Nos dias 2 e 3 de agosto, a capital de Goiás foi palco da Interleite Brasil 2023, tradicional encontro da cadeia produtiva, em sua 23ª edição, organizado pelo Milkpoint, com apoio do Governo do Estado, Senar/GO, Sebrae/GO, Abraleite, Conseleite/GO e outros apoiadores. Com a participação recorde de 1.400 inscritos, o simpósio, realizado em formato híbrido, buscou abrir a cabeça dos produtores, da indústria e do varejo para trabalharem mais alinhados em prol da cadeia produtiva. Afinal, como destacaram os especialistas presentes no encontro, o setor está estagnado desde 2014 e precisa encontrar mecanismos para sair dessa situação desfavorável.
Foram dois dias intensos de muito aprendizado e troca de experiências e, para quem participou, foi uma grande feira de negócios e uma oportunidade de fazer network de alto nível. As pessoas que estavam presentes perceberam isso logo na entrada do evento; já quem não pode participar in loco, teve a chance de interagir virtualmente, acompanhando as palestras e debates, respondendo enquetes e tecendo comentários e perguntas aos especialistas.
“Para nós, é um prazer muito grande estar novamente em Goiânia. No ano passado foi um desafio trazer o evento para o município, mas o sucesso da primeira edição nos fez continuar. Eu queria agradecer muito a receptividade que tivemos do povo goiano, representado pelo governador Ronaldo Caiado e o secretário de Agricultura, Pedro Leonardo, um jovem que está assumindo a pasta, bem como o apoio que tivemos de outras instituições, como o Senar/GO e Sebrae/GO e demais entidades OCB, Sindileite e Abraleite, que ajudaram a fazer esse simpósio”, diz Marcelo Carvalho, CEO do Milkpoint.
Carvalho explica que o evento se realiza “num momento de turbulência do setor” e que é nesses momentos que o insumo mais importante é a informação. “A Interleite procura propiciar um espaço para fortalecer relacionamentos, trazer informações e iluminar caminhos. O sucesso da cadeia produtiva passa por uma transformação muito grande, às vezes dolorida, e depende de novas soluções e essas envolvem todos os elos. No fórum de mercado, tivemos uma conversa inédita com a Bolsa de Valores (B3), que está aberta ao setor para discutir, eventualmente, contratos futuros para o leite. Se vai dar certo ou não, não sabemos, mas é uma oportunidade interessante de buscar novos caminhos para ter previsibilidade, proteção e um horizonte mais conhecido para o mercado de leite”.
Além disso, Carvalho reforça que o leite compete com outras atividades, não só em termos de rentabilidade, mas também no ambiente de negócios, tema que foi tratado no primeiro painel do simpósio. “Para conseguir melhorar o ambiente de negócios, é preciso trazer exemplos de outros locais que têm crescido muito na atividade, melhorar os relacionamentos entre os elos da cadeia, além de criar um plano de longo prazo para a atividade e com isso conseguir a competitividade que precisamos ter”, avalia Carvalho.
Ademais, segundo o CEO do Milkpoint, o leite compete com matéria-prima de fora do Brasil, como o que está ocorrendo atualmente com a questão das importações. Nesse caso, ainda que algumas medidas possam ser tomadas, no final das contas, a grande proteção, a mais duradoura, seria produzir com eficiência, da mesma forma que outras cadeias já produzem. Carvalho afirma que, na situação atual, o mundo inteiro está observando e, com esses preços internacionais, ninguém consegue produzir.
“Essa é a grande verdade. Portanto, nos momentos de maior desafio, há também muitas oportunidades, pois, como se diz, ‘a crise é o dinheiro mudando de mãos’ e aqueles que compreenderem melhor esse cenário vão estar preparados. Nesse sentido, a Interleite trouxe um vasto leque de alternativas sustentáveis para o produtor, durante os painéis, como a produção de biogás, agricultura regenerativa e eventualmente o mercado de carbono. Vejo que no futuro o setor não produzirá só leite, mas também serviços ambientais”, resume.
É IMPORTANTE OLHAR PARA O AMBIENTE DE NEGÓCIOS NO LEITE
O palestrante Valter Galan, diretor técnico e de novos negócios do Milkpoint Ventures, atua há muito tempo na cadeia do leite, tendo morado em Goiânia por três anos e iniciado sua carreira na indústria em 2000.
“Mas, antes disso, eu era produtor de leite e queijos. Logo, a gente acompanha esse setor faz bastante tempo e vê que, de certa forma, a atividade está andando de lado. A nossa produção está, há dez anos, praticamente estagnada. Vejo que, desde 2014, ela não cresce. Se você avaliar pelo lado da indústria, as margens dos principais produtos lácteos (leite UHT, queijos, leite em pó), todos foram caindo ao longo do tempo”.
Para Galan, perdeu-se mercado e as vendas de derivados lácteos cresceram até 2014, mas depois retroagiram, atingindo resultados equivalentes aos anos de 2009 e 2010. “A atividade tem um cunho social muito forte, mas muitos produtores a estão deixando, tanto que tínhamos no Rio Grande do Sul 80 mil produtores, mas cerca de 40 mil já saíram da atividade. Num acompanhamento do crescimento de produção por faixa que fazemos no Milkpoint Mercado, percebemos que existem produtores de leite que estão abaixo dos 200 litros/dia e que estão decrescendo nos seus resultados, o que para nós é um grande desafio. Já na questão de sólidos do leite (gordura, proteína), também não crescem, embora tenhamos começado – e eu participei diretamente dessas ações – o sistema de pagamento que remunera os sólidos, mas a coisa não funcionou”, avalia o especialista.
Outro desafio atual para a indústria apontado por Galan são os grandes produtores, que estão cada vez maiores e cada vez menos fiéis ao seu laticínio. “Eu tenho dados de uma das indústrias do mercado que mostram o percentual de fornecedores de matéria-prima até um ano, dois anos, e cerca de 50% desses produtores fornecem há menos de dois anos. Ou seja, a cada quatro anos, troca-se toda a base de parceiros. Quando trabalhei nesse mesmo laticínio, no passado, cerca de 80% dos produtores forneciam leite há mais de 5 anos”, explica Galan.
Conforme o palestrante, é preciso trabalhar em busca de uma nova agenda de relacionamento na cadeia entre a indústria e o produtor, eventualmente (indústria e varejo). Para Galan, o laticínio tem uma posição importantíssima, por conta da sua percepção de como está oscilando no campo, se subindo ou descendo a oferta, e também as oscilações que ocorrem no consumo.
“O papel da indústria é de suma importância a respeito dessas mudanças que estamos propondo. Precisamos de relações mais duradouras e estáveis, pois, se vamos desenvolver um programa de agricultura regenerativa com uma base de fornecedores, não adianta desenvolver se, daqui a três meses, os produtores forem para outro laticínio. Portanto, a indústria precisa desenvolver uma forma de estabilizar essa base de fornecedores, fechando com ferramentas de mitigação de riscos, como os contratos futuros no leite via B3 – uma agenda que precisa entrar no setor, se quisermos previsibilidade”, completa o diretor técnico do Milkpoint.
“Obviamente com referências de mercado futuro e um pouco mais de previsibilidade, você começa a atrair outros atores que não fazem parte do setor atualmente, como as seguradoras, trades, food service, para entrar no mercado e fomentar o desenvolvimento maior da cadeia produtiva do leite”, conclui o pesquisador da Embrapa, que tem vasta experiência em economia aplicada.
Na avaliação do pesquisador da Embrapa Gado de Leite, Glauco Carvalho, o mercado futuro ajudaria muito o setor, porque também viria na esteira o mercado de opções de venda a um determinado preço, além de fomentar outras estratégias.
Enquete – Uma enquete feita durante a Interleite Brasil a respeito da ferramenta mais efetiva para melhorar o ambiente de negócios apontou como resultados:
Mercados Futuros: 52% dos votos
Seguros de Margem: 17% dos votos
Contratos: 17% dos votos
Preços mínimos: 11% dos votos
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