balde branco

CRÔNICA

Paulo do Carmo Martins

Chefe-geral da Embrapa Gado de Leite

 Com ciência e planejamento, o Estado melhorou a produtividade, expandiu a produção e assumiu a condição de maior produtor de café do Brasil”

Prêmio Nobel para o Pelé do agro

Eis que surge uma unanimidade inteligente, numa sociedade que tem exercitado intensamente a discórdia. Sim! Todos queremos Paolinelli Nobel da Paz! Mas por que ele?

Na adolescência, Paolinelli revelou ao pai o seu sonho de ser engenheiro agrônomo e teve de mostrar aptidão, gerindo antes uma pequena propriedade. Esta experiência lhe fez sensível à teoria, pelo exercício da prática, e lhe mostrou a dimensão humana no ato de produzir. De um lado, vivenciou as agruras de quem produzia sem apoio institucional. De outro, ele viu como o produtor é empreendedor, sempre ansioso por inovar e crescer. E viu na ciência a mola da inovação.

Na Universidade Federal de Lavras (MG) se formou, foi professor e deixou o seu reitorado, com 35 anos, para assumir a Secretaria de Estado da Agricultura. Destacou-se já no início, quando se rebelou contra a decisão do Ministério da Agricultura, que atuava para erradicar pés de café. Sob sua liderança, Minas foi no sentido contrário. Com ciência e planejamento, o Estado melhorou a produtividade, expandiu a produção e assumiu a condição de maior produtor de café do Brasil, título que ostenta há cinco décadas. Dali a ser ministro da Agricultura foi questão de tempo.

Paolinelli foi ministro do governo Geisel, que teve no planejamento e na ciência suas marcas. Sem ingerências políticas, sua equipe tinha um viés meritocrático. Ele me disse que Geisel fazia reuniões mensais com os ministros, e que as discussões eram pautadas por textos enviados previamente pelas pastas. Geisel não só os lia, como fazia neles anotações pessoais. Incrível, não?

Enquanto os futuros pesquisadores estudavam no exterior, Paolinelli inaugurava centros de pesquisa da Embrapa e fortalecia a infraestrutura das universidades e institutos, configurando um sólido Sistema Nacional de Pesquisa Agropecuária. Assim, teve início a construção da agricultura tropical diversificada e movida a ciência, algo inédito no mundo até hoje. Sim, somos os únicos no mundo tropical! Naquele momento o Brasil se urbanizava rapidamente e o alimento ficou escasso e caro. Paolinelli, então, organizou o mercado interno, do armazenamento à comercialização, por meio da Cobal, da Conab, do Cibrazem e dos Ceasas. Isso resultou na queda do preço dos alimentos nas cidades.

Paolinelli diz que o “brasileiro tem menos ódio e mais amor”. Para ele, estamos estruturando “a primeira civilização tropical do mundo, construída com carinho e com amor”. Ele é desses raros sonhadores e visionários do bem, de olhos cintilantes, que misturam intensamente razão e emoção e propagam ideias e imagens que movem mentes e corações. É isso o que ele vem fazendo, continuamente. Desde 1971, há meio século inspira a inovação na agricultura, que junta a ciência feita pelo Estado e o empreendedorismo praticado pelos produtores.

Hoje, o Brasil é garantidor de preços de alimentos acessíveis para o mundo. Colhemos duas safras anuais de milho e logo teremos a terceira, por uso da irrigação, enquanto o mundo de clima temperado continua colhendo somente uma. E somos tão competitivos que abastecemos a Ásia, os países árabes, a Europa, a África e até o México, um mercado típico dos Estados Unidos.

O conhecimento popular diz que “onde falta pão, todos discordam, ninguém tem razão”. Já a ciência econômica mostra que é base para o crescimento a disponibilidade abundante e barata de alimentos, fibras e energia. Se esses itens são caros, há redução do poder aquisitivo dos trabalhadores e isso traz insatisfação política. Além disso, com custos maiores, a oferta de bens e serviços urbano-industriais é afetada e empresas tornam-se menos rentáveis. Como consequência, menos investimentos são feitos, afetando o nível de emprego e renda, o que leva a um quadro de economia sem dinamismo. Inflação no preço de alimentos e desemprego não criam ambiente de paz. A obra de Paolinelli é o antídoto.

Nobel da Paz? Por que não ele? A lista de agraciados entre 2001 e 2020 mostra sete entidades ou campanhas mundiais: Organização das Nações Unidas, Agência Internacional de Energia Nuclear, Organização para a Proibição de Armas Químicas, Campanha Internacional para a Abolição das Armas, Painel Internacional sobre Mudanças Climáticas, e até União Europeia e o Programa Alimentar da ONU. Todas são meritórias e importantes para o mundo. Mas todas são burocráticas e de eficiência baixa.

Também foram agraciadas seis personalidades, como Malala Yousafzai e Muhammad Yunus, notório por popularizar o microcrédito para empreendedores pobres. Os outros são Kofi Anan, Barack Obama, Jimmy Carter e Al Gore. Estes, que legados efetivamente deixaram? Há, ainda, agraciados com ações localizadas na Colômbia, Tunísia, Congo, Etiópia, Iraque, Índia, Iêmen, Libéria, Quênia, Irã, Coréia do Sul e China.

Paolinelli é a inovação contínua. Há cinco décadas seu legado está vivíssimo e é do tamanho do mundo. Ele já foi agraciado com o Prêmio Mundial de Alimentação – o Nobel da Comida. Para o nosso Pelé do Agro, chegou a hora do Nobel da Paz.

Abrir bate-papo
1
Escanear o código
Olá 👋
Podemos ajudá-lo?