CRÔNICA

Paulo do Carmo Martins

Chefe-geral da Embrapa Gado de Leite

 O Brasil conquistou 57, sendo cinco super ouro. Fomos o país que mais conquistou medalhas, depois da França. Ganhamos de italianos, alemães, suíços e suecos”

Primavera de queijos

Meu mês preferido é setembro. Sempre me traz coisas boas. Setembro é o início da primavera. Nos meses que antecedem, sempre me pego cantarolando mentalmente a música “Sol de Primavera”, que Beto Guedes imortalizou, que diz…“quando entrar setembro e a boa nova andar nos campos…”

Setembro trouxe boas novas no campo. Mais que flores, trouxe medalhas coloridas. E vieram pelas mãos de produtores brasileiros de queijo artesanal. Sim, eles sonharam grande. Participaram da Copa do Mundo de Queijos na França. É a quinta vez que este campeonato mundial se realiza e vem crescendo ano a ano, com mais países concorrendo à premiação. Em 2019, quando os brasileiros participaram pela primeira vez, eram 700 queijos de 20 países na disputa. Desta vez, foram 900 queijos de 46 países.

A regra da Copa do Mundo é clara, como diria o Arnaldo. A disputa não é direta e explicitamente entre os queijos participantes, mas uma avaliação de cada um. Em cada mesa imensa são colocados muitos queijos e é designada uma comissão específica de julgadores, todos especialistas. Eles atribuem notas individualmente, de 0 a 20, para cada queijo, considerando aparência (externa e interna), e sabor, até dez pontos cada.

Ao contrário de uma Olimpíada, os queijos não concorrem entre si, portanto, e podem ser classificados como ouro, prata ou bronze. Após designar as medalhas para aqueles que se destacam, os avaliadores podem ou não atribuir a medalha super ouro para um único queijo em cada grande mesa, caso haja algum que se destaque muito, mas muito mesmo, em relação aos demais.

Este ano o Brasil participou com 183 queijos, de produtores de Minas Gerais, São Paulo, Paraná, Goiás, Mato Grosso do Sul e Pará. São queijos selecionados previamente pela SerTãoBras, uma associação que reúne produtores de gostosuras artesanais. Este ano a Copa do Mundo do Queijo distribuiu 331 medalhas e o Brasil conquistou 57, sendo cinco super ouro. Fomos o país que mais conquistou medalhas, depois da França. Ganhamos de italianos, alemães, suíços e suecos.

Os cinco queijos agraciados com a medalha super ouro foram o “Quilombo da Cachaça”, do Ivacy dos Santos, da Região do Serro (MG); o “Canastra do Ivair” e o “Canastra Serjão”, ambos da Região da Canastra (MG), sendo que o Canastra do Ivair conquistou esta super medalha pela segunda vez; o “Santo Casamenteiro”, do município de Cruzília (MG); e o “Pardinho”, do município paulista com o mesmo nome – o laticínio super campeão este ano, ao arrebatar também uma medalha de ouro e outras duas de prata.

Mas, no apagar das luzes de setembro, mais uma notícia de impacto surgiu. Sim, a loja Queijo D’Alagoa-MG acaba de ganhar o Prêmio Tripadvisor Trevellers’Choice 2021. Passo a palavra para Kanika Soni, diretora comercial da Tripadvisor, a maior plataforma de viagens do mundo. Ela disse que “esse prêmio destaca os lugares que são conscientemente excelentes, proporcionando experiências de qualidade repetidas vezes, atendendo às expectativas dos clientes e adaptando-se às novas formas de trabalhar. Com base em um ano inteiro de avaliações de clientes, este prêmio demonstra o excelente serviço e a experiência fornecida aos turistas mesmo em meio a uma pandemia”.

Vamos entender a importância deste prêmio. A Tripadvisor, todo ano, escolhe os melhores lugares do mundo para se visitar, votado pelos turistas: restaurantes, hotéis, praias…Pois a loja Queijo D’Alagoa está entre um dos lugares que se devem visitar antes de morrer. Acontece que ninguém sabe onde fica Alagoa. Ninguém nunca foi lá. Mas, o que é que a Alagoa tem?

Alagoa fica na Serra da Mantiqueira, no sul de Minas Gerais. Tem uma população de 2.700 habitantes, dos quais 112 são queijeiros. Eles achavam que produziam um queijo parmesão. Até que um dia o Osvaldinho ouviu de um importante chef que aquilo não era parmesão. Ele então procurou a pesquisadora Maria de Fátima Ávila Pires, que reuniu uma equipe da Embrapa Gado de Leite e técnicos da Emater/MG e do IMA. Disso resultou o apoio aos produtores sobre os cuidados para se produzir queijo a partir do leite cru, a certificação de origem e a base para a legislação do Selo Arte.

Pois, este Osvaldinho, mineirim muito faladô, criou a primeira loja de queijo da cidade. E criou o e-commerce de queijo ainda em 2011, vendendo e entregando para todo o Brasil. Comercializa duas toneladas mensais de queijos artesanais, feitos por dez produtores de Alagoa. Além disso, com o seu sucesso, inspirou o surgimento de outras oito lojas de queijo na cidade. Ele se considera um “tropeiro digital”.

O Osvaldinho, você há de convir, é um fenômeno. Ele mora num município que tem apenas 2.700 habitantes, três ruas, que não é caminho para nada. Durante a pandemia, o Osvaldinho conseguiu essa certificação da Tripadivisor para uma loja física???? Durante a pandemia???? Mais do que o queijo, quem tem de ser estudado é o Osvaldinho…Afinal, como um jovem de 36 anos consegue irradiar riqueza para uma comunidade, não sendo governo?

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