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LEITE EM NÚMEROS

Kennya B. Siqueira

Pesquisadora da Embrapa Gado de Leite

Leite ou lácteos? Qual a preferência do consumidor?

À medida que a renda da população brasileira aumentar, pode-se esperar um movimento de migração de consumo maior para os derivados do leite do que para o leite fluido

O termo tendência tem sido muito empregado hoje em dia. Em psicologia, ele caracteriza algo que aponta em uma direção, ensejando uma possibilidade, mas também com certo grau de incerteza. Ele também pode ser empregado como orientação e movimento. Para Gladwell (2009), tendência é uma epidemia e que se espalha como vírus. No âmbito do marketing, Kotler & Keller (2006) afirmam que, mais previsíveis e duradouras, as tendências revelam as oportunidades do futuro, quase que como um espelho desse futuro.

Estudiosos da área de marketing, foram os primeiros a pesquisar tendências de consumo, buscando aumentar a probabilidade de acerto, no que diz respeito à produção, comercialização e marketing de bens de consumo ou serviços. Pois, segundo Kotler & Keller (2006), as chances de sucesso aumentam se a empresa caminha segundo as tendências, e não contra elas.

Por se tratarem de economias mais desenvolvidas, as tendências de moda, consumo e varejo geralmente se iniciam nos Estados Unidos e na União Europeia. Por isso, os estudiosos de mercado estão sempre de olho no que acontece nesses países como forma de prever tendências e movimentos futuros de comportamentos e compras no Brasil.

E isso não é diferente no mercado lácteo. Em visita recente ao país do Tio Sam, observei algumas mudanças nas gôndolas de lácteos nos supermercados, comparado com o período em que residi nesse país: 2006/2007. Enquanto a seção de leite fluido foi drasticamente reduzida, com pouquíssimas marcas e mais diferenciação por tipo de leite (orgânico, semidesnatado, A2A2, etc.), a seção dos derivados, especialmente dos queijos, foi ampliada de forma considerável. Assim, com o objetivo de avaliar se isso seria uma tendência que pode se perpetuar para o mercado brasileiro, analisou-se o consumo de leite fluido e o de derivados nos Estados Unidos, o que pode ser visto na Figura 1.

É possível observar comportamentos opostos no consumo de leite fluido e no consumo dos demais derivados do leite nos Estados Unidos. Enquanto o consumo de leite fluido vem decaindo ao longo do tempo, o consumo dos derivados do leite está em expansão. Entre 2010 e 2023, a ingestão de leite fluido entre os americanos caiu 34%. No mesmo período, o consumo dos derivados lácteos cresceu 18%. O fato de esse movimento estar se acentuando ao longo dos anos sugere ser uma tendência de longo prazo para o setor, com o consumo se consolidando mais nos derivados do que no leite, propriamente dito. No entanto, essa tendência parece que ainda não se refletiu no Brasil (Figura 2).

Entre 2010 e 2017, o consumo de derivados do leite cresceu 16% no Brasil, passando de 7,22 kg per capita em 2010 para 8,35 kg per capita em 2017. Analisando apenas esse período, podia-se inferir que a tendência do mercado americano estava se concretizando no mercado brasileiro. No entanto, nos anos que se seguiram, esse cenário mudou.

Apesar do consumo de derivados lácteos ter apresentado elevação, considerando o início e fim do período analisado, o consumo de leite fluido ainda se mantém em torno do mesmo patamar de seis anos atrás e até aumentou 19% em relação a 2010. Com isso, a proporção de consumo de lácteos em relação ao consumo de leite fluido tem aumentado significativamente nos Estados Unidos, ao passo que, no Brasil, essa relação diminuiu ligeiramente (Figura 3).

Um dos fatores que pode contribuir para esse resultado contrastante, é a renda dos dois países. A análise de correlação entre a renda de cada um dos países e a relação entre o consumo de lácteos e leite fluido apresentada na Figura 3, apresentou um coeficiente de 0,71 para o Brasil e de 0,95 para os Estados Unidos. Portanto, à medida que a renda da população brasileira aumentar, pode-se esperar um movimento de migração de consumo maior para os derivados do leite do que para o leite fluido, assim como ocorrido nos Estados Unidos. Dessa forma, a análise do contexto atual e passado nos Estados Unidos, permite dizer que a tendência é de que no futuro, com a retomada econômica no País, o perfil de consumo de leite e derivados do Brasil se assemelhe mais ao perfil do americano hoje.

Coautor: Samuel José de Magalhães Oliveira, pesquisador da Embrapa Gado de Leite

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