balde branco
ENTREVISTA
EDSON BARBOSA

LEITE NA ERA DA INOVAÇÃO E TRANSFORMAÇÃO DIGITAL

Os movimentos de digitalização no agro que estão sendo gerados no Brasil é pura inovação 100% aberta. Estamos testemunhando um grande movimento de tecnologias aplicadas para o agro, e temos de olhar de uma forma holística para isso, pois pode catalisar áreas diferentes do agro,
do Brasil inteiro

Edson Barbosa, formado em Engenharia da Computação, com especialização em desenvolvimento de softwares, estudou e atuou no exterior nessa área e, de volta ao Brasil, no Rio de Janeiro, trabalhou em empresas de tecnologia e nos últimos sete anos na Cisco do Brasil, quando participou da criação do centro de inovação, desempenhando entre outras funções a de arquiteto de solução na criação de produtos baseados em inovação aberta. Munido de toda essa expertise na área da tecnologia da informação, começou, em 2017, a participar do Ideas for Milk em mentorias e como divulgador dessas tecnologias, fazendo ainda, neste ano, parte do quadro de jurados.

Balde Branco – O que significa “arquiteto de solução” e como você chegou ao agro, particularmente à cadeia do leite? 

Edson Barbosa O arquiteto de solução é uma pessoa que, primeiramente, precisa se apaixonar pelo problema – pois nem sempre a resolução de um precisa da aplicação direta de ferramentas digitais. Então, trata-se  de  um especialista em conhecer, entender e dar a solução tecnológica adequada ao problema apresentado. Neste cenário, por incrível que pareça, um arquiteto de solução posiciona a tecnologia em segundo plano. Como cheguei no agro? No centro de inovação da Cisco tive a grande oportunidade de trabalhar com pessoas brilhantes e, junto a elas, resolvendo “problemas”, onde as soluções eram codesenvolvidas em uma tríade de inovação aberta: a Cisco, os clientes e parceiros unindo esforços em busca de soluções. O IoT, sigla em inglês para “Internet das Coisas”, é uma das áreas de domínio e, em 2017, trabalhei no grupo que gerou uma especificação de referência para o IEEE (Institute of Electrical and Electronics Engineers) chamada “PAR 2510 – Standard for Establishing Quality of Data Sensor Parameters in the Internet of Things Environment”. Apesar do nome imenso, tal especificação, já aprovada pelo IEEE, poderá também ajudar a cadeia do leite no fator de confiabilidade das informações geradas pelos vários fabricantes de sensores (químicos, físicos, biológicos etc.). Como a Cisco tem parceria com várias entidades de Pesquisa e Desenvolvimento, cheguei à Embrapa Gado de Leite via dr. Paulo do Carmo Martins e Wagner Arbex. Conheci então o evento Ideas for Milk, do qual a Cisco começou a participar desde 2017, com mentorias, palestras técnicas (“aulão”) para empoderar as equipes do Vacathon na utilização de tecnologia Cisco em seus projetos. Desde então meu envolvimento tem sido o de mentor e divulgador dessas tecnologias digitais na cadeia do leite. Hoje, atuando como consultor independente, continuo envolvido na iniciativa do Ideas For Milk (Vacathon e Desafio de Startups) e seus desdobramentos junto à Embrapa Gado de Leite e seus parceiros.

BB – Como está a disseminação dessa “era digital” no mundo e onde tem avançado mais?

EB Vamos falar um pouco sobre o Leite 4.0 e obviamente da quarta revolução industrial. Tem muito a ver com o termo “transformação digital”. Quando trazemos isso para o agronegócio, no caso aqui cadeia do leite, vale a pena olhar o que está acontecendo nos EUA, onde está o Vale do Silício, com incríveis avanços na área de IoT, inteligência artificial, nanotecnologia etc. Vale também chamar a atenção para as transformações na área do agro em regiões como California Central Valley, por exemplo, na cidade de Fresno, onde empresas estão trabalhando em parceria com universidades americanas em áreas da agricultura de precisão, visando a eficiência, produtividade e qualidade.
parceiros. 

BB – Também muitas inovações acontecem em outras partes do mundo, não?

EB Sem dúvida. E gostaria de chamar a atenção para um outro “vale”, que pouca gente conhece: Silicon Wadi, em Tel Aviv, Israel. A palavra wadi é um termo árabe e significa “vale”. Veja, Israel possui a maior concentração de startups por habitantes no mundo (aproximadamente 6 mil startups e uma população de 8,5 milhões de pessoas) e com o crescimento de aproximadamente 800 novas startups a cada ano. Lá já ocorrem importantes transformações digitais em áreas como recursos hídricos, eficiência energética, tecnologia aplicada a produtividade do gado leiteiro. Em 2014, se for pegar a produção anual de uma vaca israelense, foi a maior do mundo, com média de 12.083 kg de leite, com 3,27% de proteína e 3,64% de gordura. Como pode uma nação criada no meio do deserto com recursos hídricos escassos e outros problemas fazer tamanha transformação como essa? É aí que quero chegar: a inovação transcende aquilo que entendemos como o puramente digital, ou seja, somente o que está acontecendo dentro de um tablet ou de um celular. A inovação vai muito além disso e pensar “fora da caixinha”‘ é mais do que bem-vindo. Enfim, é claro que muita coisa também está ocorrendo na Nova Zelândia, Holanda e outros países, mas estou colocando em relevância aqui o progresso feito em alguns lugares que priorizaram a criação de um sólido ecossistema de inovação.

Não se pode ficar amarrado no conceito de que inovação é o que está ocorrendo somente em tablet ou telefone celular. Não fiquem amarrados a isso. Existem desafiantes problemas neste mercado onde as soluções vão extrapolar o uso de aplicações para estes dispositivos”

BB – E isso vem sendo construído há tempos, qual foi esse caminho?

EB – Em Israel, como mencionei acima, hoje são cerca de 6 mil startups criadas e com taxa de crescimento anual de aproximadamente 800 novas startups. Como isso aconteceu? Eu não tenho uma resposta direta, mas conjecturar é livre e alguns fatos saltam aos olhos: Israel recebe aproximadamente US$ 10 bilhões por ano em investimento externo, o Brasil com seus 8,511 milhões/km² recebe US$ 60 bilhões. Parece pouco o que Israel recebe mas, a título de comparação, Israel possui uma área de 22.072 km² e tem menos habitantes que a cidade de São Paulo. Então, muito dinheiro injetado internamente em sua economia permite que ele seja o país que mais investe em pesquisa em proporção do PIB (os Estados Unidos estão em sexto lugar, e o Brasil é o 31o no ranking), segundo um levantamento da Universidade de Toronto. Agora, aterrisando no Brasil, acredito que o caminho seja chamar atenção do governo brasileiro para a importância de compor uma estratégia de inovação visando à construção de um ecossistema de inovação sim, mas o ideal seria se essa estratégia fosse orientada a problemas que vivenciamos em nosso dia a dia. E vale destacar: iniciativas como Ideas for Milk, Inova Pork, Ideas for Farm, Inove Aqua, Inova Café e todos os Ideas xx e Invas xx estão contribuindo muito para a construção de novo momento no País.

BB – Como você citou o Ideias for Milk, qual sua importância e o que representa para cadeia produtiva do leite?

EB  Do ponto de vista de inovação, o Ideas for Milk é o exemplo puro do impacto da transformação digital aplicada a um segmento de mercado. Do lado da tecnologia, está sendo um excelente instrumento de incentivo à criação de soluções orientadas a problemas reais e convidando para uma “releitura tecnológica” de tudo o que já existe na área de produtos e serviços na cadeia do leite. Esse magnetismo todo do Ideas for Milk está atraindo novas oportunidades e modelos de negócios, vide o progresso e sofisticação dos modelos de negócio apresentados pelas startups na final do Vacathon e do Desafio de Startups.

 

BB – E esse avanço pode beneficiar a cadeia de lácteos no quesito exportações de produtos?

EB – Não sou especialista em exportação, mas é sabido que para se exportar algum tipo de produto o volume de produção é importante, mas a qualidade desse produto é algo crucial. Neste cenário e como parte do fortalecimento ou construção da credibilidade de nossos produtos junto a compradores internacionais dar visibilidade aos movimentos digitais, em nossa cadeia produtiva, que fomentem e discutam a qualidade do leite em todos os seus aspectos, é uma mensagem comercial interessante a ser compartilhada com o mercado internacional. Veja, compartilhei aqui alguns dados interessantes sobre a produção leiteira em Israel que, a propósito, faz uso intenso de tecnologias digitais em seu processo de produção, alcançando índices altos de qualidade. Será que isso ajuda aquela nação a promover seu produto no cenário internacional? Seguramente que sim.

Abrir bate-papo
1
Escanear o código
Olá 👋
Podemos ajudá-lo?