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MATO GROSSO DO SUL

Mobilização

para superar crise após queda na produção de leite

Pecuária sul-mato-grossense registra recuo de 8,6% na produção leiteira, conforme mais recente levantamento do IBGE. Lideranças apontam os motivos, e produtores se empenham para reverter o quadro

Erick Henrique

A situação da produção leiteira em cada Estado tem sido tema de reportagens da Balde Branco e, até o momento, Mato Grosso do Sul foi o primeiro a registrar queda neste indicador. 

Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2019 foram produzidos no Estado 282,75 milhões de litros de leite, 8,6% a menos do que no ano anterior (309,2 milhões).

Conforme o levantamento, o efetivo de vacas ordenhadas no Estado em 2019 foi de cerca de 158,4 mil animais, 8% menor do que o do ano anterior. Os números vêm apresentando queda desde 2013 e têm influenciado a produção de leite.

O município de Itaquiraí, a 340 km de Campo Grande, manteve a posição de maior produtor de leite do Estado, com 20,86 milhões de litros, queda de 6,7% em relação a 2018 (22,36 milhões). Mato Grosso do Sul figura na 20ª posição do ranking.

Enfrentando uma série de problemas, como a forte sazonalidade na produção leiteira, a assistência técnica trabalha forte em prol dos produtores

“É um conjunto de fatores que vêm atuando de forma negativa na pecuária leiteira sul-mato-grossense. Em relação a 2019, a gente tem de lembrar que houve uma severa seca que se abateu em todo o Estado e isso se refletiu na produção de leite, já que afeta a produtividade das pastagens, e, consequentemente, reduziu a produção da matéria-prima”, explica Rogério Thomitão Beretta, superintendente de Meio Ambiente, Ciência, Produção e Agricultura Familiar da Secretaria de Agricultura do Estado, a Semagro.

Para ele, outro fator que a Semagro identificou como de grande influência é a falta de assistência técnica nas propriedades, pois isso resulta numa dificuldade de manter a produção leiteira ao longo do ano. “A gente tem uma diferença muito grande entre a produção leiteira do verão e a do inverno. E isso se reflete negativamente em todo o setor, porque acarreta problemas para os laticínios, que terão uma capacidade ociosa muito alta no inverno em relação ao verão.”

Outro gargalo muito forte que Beretta aponta é a questão da genética do rebanho, que não é muito apurada para produção leiteira. Essa genética que os produtores utilizam no Estado é proveniente de animais cruzados, logo, não é um material apropriado para atingir níveis satisfatórios de produtividade.

Rogério T. Beretta: "Mesmo com todos os problemas que temos enfrentado, a tendência é de melhora na produtividade para os próximos anos"

Paula Martins: "Um dos gargalos encontrados pelos técnicos de campo, desde o início do programa no Estado, é a manutenção da produção durante o ano, devido à sazonalidade"

“A Semagro criou um banco de dados para acompanhar a situação da produção leiteira no âmbito da captação dos laticínios junto a seus fornecedores e também para acompanhar a produção que está sendo levada para outros Estados. Como Mato Grosso do Sul faz divisa com Paraná, Goiás e São Paulo, existe uma demanda muito grande das indústrias de outros Estados que buscam a nossa matéria-prima daqui”, destaca o superintendente.

Em sua avaliação, mesmo com todos esses problemas, a tendência é de melhora na produtividade para os próximos anos. “Os preços do leite pagos ao produtor melhoraram consideravelmente durante o período de pandemia. Com isso, entendemos que a expectativa da produção de leite nos anos de 2021/2022 seja de aumento.”

De acordo com a coordenadora de Assistência Técnica e Gerencial (ATeG) do Senar-MS, Paula Martins, um dos gargalos encontrados pelos técnicos de campo, desde o início do programa em Mato Grosso do Sul, é a manutenção da produção durante o ano.

“O Estado possui um período prolongado de estiagem, marcado por escassez hídrica e baixa umidade relativa do ar, inviabilizando o uso de culturas de inverno como volumoso suplementar e atrasando a rebrota das forrageiras tropicais comumente utilizadas na região. Tal período pode afetar a atividade pela queda na produção diária, redução na porcentagem de vacas em lactação, gerando também ociosidade em plantas industriais. Outro gargalo é uma diminuição da produtividade por vaca em lactação, resultado de baixa especialização do rebanho leiteiro.”

Segundo a especialista, a ATeG do Senar-MS, atuando desde 2014 em bovinocultura de leite, já atendeu proximadamente 2,7 mil propriedades, o que representa 11% do total dos estabelecimentos rurais apontados pelo Censo IBGE em 2017. Atualmente, a iniciativa atende 788 propriedades em 49 municípios, o que demonstra que os extensionistas estão presentes em 62% do Estado e a meta é atender mais de 800 fazendas ainda este ano.

Paula Martins destaca também que o Sistema Famasul e o Senar/MS vêm auxiliando o produtor de leite sul-mato-grossense por meio de ações de Formação Profissional Rural (FPR), Promoção Social (PS) e Assistência Técnica e Gerencial. O programa de ATeG em prol da bovinocultura leiteira desenvolve suas ações de forma educativa e em caráter continuado, por meio de diagnóstico, planejamento, adequação tecnológica, capacitação do produtor e avaliação sistemática dos resultados.

"Por meio da associação (Asplansa), conseguimos maior valor pelo litro de leite, comprar tanques resfriadores, máquinas para produzir silagem, plantadeiras, tratores e caminhões-tanque. E também adquirimos, todos os meses, a um preço bem melhor, de 12 a 14 caminhões de ração"

Esses passos são desenvolvidos com foco na adoção de um modelo de operação das propriedades rurais, viabilizando a realização de ações efetivas nas áreas econômica, social e ambiental e nos processos de gestão do negócio, além da disseminação de tecnologia.

“Além disso, o programa auxilia o produtor de leite em todo o processo produtivo e operacional, como manejo da pastagem, sanidade, produção de leite, higiene e qualidade da matéria-prima, a partir de adequações tecnológicas estabelecidas no planejamento com o objetivo de gerar melhoria da produtividade”, diz a coordenadora do Senar-MS.

Agora, com relação à gestão da propriedade, ela observa que, com o auxílio do software de gestão Sisateg, o produtor tem em planilha os indicadores financeiros, econômicos e zootécnicos da sua propriedade e, em parceria com o Sebrae-MS, recebe atendimento especializado na área reprodutiva, com diagnóstico de gestação e promoção do melhoramento genético do rebanho, com uso da IATF (inseminação artificial em tempo fixo).

As fazendas que participam do programa ATeG em Mato Grosso do Sul recebem um ciclo completo de atendimento de 24 meses, que pode se estender até 36 meses. Essas propriedades apresentaram aumento na sua produção média de 76 litros por dia no início, para 180 litros por dia ao terceiro ano de atendimento.

Outro destaque é a melhoria que se dá no aumento da porcentagem de vacas em lactação de 57,5%, no início do atendimento, para 66,6% ao terceiro ano de atendimento. Ligada a esta melhoria, está a produção por vaca dia (litros/vaca/dia), de 4,02 litros no início para 10,01 litros/vaca/dia. “A melhoria dos indicadores produtivos, aliada à gestão financeira e econômica, tem como consequência o aumento da renda bruta da atividade e a diluição dos custos de produção, gerando melhora na qualidade de vida do produtor e viabilidade da atividade a curto, médio e longo prazos”, avalia a coordenadora da ATeG em MS.

José Carlos dos Santos: “Desde o início, com auxílio da assistência técnica, saí da média de 6 litros/vaca/dia para 25 a 30 litros, e pretendo aumentar em 60% os 1.200 litros de hoje, até o fim de 2021”

Associativismo traz mais competitividade – Produtor familiar, do programa de reforma agrária, no município de Iguatemi (MS), José Carlos dos Santos, conhecido como Carlinhos, lembra que, quando começou na atividade, em 1992, ele não possuía uma propriedade, era apenas arrendatário. “Nesse período, comprei as primeiras vacas, que produziam, em média, 6 litros de leite/dia. Insatisfeito com os resultados, busquei a assistência técnica da Agraer, uma subsidiária da Semagro, onde fiz um curso de inseminação artificial para melhorar a genética do rebanho. Agora as vacas estão produzindo cerca de 25 a 30 litros de leite por dia. Enfim, assim começou a minha história na atividade no Sítio Nossa Senhora Auxiliadora, lote 6.”

O produtor de Iguatemi (MS) lembra que, desde o início do projeto, teve a percepção de procurar o suporte técnico, pois acredita que, sem essa ajuda, os produtores de leite não conseguem tocar a fazenda com eficiência. Isso porque as coisas mudam a cada dia e o pecuarista precisa acompanhar as novas tecnologias para alcançar os melhores resultados para a propriedade. “Falo isso por experiência própria, porque na primeira vez que vendi minha matéria-prima a produção não passava de 6 litros de leite por vaca por dia, hoje produzo cerca de 1.200 litros/leite/dia, com meta de aumentar em 60% a produtividade leiteira nos próximos anos. Ou seja, esse aumento só foi possível graças ao acompanhamento técnico”, comemora o produtor.

Além de aprender as técnicas de inseminação, ele foi orientado pelos os técnicos da Agraer sobre como produzir silagem e realizar o manejo correto das vacas. “Vale destacar que faço o trato dos animais individualmente, no canzil, fornecendo a quantidade apropriada de ração de acordo com os litros de leite que a vaca produz. E com isso a gente exerce um controle sustentável da propriedade.”

Engajado também em melhorar a vida dos bovinocultores da região, Carlinhos já foi por três mandatos presidente, mas agora é o atual vice-presidente Associação dos Produtores de Leite do Assentamento Nossa Senhora Auxiliadora (Asplansa), uma entidade com 184 produtores de leite associados.

ASPLANSA: • 184 produtores associados; • Produz 22 mil litros de leite por dia, obtendo; melhores pagamentos dos laticínios; • Possui 46 tanques de resfriamento adquiridos; com recursos próprios e via emenda parlamentar; • Tem 2 caminhões-tanque, que captam o leite dos produtores associados; • Dispõe de 4 tratores que estão à disposição dos produtores (Fonte: José Carlos dos Santos, vice-presidente da entidade)

“A Asplansa foi um meio para que conseguíssemos os maquinários para confecção de silagem, realizar o plantio, a reforma de pasto com tratores, calcareadeiras e caminhões-tanque, por exemplo. Por meio da associação, conseguimos obter esses itens com recursos próprios, via emenda parlamentar e Ministério da Agricultura”, informa dos Santos.

A propósito, o produtor e dirigente da Asplansa diz que, por intermédio da associação, os produtores conseguem uma remuneração maior pelos mais de 22 mil litros de leite produzidos por dia vendidos aos laticínios, dado o montante de matéria-prima disponibilizada. “Também adquirimos cerca de 12 a 14 caminhões de ração por mês, direto da fábrica, obtendo sempre os melhores preços. Outro benefício que a Asplansa trouxe aos pecuaristas diz respeito às parcerias com médicos veterinários, agrônomos e zootecnistas, que nos ajudam a implementar as novidades tecnológicas na propriedade”, finaliza.

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