balde branco

Confinamento dos bezerros, numa parceria entre a Délimax, do Canadá, e o Laticínio Jussara 

NICHO DE MERCADO

Projeto de vitelo leiteiro promete
NOVOS E BONS NEGÓCIOS

Com ajuste na legislação, a exportação se tornou viável, permitindo produzir mais e desenvolver o mercado interno

Luiz H. Pitombo

C lassificada como produto de um animal com menos de um ano de idade alimentado com leite, derivados de leite, fibras e ração, a carne de vitelo leiteiro ainda é pouco conhecida no Brasil. Já é, porém, muito apreciada na Itália, na França, na Alemanha, nos Estados Unidos e no Canadá. Também há consumo no Oriente Médio, no Norte da África e na Ásia. Os grandes produtores mundiais são os holandeses, com a maior empresa local abatendo semanalmente 25 mil cabeças. Na América do Norte, uma das empresas de destaque é a canadense Délimax, que processa mais de 2.500 vitelos leiteiros por semana. Este número poderá ser atingido também no Brasil, a partir da joint venture que a Délimax estabeleceu com a Indústria de Laticínios Jussara, de Patrocínio Paulista (SP), que busca animais entre seus fornecedores para o confinamento com capacidade estática para 640 cabeças. Representantes do setor estimam que o Brasil produza anualmente 4,5 milhões desses animais, o que pode fazer do País o maior exportador mundial de vitelo leiteiro. Hoje, no Canadá, já existe falta de bezerros e este animal, que tem mercado e leilões próprios, pode render ao pecuarista de leite o equivalente a R$ 400 a R$ 600/cabeça. Além do negócio em si, que traz rendimento aos confinadores e aos produtores, o trabalho permite um destino nobre aos animais que não possuem função rentável dentro do sistema produtivo leiteiro, sendo muitos simplesmente sacrificados.
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“Vender os bezerros significa retorno de parte do investimento e uma renda a mais para o produtor”
Geraldo Borges

Ajuste necessário – Em junho do ano passado, quando se iniciou o primeiro abate dirigido ao mercado externo – no caso um contêiner com a carne de 105 vitelos devidamente embalada para testes em Dubai, nos Emirados Árabes –, os trabalhos foram interrompidos pelo Serviço de Inspeção Federal (SIF), pois a classificação do lote não era condizente com a legislação. Os animais haviam sido alimentados com ração também, quando deveriam ter recebido somente leite e dietas líquidas, segundo a Resolução n° 1, de janeiro de 2003 (Mapa/Dipoa), versando sobre nomenclatura de classificação e rotulagem de vitelos.

Os responsáveis pela joint venture Délimax- Jussara iniciaram, então, um trabalho para atualizar a norma frente ao mercado mundial que aceita este tipo de alimentação. Por meio de contato com o produtor de leite Roberto Jank, vice-presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Leite (Abraleite), a questão chegou até a entidade e seu presidente, Geraldo Borges, que procurou o Ministério da Agricultura para acelerar o processo.

Em 21 de janeiro deste ano, foi publicada, no Diário Oficial da União, a Instrução Normativa n° 2, que mudou a redação anterior, regularizando a situação e permitindo que as atividades fossem retomadas. Agora, novos abates estão previstos para maio, ajustando-se as escalas até o abate semanal de 30 animais e a entrada de outros 30 em confinamento. Quanto à carne de vitelo já preparada anteriormente, está congelada, em perfeito estado de conservação.

O presidente da Abraleite se mostra otimista em relação às oportunidades que esse mercado pode trazer, porque “o produtor vai recuperar algo do que investiu em termos do sêmen ou um medicamento e dará destino adequado aos bezerros machos”, justifica. Aponta igualmente que é possível utilizar com vantagem as sobras da agricultura para a alimentação, como palha de feijão e outras.

Borges afirma que pretende difundir a prática e que iniciou conversas com entidades como a Associação Brasileira de Frigoríficos (Abrafrigo), sugerindo que a atividade possa ser realizada em parceria com confinadores, cooperativas e investidores. Contudo, também reconhece que por hora o mercado interno necessita de desenvolvimento.

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“Os vitelos produzidos aqui são mais competitivos e sua carne poderá conquistar novos mercados no exterior”
Luís Augusto Silva

Verticalização – A empresa canadense está no mercado há 30 anos e possui na América do Norte 106 confinamentos próprios e mais de 100 integrados. Também conta com uma fazenda para a produção de alimentos, fábrica de ração e de sucedâneos lácteos, dois abatedouros e três frigoríficos. Trabalham unicamente com bezerros leiteiros e os contratos de aquisição dos animais passam obrigatoriamente pela associação local de produtores de leite, em função da regulação estatal do mercado e de cotas de produção. Por ano, abate entre 130 mil e 150 mil vitelos leiteiros, com tecnologia de engorda própria.

“No Brasil, os planos também são de verticalização”, afirma Luís Augusto Silva, coordenador do projeto pelo lado canadense. Antes da parceria com o laticínio, a empresa havia se instalado em Cascavel (PR), em 2008, mas identificou melhores condições no novo formato de negócio em São Paulo, que começou a funcionar em 2016.

Segundo informa Silva, a questão envolvendo a rotulagem havia passado despercebida anteriormente, mas surgiu quando precisaram mudar de abatedouro. Com a alteração feita, diz que a legislação permite técnica e economicamente desenvolver o negócio, salientando que é inviável do ponto de vista financeiro se os animais forem alimentados somente com leite e dietas líquidas.

No caso brasileiro, acrescenta que os custos são menores do que os da América do Norte, também por dispensar galpões fechados no inverno, quando a temperatura bate nos 25 graus Celsius negativos. Assim, a carne dos vitelos aqui produzidos é mais competitiva e poderá conquistar novos mercados, como o de Dubai. Embora animais cruzados com o Girolando possam ter resultado superior no confinamento, Silva relata que, de imediato, serão mantidos os Holandeses puros, já que a Délimax está habituada à raça, sobre a qual acumula conhecimento.

Como diferencial da carne de vitelo, conta que sua coloração é mais clara e rosada, embora também seja possível atender a consumidores que a desejem mais avermelhada. Seu sabor é suave e ao gosto dos chefs de cozinha que procuram deixar sua “assinatura” nos pratos por intermédio de temperos, por exemplo. Esta carne não tem marmoreio de gordura, pois esta camada ainda não se formou aos 7 ou 8 meses de idade do vitelo, que é quando é abatido, aos 260-280 kg de peso vivo. Outro fator muito apreciado por restaurantes e hotéis é a padronização que se consegue nos cortes, facilitando a homogeneidade nos processos de preparo.

O mercado brasileiro, que prefere o vitelo mais claro, precisará ser trabalhado e desenvolvido, salienta Silva. Enquanto ainda não existe essa cultura, diz que apenas 30% de um animal é efetivamente vendido como vitelo e os 70% restantes como carne de um boi magro. Pela carne diferenciada, recebem um valor 30% maior.

A ideia do vitelo leiteiro, assinala Silva, não é a de substituir um produto convencional, mas de se tornar uma opção, algo especial para locais e dias diferenciados para o consumidor. No Canadá, trabalham para associar a carne de vitelo ao Dia dos Namorados.

“Não será do dia para a noite, mas acreditamos que não tem como deixar de fazer o Brasil um polo consumidor e de exportação mundial, trazendo renda ao produtor e um destino nobre aos machos”, diz Silva.

PRODUTORES DA CASTROLANDA MONTAM CONFINAMENTOS

A Cooperativa Castrolanda, em Castro (PR), começou seu novo trabalho de produção de vitelos leiteiros junto aos filiados há cerca de um ano e meio, projetando um abate anual de 15 mil animais machos, retidos e engordados nas propriedades. Hoje, são perto de mil animais e os abates atingem a média de 70 a 100 vitelos/mês. As propriedades recebem todo o suporte técnico necessário, com o lucro estimado ficando em R$ 300,00 por cabeça.

Norteando o projeto, está o bem-estar animal. Isso por causa do aumento do número de machos nascidos pelo bom desempenho reprodutivo das vacas, estando aí embutida a questão de dar um destino adequado aos animais. O sistema intensivo de produção reduz a área necessária e há preocupação em reduzir a pegada de carbono do sistema. Com isso, se agrega valor aos machos, que se tornam fonte de renda, beneficiando produtores e a cooperativa.

Os animais recebem o colostro, assim como as fêmeas, e depois uma dieta liquida até o desmame aos 90 dias, podendo ser utilizado também o leite de transição ou com elevada CCS (contagem de células somáticas), o que ao fim também vai resultar num leite entregue de maior qualidade e remuneração. Após, a dieta muda totalmente para ração concentrada baseada em núcleo proteico e grão de milho fornecidos no cocho, o que facilita o manejo, pois essa ração é ministrada a cada dois dias, já que não fermenta nem esquenta.

“O volumoso foi descartado para não haver competição com as vacas e os produtores estão utilizando instalações já existentes que estavam ociosas”, diz Eduardo Ribas, gestor do setor na cooperativa. Ele conta que existem produtores com cinco animais e outros com 10.

O abate, depois de o técnico avaliar os animais, ocorre entre 7 e 11 meses de idade, com peso médio de 300 a 450 kg de peso vivo, com o rendimento de carcaça esperado atingindo de 51% a 54%. Ribas conta que estão preferindo os animais entre 10 e 11meses de idade e com pouco mais de 400 kg. A comercialização junto aos frigoríficos fica por conta da cooperativa e tem abastecido o mercado regional num negócio que cresce. A carne é mais macia, magra, tem elevada padronização e rastreabilidade completa.

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“A comercialização dos vitelos junto
aos frigoríficos é feita pela cooperativa, e a carne é distribuída no mercado regional”

Eduardo Ribas

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“No futuro, produtores e terceirizados podem se tornam parceiros
no negócio”
Gustavo Lourenço

Instalações brasileiras –  O laticínio Jussara tem uma captação diária de 1,3 milhão de litros, com o leite UHT dominando o negócio. Suas plantas estão em Araxá (MG), que futuramente poderá entrar no projeto, e em São Paulo.

Todas as instalações do confinamento foram construídas respeitando-se as normas de bem-estar animal da Europa, como gaiolas individuais usadas no início e, depois, gaiolas nas quais os animais ficam em grupos, iguais às dos modelos holandeses. Também está prevista a construção de uma indústria de soro de leite em pó para dar aos animais.

O médico veterinário Gustavo Lourenço, coordenador do projeto por parte do laticínio, conta que o interesse entre os fornecedores foi grande, mas que uma seleção se faz necessária, pois exigem ótima colostragem e cura de umbigo. Os animais são recebidos entre 10 e 20 dias de vida. No futuro, afirma que os produtores ou mesmo terceiros podem se tornar parceiros no negócio.

Lourenço destaca, na carne de vitelo, a tendência de ser mais macia, por se tratar de proteína proveniente de animais muito jovens. Além disso, tem digestibilidade e menor teor de gordura que a carne de animal adulto. “É mais saudável”, garante.

Ele reconhece que não será fácil desenvolver o mercado interno e que a exportação será o caminho, até que esse esteja consolidado. “Minha perspectiva é positiva e, se os mercados se abrirem, vamos precisar de mais 10 fazendas iguais à que temos hoje”, calcula.

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