerar empregos e mais renda às famílias dos cooperados

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