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Dieta especial para vacas no periparto é a primeira providência que o produtor deve tomar para evitar problemas com o rebanho

PERÍODO DE TRANSIÇÃO

Uma fase muito crítica

e que não admite descuidos

Cada etapa do processo de produção de leite tem lá suas particularidades, que não podem ser ignoradas, sob pena de acarretarem transtornos e prejuízos. Este é o caso do período de transição

João Antônio dos Santos

Como já se disse que na pecuária leiteira a palavra de ordem é a prevenção, o que segue nesta reportagem é mais um tema que comprova esse dito: o período de transição, também chamado de periparto. Trata-se daquela fase do fim da gestação da vaca, que abrange três semanas antes e três semanas após o parto. É uma fase em que o animal está num momento delicado, em que seu organismo sofre uma série de alterações fisiológicas, hormonais e metabólicas, além de uma queda no sistema imunológico. Isso porque, ao mesmo tempo em que a vaca tem suas necessidades de mantença, mobiliza nutrientes para o desenvolvimento do feto. E aí tem o tal do “porém”: como o feto ocupa entre 60% e 75% de sua cavidade abdominal, ela fica com a capacidade de ingestão de matéria seca (MS) limitada. Ou seja, não consegue ingerir alimento suficiente para atender a toda a necessidade de nutrientes e energia. Esse desbalanceamento nutricional abre as portas para uma série de problemas, que vão ter forte impacto em sua saúde e desempenho produtivo e reprodutivo. Daí ser indispensável uma série de cuidados com as vacas nesse período para se evitarem diversas doenças.

Ricardo Paulino: o produtor deve buscar orientação com um técnico especializado em pecuária leiteira

“A literatura sobre o assunto mostra, amplamente, que, se o produtor não dispensar os devidos cuidados no periparto, acaba comprometendo o período inteiro de lactação da vaca”, destaca o médico veterinário Ricardo Paulino de Oliveira, da consultoria VetCampo, que atua em assistência técnica nas áreas de reprodução, nutrição e manejo de bovinos, no noroeste do Estado de São Paulo. Ele destaca que os principais problemas para a vaca nesse período, tanto a primípara como a multípara, são as doenças metabólicas, como cetose, hipocalcemia, deslocamento de abomaso, e outras no pós-parto, como metrite, retenção de placenta, cistos ovarianos, etc. Há dados de estudos que indicam que esses problemas podem acometer até 60% do rebanho, em propriedades que não fazem o adequado acompanhamento das vacas no periparto. Claro, a consequência é um grande prejuízo para o produtor.

Ricardo Paulino explica que, depois da secagem, por mais que a vaca entre sadia no período seco, recebendo todos os cuidados e protocolos de secagem, todas elas passam, nas últimas semanas da gestação, pela fase de menor ingestão de matéria seca (MS) e por um momento de desbalanço nutricional.

“Por isso, a primeira providência a ser tomada é garantir uma dieta devidamente formulada, mais adensada, e proporcionar a essas vacas um ambiente adequado, ou seja, instalações confortáveis, de modo que fiquem livres de estresse térmico.”

Como a questão do conforto térmico é outro fator de suma importância para os animais leiteiros, sejam de que raça for, muitas fazendas que utilizam o sistema de compost barn reservam um espaço para as vacas no período de transição, com suficiente área de cocho e bebedouros, de modo a evitar a disputa por comida entre elas. Inclusive, separando as novilhas prenhas das vacas adultas.

Ambiente confortável e tranquilo é tudo o que as vacas no periparto precisam, além da dieta especial

A dieta aniônica é muito utilizada – O consultor assinala que o produtor deve buscar orientação com um técnico especializado em pecuária leiteira para a formulação de uma dieta específica para essas vacas. “É comum o uso de dieta aniônica, mas também é preciso que aquela dieta que ela esteja consumindo chegue adensada. Ou seja, aumenta-se a densidade energética e proteica, para que, mesmo a vaca ingerindo menos MS, consiga ter nutrientes suficientes para atender à sua manutenção e às necessidades do feto”, diz ele, lembrando que, no período de lactação, uma vaca come entre 10 e 15 kg de ração, dependendo de sua produção, enquanto essa mesma vaca no periparto vai comer em torno de 3 kg. E tudo o que precisa de nutrientes tem de estar dentro desses 3 kg.

Ela vai passar, num curto período, de gestante não lactante para gestante lactante. Isto é, tem a exigência nutricional aumentada, devido ao crescimento fetal, ao desenvolvimento da glândula mamária, à produção de colostro e ao início da produção de leite. “Coincidentemente, num momento em que reduz seu consumo de matéria seca, ela aumenta toda a sua atividade metabólica. Por isso, é um período extremamente importante, que deve ser monitorado o tempo todo”, recomenda Ricardo Paulino.

Vale a pena destacar ainda que é possível monitorar, por meio da análise do pH da urina da vaca, se a dieta aniônica está sendo efetiva. É uma prática simples, já utilizada em muitas fazendas, com excelentes resultados na prevenção de problemas, como hipocalcemia, retenção de placenta, metrite, cetose, deslocamento de abomaso, acidose ruminal, entre outros. “É justamente devido ao impacto negativo dessas doenças que as fazendas mais profissionalizadas dão a devida atenção aos cuidados no período de transição. Os riscos são altos e representam significativo prejuízo, tanto no que diz respeito aos tratamentos e medicamentos, como também no consequente dano ao desempenho produtivo e reprodutivo do animal”, reforça o consultor.

Boa parte dos problemas, aliás, surge após o parto. Por exemplo, a hipocalcemia, que ocorre às vezes entre a primeira meia hora e duas horas após o parto, em que a vaca fica muito prostrada e não consegue se levantar. Algumas fazendas já dispõem de um aparelho que rapidamente afere o nível de cálcio no sangue, a partir de uma amostra do sangue da vaca. Essa é a primeira doença que o produtor vê após o parto. Depois disso, nota o consultor, pode surgir uma metrite puerperal aguda 48 horas após o parto; também a cetose lá pela segunda semana; deslocamento do abomaso, com 10 a 15 dias depois e assim vai.

Seja em que sistema for de produção, o fundamental é garantir a dieta corrreta e conforto para as vacas

Ricardo Paulino faz questão observar que nas fazendas profissionalizadas, em que tais cuidados fazem parte da rotina de suas boas práticas e protocolos, são muito raros esses problemas.

“Tudo se resume naquilo que é fundamental na fazenda leiteira: prevenção. E reforço mais uma vez: como cada fazenda tem suas particularidades, em termos de rebanho, manejo, dietas, etc., o fundamental é contar com a orientação de um técnico especialista em produção leiteira. Não há uma receita de bolo, mas apenas a receita para a situação desta ou daquela fazenda, num momento de disponibilidade dos ingredientes da dieta no mercado”, diz.

Escore corporal – Outro ponto que merece atenção diz respeito ao escore corporal da vaca ao parto – não deve parir nem gorda nem magra. E essa condição tem a ver também, após o parto, com o balanço energético negativo (BEN). Isso porque, ao entrar no período em que vai aumentando sua produção de leite, a vaca tem requerimentos nutricionais altos para dar conta dessa produção. Daí ocorre o BEN: a demanda energética é maior do que ela consegue ingerir de alimentos energéticos. Para atender a suas necessidades nutricionais, ela acaba mobilizando gordura e energia dos tecidos, o que faz com que perca muito peso, reduzindo seu escore corporal nesse período de desbalanço energético.

Por isso é importante manter a dieta adensada do período do pré-parto para que ela, após o parto, dependa o mínimo possível dessa mobilização de gordura de seus tecidos. Uma vaca que vai parir nem gorda nem magra, num escore corporal entre 3 e 3,5, não vai sofrer tanto. “Se no parto, por exemplo, ela estiver com escore corporal 5 e comendo pouco, na hora em que começar a produzir muito leite, vai ‘queimar’ toda essa gordura, o que acaba levando à cetose, que é uma das principais doenças metabólicas”, explica o consultor.

Ele aponta a consequência: com esse problema, a vaca demora mais para atingir o pico de lactação. E também, ao perder escore corporal, demorará mais para retornar o serviço pós-parto, dar o primeiro cio, o que interferirá no seu desempenho reprodutivo. “Isso quando também não surgem outros problemas, já que a vaca ainda está com imunossupressão (redução de imunidade) e muito suscetível a doenças.”

O que fica de lição para os produtores minimizarem ou evitarem essa gama de problemas no período de transição de suas vacas é fundamentalmente: a adequação nutricional e a garantia de conforto para elas. Ou seja, formular a dieta adensada, a adaptação ruminal, no pré e no pós-parto, em condições confortáveis e isentas de qualquer tipo de estresse. “São esses os requisitos básicos que o produtor não pode negligenciar, sob pena de amargar altos prejuízos financeiros: tratamentos e o comprometimento no desempenho produtivo e reprodutivo que repercutir ao longo da lactação.”

 

LEVEDURAS VIVAS ESTIMULAM A MICROBIOTA RUMINAL E AJUDAM NO APROVEITAMENTO DOS NUTRIENTES

A fase de transição não tem esse nome por acaso. Ela engloba a transição de diversas coisas: estado fisiológico e hormonal, estado gravítico, corporal, dieta, etc., explica o médico veterinário Lucas Mari, doutor em Ciência Animal e gerente de Suporte Técnico da Lallemand para a América do Sul, acrescentando que tudo isso traz variações que afetam os diversos tecidos e órgãos.

“Se pensarmos em termos de dietas, as vacas passam de uma dieta geralmente de alta proporção de forragem e baixo nível de concentrado, o que resulta em baixa taxa de fermentação ruminal e menor consumo de matéria seca e, após o parto, passam para uma dieta de maior proporção de concentrado e menos forragem, o que, usualmente, apresenta maior fermentação no rúmen. Há aumento na ingestão, o que resulta em maior taxa passagem também”, diz ele.

Ele nota que um dos órgãos que sofrem essa mudança no período de transição é o rúmen, que é afetado em seu pH, em sua microbiota – que é a população de microrganismos ruminais – e em seu epitélio. Assim, a manutenção da saúde ruminal é chave para o bom funcionamento do órgão e, consequentemente, da digestão, da produção e da eficiência alimentar. 

Lucas Mari: o uso de leveduras vivas na dieta é, comprovadamente, efetivo em diversas fases da produção leiteira, especialmente para as vacas no período de transição

“Em termos fisiológicos, a vaca, no período de transição, passa por alterações hormonais e metabólicas que podem se assemelhar à resposta inflamatória, com produção de citocinas, por exemplo. Essas alterações acabam por interferir no seu metabolismo, demandar energia e, em alguns casos, desencadear patologias.”

Ante tais condições de redução da eficiência alimentar, Lucas Mari observa que o uso na dieta de aditivo composto por leveduras vivas, uma tecnologia que está no mercado há mais de 20 anos, contribui para recuperar a saúde ruminal dos animais, sobretudo nessa fase. Ele explica ainda que a levedura viva é, comprovadamente, efetiva em diversas fases da produção leiteira. “Se fôssemos indicar a fase inicial de uso, esta seria o pré-parto, ou seja, aproximadamente três semanas antes do parto”, diz ele, citando estudo recentemente publicado no Journal of Dairy Science, realizado pelo grupo de pesquisa do IRTA de Barcelona, liderada pelo Dr. Alex Bach.

Esses pesquisadores verificaram o importante papel que a levedura teve em estimular a expressão gênica de proteínas que fazem a junção das células epiteliais do rúmen, mantendo a integridade deste epitélio. Isso traz como benefício menor passagem de toxinas e redução na produção de citocinas inflamatórias. “Vale lembrar que esta menor resistência à inflamação pode ser traduzida em ‘economia’ no gasto energético, direcionando esta energia, por exemplo, para maior produção de leite, recuperação de condição corporal, dentre outras respostas metabólicas”, diz.

As leveduras vivas são probióticos. Vale ressaltar que somente microrganismos vivos podem ser classificados como probióticos. Elas estimulam o desenvolvimento do rúmen e seu epitélio em animais jovens, regulam o pH ruminal por diversas maneiras (competição por substrato e consumo de lactato ruminal), favorecem o ambiente ruminal por consumirem também o oxigênio residual. Isso tudo resulta na manutenção da microbiota adequada no rúmen que, finalmente, aumenta o aproveitamento dos alimentos e leva ao maior aporte de proteína microbiana para o intestino. “Note-se que tem sido bastante estudada a questão de maior aproveitamento da fibra. O efeito da levedura viva em melhorar a digestibilidade da fibra de forragens tropicais foi comprovado numa ampla pesquisa, coordenada pelo professor João Daniel, da Universidade Estadual de Maringá”, relata Lucas Mari.


Incorporado na ração – As leveduras vivas, na forma de aditivo, podem ser adicionadas diariamente na ração das vacas leiteiras, ou também por meio de premixes, núcleos ou rações de diversas empresas de nutrição. A quantidade é de alguns gramas/vaca/dia, mas isso corresponde a alguns bilhões de células dessa levedura diariamente.

Lucas Mari explica que, com base nas diversas dietas que se utilizam no Brasil, com ingredientes bastante diferentes e rebanhos com produções variáveis, constata-se que, em rebanhos especializados, o retorno sobre o investimento desse tipo de aditivo supera os 4 para 1, ou seja, retorno de R$ 4 para cada R$ 1 investido, no mínimo.

“E isso estamos falando apenas em termos de produção de leite, mas por tudo o que foi exposto anteriormente, vemos que os benefícios não computados ainda estão relacionados à saúde e ao metabolismo”, ressalta, observando que o aditivo de leveduras vivas é acessível economicamente a propriedades leiteiras de qualquer porte. “Nas avaliações de retorno sobre o investimento, consideramos as mais diversas propriedades. Também são acessíveis em relação ao produtor encontrar o produto em mercado, já que há distribuição nacional do produto.”

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