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Pela primeira vez ocorreram apresentações pela internet diretamente dos Estados Unidos e da Holanda

NOVOS ENFOQUES

Estresse e doenças impactam

no desempenho produtivo por bom tempo

Evento mostra que prejuízos causados pelo estresse e enfermidades persistem no médio e longo prazos, além de destacar a importante função do intestino na imunidade

Luiz H. Pitombo

Por dois dias, em Uberlândia (MG), palestrantes brasileiros e estrangeiros discutiram e sugeriram soluções para alguns dos problemas mais frequentes que comprometem a sanidade e a rentabilidade do rebanho. Fica claro que contabilizar tudo isso e agir nos momentos certos com medidas eficazes pode ser tão importante como a boa gestão financeira da propriedade.

Retornando após a pandemia, o 24° Curso Novos Enfoques na Produção e Reprodução de Bovinos ocorreu em setembro, diferentemente de anos anteriores. Participaram perto de 1.700 médicos veterinários, técnicos e produtores de todo o País, dos quais cerca de 60% integrantes do módulo dedicado exclusivamente ao leite. Pela primeira vez ocorreram apresentações pela internet diretamente dos Estados Unidos e da Holanda. Em relação a outros anos, ocorreu uma pequena redução na presença, atribuída pela organização, à mudança de data e coincidência com o início da estação de monta em alguns Estados.

“Foi um desafio organizar o evento deste ano, que contou com várias mudanças, distanciamento no tempo e outra data”, comenta José Luiz Vasconcelos, o professor Zequinha, da Universidade Estadual Paulista (Unesp/Botucatu), que esteve à frente do evento que é uma realização da Conapec Jr, empresa de consultoria agropecuária dos alunos.

Professor Zequinha: “Falamos de diferentes formas de estresse, por calor ou doenças, inflamações e como reduzem a produtividade”

 Ele faz uma avaliação positiva do evento e explica que a programação planejada para o curso de 2020, que foi adiado, permaneceu e se manteve bem atual. “Falamos de diferentes formas de estresse, por calor ou doenças, inflamações e como reduzem a produtividade”, salienta. O professor informa que o plano para o próximo ano é de que o curso retorne para a terceira semana de março com sua permanência em Uberlândia.

Guilherme Pontes: “O valor recebido pelo leite é importante para a atividade, mas existe um caminhão de oportunidades dentro da porteira que afetam muito os resultados do negócio”

INFLAMAÇÃO MAMÁRIA E PRENHEZ E SEU IMPACTO NOS RESULTADOS ECONÔMICOS

A influência negativa na economia das fazendas da mastite e da reprodução foi o tema apresentado pelo médico veterinário Guilherme Pontes, consultor do Rehagro, de Minas Gerais.

Com dados de propriedades de quatro Estados (MG, GO, SP e BA) e diferentes sistemas de produção, mostrou, por intermédio do método benchmarking de comparação entre fazendas, as fortes variações que ocorreram nos anos de 2020 e 2021 em seu resultado operacional (lucro, sem descontar juros, impostos, depreciação e amortização, também conhecido por sua sigla em inglês Ebitda). Nas cinco mais eficientes, este ficou em R$ 22.240,00 ha/ano, bem superior a várias culturas, enquanto nas cincos menos eficientes foi negativo em R$ 3.084,00. “Essa diferença revela uma grande oportunidade para se conseguir uma maior eficiência”, destaca.

Para evidenciar essas possibilidades, ele restringiu os dados a 40 propriedades classificadas primeiramente pela taxa de prenhez, quando a melhor delas atingiu 37%. Para indicar os possíveis ganhos, considerou o preço do leite a R$ 2,70/litro, a matéria seca (MS) em R$ 1,60/kg, com cada animal consumindo a mais 1 kg de MS a cada aumento de 2 litros na produção.

Assim, calcula que se as 39 fazendas, com média de 24% de taxa de prenhez, conseguissem o mesmo patamar da primeira colocada, produziriam cada uma 656 litros ha/ano a mais com lucro adicional de R$ 1.245,00 ha/ano, bem como um número maior de bezerras nascidas. Pontes enfatiza que, quanto menor a taxa de prenhez que se tem, maiores serão as chances de se ganhar dinheiro ao melhorar esse índice. Vale registrar que o resultado operacional por litro de leite das 25% mais eficientes na reprodução foi o de R$ 0,54, das 25% menos R$ 0,23 e das 50% restantes R$ 0,49.

Analisando as informações referentes à mastite subclínica de 35 das propriedades anteriores que possuíam tais dados coletados, o consultor estabeleceu novamente um ranking a partir da porcentagem de vacas com CCS (contagem de células somáticas) acima de 200 mil no ano passado. A mais eficiente mostrou apenas 9% e a pior 65%, com média geral de 35%. Novamente, o impacto no resultado operacional por litro de leite foi expressivo, com as 25% melhores obtendo R$ 0,65, as 25% piores R$ 0,11 com algumas fechando no vermelho, e as demais em R$ 0,49.

Ranqueando as fazendas agora pelo resultado operacional por litro de leite, as 25% melhores que mostraram a média de R$ 0,79, obtiveram 26% de taxa de prenhez e 22% de incidência de mastite subclínica. Já as 25% inferiores somente R$ 0,10/litro, com taxa de prenhez de 21% e mastite subclínica de 38%, enquanto as 50% restantes R$ 0,52/litro e taxa de prenhez e de mastite subclínica de 24% e 32%, respectivamente.

Ao final, o médico veterinário apresentou modelos estatísticos que incluíam indicadores zootécnicos e econômicos de maior impacto no retorno das fazendas. A conclusão reuniu três tópicos, com o primeiro afirmando que, apesar dos desafios inerentes à atividade, ela pode ser um excelente negócio quando bem gerida. Em seguida, reconheceu que o valor recebido pelo leite é importante para a atividade, mas que existe um “caminhão de oportunidades dentro da porteira que impactam em muito os resultados do negócio”, diz.

Finalmente, indica que para maximizar o lucro deve-se procurar ter taxas de prenhez em torno de 30%, sendo que acima disso o impacto não é representativo, podendo-se dedicar a evoluir em outros aspectos da propriedade. Quanto à mastite subclínica, indica que esta fique perto de 20%, pois abaixo disso não há influência, podendo-se focar no aprimoramento de outro setor.

Eduardo Ribeiro: “É necessário identificar o mais rápido possível as vacas doentes ou que vão adoecer para receberem o tratamento mais eficaz. Isso para diminuir os dias no “hospital” e a gravidade do problema”

MUITO A FAZER NO PERÍODO DE TRANSIÇÃO

Atuando na Universidade de Guelph, Canadá, o médico veterinário catarinense Eduardo Ribeiro realizou três palestras, uma delas mostrando como impulsionar a produtividade por meio do manejo de transição.

Num estudo que contou com mais de 5 mil vacas nesse período, conta que foram observados os impactos econômicos naquelas que apresentaram uma doença ou várias delas em relação às saudáveis (receita com leite, custo de alimentação, reprodução e outros). Aquelas com uma enfermidade tiveram seu lucro reduzido em 21% e as com várias enfermidades menos 45%, sendo necessário ainda considerar os gastos envolvidos com o descarte indesejado de vacas e sua substituição por novilhas. “Isso tudo tem um impacto bem grande para o produtor e é importante ter essas informações para se planejar e tomar decisões”, destaca Ribeiro.

A prevenção, como lembra, continua a ser a melhor estratégia, pois caso não se eliminem totalmente os problemas, eles ficarão minimizados. O primeiro ponto que salienta é a genética, incluindo-se nos programas de seleção a saúde, longevidade e reprodução. Existem atualmente marcadores genéticos disponíveis que podem ser utilizados nesse trabalho, que reconhece ser mais de longo prazo.

O segundo aspecto que classifica como muito importante é a infraestrutura, com investimentos no conforto e limpeza das vacas. Deve-se buscar reduzir o estresse ambiental, social e biológico, bem como facilitar o manejo dos animais. Sem uma boa logística, se estressam o animal e o funcionário trazendo problemas.

Quanto ao manejo, chama a atenção para três momentos, com a necessidade do treinamento dos funcionários para a secagem, cuidados na maternidade e nutrição.

Ribeiro aprofunda mais na última questão, reforçando a necessidade do monitoramento do escore de condição corporal (ECC), que avalia ser muito útil e fácil de ser feito. Na secagem, sugere que fique entre 3,0-3,5, numa escala de 1 até 5, com sua manutenção até o parto, com o animal não perdendo mais do que um ponto no pós-parto. Ele cita que animais que perdem ECC no período seco tendem a ter mais doenças depois da parição (retenção de placenta, metrite e problemas digestivos), o que afeta igualmente bastante a fertilidade dos animais.

Não se pode negligenciar o espaço adequado no cocho ou de se empurrar a comida para perto dos animais, como também ter uma boa escolha dos ingredientes e formulação da dieta. A forragem deve ser de alta qualidade e a ração ter correto balanceamento energético e proteico.

Depois viriam os detalhes, com o uso de suplementos que possuem comprovação científica, como a colina protegida, sais aniônicos, aminoácidos protegidos, ácidos graxos, vitaminas, minerais e microminerais orgânicos, para os quais afirma se ter melhor resultado.

Como a prevenção não resolve tudo e ainda aparecerão animais doentes, o veterinário apresentou algumas sugestões. Salienta a necessidade de identificar o mais rápido possível as vacas doentes ou que vão adoecer, que receberão o tratamento mais eficaz. Isso para diminuir os dias no “hospital” e a gravidade do problema, que estão relacionados ao menor desempenho no longo prazo. Ele aponta que o excesso de zelo que já observou em alguns criadores pode ser prejudicial, pois “como os seres humanos, os animais doentes querem é ficar no seu canto descansando”, justifica.

Na reprodução, afirma que dentre os animais que se recuperam existem os que permanecerão um tempo maior sem ovular dentro do período voluntário de espera. “Hoje se fala muito no Canadá e nos Estados Unidos sobre a redução do uso de hormônios no manejo reprodutivo”, diz. Para isso, aponta que existem algumas possibilidades que diminuem o número dessas intervenções para adotar nessa fase.

Victória Fernandez: “Há várias formas de estresse que podem afetar a saúde intestinal, como o térmico, a falta de conforto animal ou o excesso de sujeira”

POUCO FALADO, O INTESTINO TEM MUITO A VER COM A IMUNIDADE

Esse é um assunto que não se costuma falar muito apesar de sua importância. “Perto de 70% do sistema imune está associado ao trato digestivo”, salienta ao início de sua apresentação a médica veterinária Victória Fernandez, que falou direto da Holanda via internet. Essa é sua especialidade dentro do setor de Pesquisa e Desenvolvimento da Trouw Nutrition Global.

Ela chama a atenção para os desafios existentes para a saúde gastrointestinal pelos múltiplos fatores envolvidos em todo o ciclo produtivo do animal. Para melhor entendimento, é preciso considerar que o intestino não tem só a função de absorver nutrientes, mas também representa uma barreira a qualquer corpo estranho, bactérias ou vírus. Muito sensível, sofre com mudanças de pH e com o estresse. Como exemplo, a veterinária cita que várias formas de estresse podem afetar a saúde intestinal, como o térmico, a falta de conforto animal ou o excesso de sujeira. Nessa situação igualmente entrariam o estresse provocado por doenças e o parto.

A dieta também afeta, principalmente nas mudanças, como de uma alimentação pré-parto para uma de alta produção. De uma com predomínio de volumoso para uma à base de grãos. Alterações em sua qualidade e nos ingredientes também influenciam.

No aspecto do consumo, conta que a restrição na ingestão seria outro aspecto prejudicial, como no caso de um vagão forrageiro que quebra com o animal permanecendo muitas horas sem se alimentar ou no pós-parto, com a perda de apetite. Ao retornar com muita fome, a ingestão de uma grande quantidade de ração trará problemas.

Todos os esses fatores, como explicou, podem levar ao chamado intestino permeável (leaky gut, em inglês), quando este começa por alertar todo o organismo de que algo de errado acontece, fica inflamado e acaba por deixar que elementos indesejáveis penetrem no animal. Esse quadro provoca uma inflamação sistêmica, com febre, aumento da frequência respiratória e pressão arterial. Isso custa muita energia e aminoácidos ao animal, levando ao seu emagrecimento, além de parar de comer.

A acidose no rúmen, que é o órgão mais robusto para enfrentar o problema, deixa passar nessa situação mais amido e toxinas que causarão a inflamação do intestino delgado e, mais do que isso, quando chegam ao início do intestino grosso (ceco) causarão também aí acidose, pois tem ambiente favorável para isso, gerando o intestino permeável. A importância de um bom tamponamento, segundo a veterinária, vem não só da necessidade de prevenir problemas no rúmen, como também evitar o intestino permeável.

Como estratégias nutricionais para controlar o intestino permeável, a pesquisadora sugere três alternativas: o uso de minerais adequados, os probióticos e os prebióticos.

No primeiro aspecto ressalta a importância do zinco, que comprovadamente tem papel importante no sistema imune do animal. Mas a questão é que existem diferentes fontes do mineral, as quais pesquisou vendo seus resultados. A conclusão a que chegou é de que os melhores resultados acontecem com aquelas que se mostram mais estáveis e biodisponíveis, citando o caso do hidróxido de zinco e alguns quelatos, com impactos melhores do que os de fontes inorgânicas.

Quanto aos próbioticos, apontou benefícios de algumas leveduras vivas, micro-organismos bacterianos e alguns extratos de leveduras.

Sobre os prebióticos que citou, ainda não disponíveis no Brasil, conta que são nutrientes para os organismos naturais do trato gastrointestinal que são resistentes à passagem pelo rúmen. Ao chegar no intestino favorecem o desenvolvimento de bactérias benéficas.

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