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LEITE EM NÚMEROS

Denis Teixeira da Rocha

Analista da Embrapa Gado de Leite

Importação volta a ser destaque

Tema que tem sido recorrente nas discussões da cadeia voltou a ser o foco das atenções em 2020

Apesar de ser o terceiro maior produtor de leite do mundo, atrás apenas dos Estados Unidos e da Índia, o Brasil ainda é importador líquido de lácteos. Isso significa que o País importa mais do que exporta leite e seus derivados, com o déficit desta balança comercial sendo superior a US$ 400 milhões nos últimos anos. Recentemente começaram a crescer as discussões em torno da necessidade de maior estruturação da cadeia produtiva do leite de modo a aumentar sua competitividade internacional com vistas a tornar-se um importante exportador mundial, a exemplo de outras cadeias do agronegócio brasileiro.

Mesmo com os avanços nessa pauta competitiva, ainda convivemos frequentemente com as discussões relacionadas às importações e seus efeitos sobre a produção nacional. Em um passado recente, teve-se esse debate por variados motivos. Em 2017, o aumento das importações vindas do Uruguai, que superaram os volumes originados da Argentina (tradicionalmente nosso maior vendedor, mas que tinha uma cota de importação vigente), gerou uma reação da cadeia que culminou na proibição temporária de embarques vindos daquele país. Em 2018 e 2019, mesmo com toda a movimentação dos agentes da cadeia, tiveram fim a cota de importação com a Argentina (que limitava a entrada de leite em pó do vizinho sul-americano desde 2009) e a tarifa antidumping sobre as importações de leite em pó vindas da União Europeia e da Nova Zelândia (vigente desde 2001). Já em 2020, as importações voltaram a ter destaque com o aumento dos volumes importados, principalmente no segundo semestre, sendo foco de reivindicações da cadeia junto ao governo.

Mesmo com todos esses acontecimentos, nesse período de 2017 a 2020, o volume anual de importações, em equivalente litros de leite, ficou praticamente estável, variando entre 4,3% e 5,3% da produção nacional de leite sob inspeção. Ao expandir essa análise para a última década (2011 a 2020), o volume médio de importação também ficou dentro desse intervalo, sendo de 5,1% da produção brasileira. O único “ponto fora da curva” foi em 2016, quando as importações atingiram o porcentual de 8,1% (Figura 1).

Entretanto, esse valor médio, de certa forma estável durante todos os anos da última década, esconde alguns momentos em que o volume de leite importado foi bem mais alto por alguns meses, o suficiente para afetar a conjuntura do mercado nacional, chamando a atenção dos agentes do setor. Um exemplo disso foi em 2016, quando este porcentual ficou entre 9,4% e 11,6% por seis meses consecutivos, entre abril e setembro daquele ano. Em 2020, esta situação se repetiu, com o volume de importações variando entre 7,8% e 8,6% da produção interna inspecionada nos últimos quatro meses do ano (setembro a dezembro) (Figura 2).

Em termos de produtos, a pauta de importações continua dominada por leite em pó e queijos que, juntos, representaram, em média, 84% do valor (em US$) e 78% do volume (em kg) de importações no período de 2011 a 2020. O soro de leite e o leite modificado também foram importantes nesse comércio, com o soro destacando-se no volume importado (12% do total) e o leite modificado no valor, com 3% do total, na média da década.

No caso específico de 2020, depois de um primeiro semestre de importações em baixa, o cenário mudou na segunda parte do ano. Com a disponibilidade interna de leite limitada e uma demanda fortalecida pelo auxílio emergencial e pelos novos hábitos de consumo da população, impostos pelo isolamento social, os preços do leite no mercado interno tiveram forte elevação. Mesmo com a desvalorização do real frente ao dólar e o aumento dos preços do leite no mercado internacional, o produto importado ficou mais barato que os preços praticados no mercado interno, o que estimulou as importações.

No fechamento do ano, as importações de leite e derivados totalizaram 1,35 bilhão de litros, perfazendo 5,3% da produção doméstica. O déficit comercial ficou em US$ 473 milhões, o que representou quase R$ 2,5 bilhões. Ou seja, o Brasil ainda está distante de resolver seus problemas de competitividade para deixar de ser importador líquido de derivados lácteos. Além disso, existe uma dificuldade para lidar com excedentes de leite no mercado, seja por produção interna, seja devido às importações, que frequentemente provocam retração nas cotações domésticas, prejudicando as margens em toda a cadeia produtiva.

Co-autores: Glauco Rodrigues Carvalho e João César de Resende, pesquisadores da Embrapa Gado de Leite

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