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Animal com infestação de carrapatos que logo vão se transformar em teleógenas (fêmeas ingurgitadas)

ATUALIZANDO

Manejo integrado de pragas

Conhecer o carrapato pode salvar o seu rebanho

O conhecimento sobre o comportamento e o ciclo de vida é essencial para controlar infestações em bovinos, garantindo o sucesso econômico e o bem-estar do rebanho leiteiro

Gisele Dela Ricci*

O carrapato, o berne e a mosca-do-chifre estão entre os três maiores parasitas externos em relação à importância para a pecuária leiteira. No entanto, embora o carrapato seja o que causa maiores prejuízos econômicos, também é o que é controlado com maior eficiência.

E, como sempre, é um tema recorrente na revista Balde Branco. Mais uma vez, no período quente que já estamos vivenciando, seguem dicas para os produtores.

Carrapatos são parasitas que se alimentam sugando o sangue dos animais. O mais comum para bovinos é conhecido popularmente como carrapato-do-boi. Estão espalhados por todos os Estados do País, sendo um problema sanitário importante.

A utilização de carrapaticidas por meio de um programa estratégico se baseia na biologia dos parasitas, no meio em que eles vivem e em como se desenvolvem. Tratamentos curativos são muitos comuns, devido a momentos de grandes infestações nos animais. Conhecer aspectos ligados aos carrapatos é muito importante para a manutenção do controle dos parasitas nas pastagens, assim como o uso adequado de carrapaticidas, evitando que haja uma alta resistência deles a programas de controle.

Nesta reportagem, entrevistamos a zootecnista Beatriz dos Santos Alves, formada pela Unesp, campus de Jaboticabal, e atualmente consultora técnica e especialista em manejo integrado de pragas, com foco em carrapatos.

Beatriz Alves: Infestado com o parasita, o animal reduz a ingestão de alimentos, apresentando anemia e fraqueza, o que vai prejudicar sua produtividade e o ganho de peso

Balde Branco: Quais são os principais prejuízos causados pelos carrapatos à bovinocultura leiteira??

Beatriz Alves: Carrapatos são pragas que podem trazer por volta de 65% de danos diretos à produção leiteira. Entre os principais prejuízos, podemos citar a perda e diminuição da produção de leite, a diminuição da taxa de nascimentos e ganho de peso, o aumento da mortalidade, de problemas reprodutivos e principalmente a transmissão de agentes patológicos que geram a babesiose e tristeza parasitária bovina, bem conhecidas pelos produtores. O Brasil possui altas temperaturas e umidade, tornando-se um local muito favorável à sobrevivência e ao desenvolvimento de altas infestações de carrapatos na maior parte do ano, além de estar presente em todos os Estados, mesmo diante da variação climática. O verão e a primavera são as estações do ano com maior pico de infestação, pois trazem as condições climáticas ideais para os carrapatos, com altas temperaturas e umidade elevada por causa dos maiores índices de chuvas.

Qual a importância de se conhecer o ciclo de vida do carrapato?

Beatriz Alves: Normalmente. a infestação de carrapatos é observada pelo produtor quando visualiza o carrapato em sua maior forma corporal, arredondada. Essa fase é quando o carrapato fêmea se encontra totalmente “cheio” (ingurgitada), ou seja, após fazer toda a ingestão possível de sangue e está pronta para descer do animal e realizar a postura dos ovos em um local protegido da luz solar direta. Quando a fêmea termina a postura dos ovos, ela morre e novamente inicia-se o ciclo em que, após a eclosão dos ovos, as larvas migram para as pontas das folhas aguardando o hospedeiro, neste caso, o bovino.
Após se alojarem no corpo do animal, as larvas buscam áreas que sejam favoráveis para o seu desenvolvimento, como interior das orelhas, parte posterior das coxas, regiões da virilha, traseiro, úbere e vulva. Após sete dias se alimentando, ocorre a diferenciação sexual e os carrapatos alcançam o estágio adulto. Nessa fase, a fêmea inicia a ingestão de sangue, realizando a cópula e aumentando o volume sanguíneo ingerido, indo novamente para o solo. Esse ciclo dura em média 21 dias. O macho permanece nos bovinos e tem o tempo de vida duas vezes maior que a fêmea.

Como saber que meu rebanho leiteiro está infestado por carrapatos?

Beatriz Alves: É possível notar a presença da infestação de carrapatos observando com atenção no rebanho sinais físicos, clínicos e comportamentais. O animal com infestação, além de ser possível visualizar a olho nu a presença de fêmeas ingurgitadas, também se constata a redução na alimentação, desinteresse pelo pastejo e diminuição dos movimentos ruminais, o que ocasionará anemia e falta de ferro, caracterizada por fraqueza. Outro sinal que se pode observar é redução na produtividade e ganho de peso, pelos arrepiados, respiração acelerada e amarelamento dos olhos.

Qual a melhor forma de controle dos carrapatos? Existe alguma raça de bovinos que é mais acometida?

Beatriz Alves: Muitos fatores devem ser observados para encontrar a “melhor forma de controle”, pois existem diferentes tipos de controle atualmente, como controle químico, controle biológico, homeopatia, manejo integrado e fala-se muito sobre o controle imunológico. Fatores como raça do rebanho, época do ano, condições ambientais, tipo de manejo, mão de obra e custo/benefício devem ser observados para ser considerada a melhor opção de controle. Dentro desses exemplos, a questão da raça é muito importante, pois raças zebuínas, como Gir, Guzerá e Sindi possuem mais resistência aos carrapatos do que as raças europeias, como Holandesa, Jersey e Pardo-Suíço. Inclusive uma das formas de controle ou diminuição da infestação de carrapatos é fazer o cruzamento de raças zebuínas com as raças europeias, justamente para levar ao rebanho o gene de resistência.

Rotacionar as pastagens pode ser uma estratégia no controle do carrapato?

Beatriz Alves: A rotação pode ser feita com intervalo de 30 dias entre os piquetes para reduzir a quantidade de hospedeiros e interromper o ciclo. Entretanto, não é possível acabar com a presença do parasita fazendo apenas a rotação, pois, pela temperatura do animal, o carrapato buscará seu hospedeiro. E também por conseguir sobreviver por até 90 dias em qualquer fase do seu ciclo. É importante lembrar que, se o produtor aguardar todo esse período de 90 dias, poderá perder a qualidade nutritiva da pastagem. Por isso, é importante buscar algum tipo de controle, juntamente com a rotação dos piquetes.

Além das formas de controle químico, existem métodos alternativos?

Beatriz Alves: Sim, hoje, pelo uso descontrolado de químicos para o controle dessa praga, os controles químicos tradicionais deixaram de fazer efeito, principalmente pela resistência do parasita e aumento do custo para alternar as moléculas de controle. Por isso, controles alternativos como controle biológico, com o uso de ácaros e insetos, estudo sobre o controle imunológico por meio de vacinas e produtos fitoterápicos são ferramentas que podem ser utilizadas, trazendo resultados positivos. Produtos homeopáticos e extratos vegetais, mesmo que não sejam tão tradicionais, também podem ser utilizados neste combate. Seleção fenotípica de indivíduos resistentes também é utilizada para o melhoramento genético bovino.

E o controle imunológico do carrapato? Existe fundamento para ser utilizado? É eficiente?

Beatriz Alves: O controle imunológico vem sendo estudado há anos, trazendo premissas interessantes e sendo talvez o mais promissor dos controles. Estão sendo estudados diversos tipos de antígenos e testados na tentativa de se desenvolver uma vacina eficaz, bem como metodologias de identificação e seleção de proteínas e peptídeos para o controle imunológico do carrapato bovino. Porém, como ainda está sendo testada a eficiência desses antígenos, não é possível justificar a sua utilização como método único de controle, assim, deve-se associar a outros métodos de controle.

Utilizar sem controle os carrapaticidas pode causar resistência dos parasitas. Como evitar esse mecanismo de resistência dos carrapatos?

Beatriz Alves: Existem fatores que aceleram o processo de resistência dos carrapatos. Então, para evitar isso é interessante tomar cuidado com a frequência de aplicação de uma formulação química, pois, quanto mais se trata um rebanho com uma certa formulação por muito tempo, mais rapidamente ela vai deixar de fazer o efeito esperado. Para isso é indicado que se faça alternação dessas formulações, mas nunca fazer aplicação conjunta de mais compostos químicos, pois o parasita ficará predisposto a criar resistência, não só de um, mas dois compostos de uma vez só. Outro ponto é a persistência da substância química no organismo do animal. Isso porque, quanto mais tempo o organismo do animal leva para metabolizar um determinado tipo de molécula ou formulação química, mais acelerado será o processo de resistência. Daí ser importante buscar por controles que não permaneçam por muito tempo no organismo do bovino, até mesmo pelo bem do animal e qualidade do leite. Também é importante evitar a sobredosagem do produto recomendado, mesmo observando alta infestação ou descontrole da praga. A sobredosagem é prejudicial ao animal e terá influência na aceleração da resistência.

*Zootecnista, mestra, doutora e pós-doutoranda pela USP. Atua no laboratório de Etologia, bioclimatologia e nutrição de animais de produção (bovinos, suínos e ovinos)

Aplicação de produtos químicos no combate ao parasita requer critérios para evitar a resistência ao princípio ativo

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