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Nosso maior foco é qualidade do leite. Isso por ser uma área que temos uma grande afinidade e também porque a qualidade do leite é o ponto de chegada de todo um processo, que passa por diversas etapas. Logo, nosso trabalho é dependente das demais áreas, o que nos faz sempre participar da fazenda como um todo, junto com os outros técnicos, para alcançar bons resultados

ENTREVISTA

Mariana Brant

Qualidade do leite

é uma colheita de todas as áreas da fazenda

Mariana Brant Drumond Magalhães Dornas, médica veterinária formada em 2011 pela UFMG, dedicou metade do curso em estágios focados na qualidade do leite e, assim que o concluiu, começou a trabalhar no sul de Minas, no Programa Educampo/Sebrae, em parceria com uma agroindústria, atendendo produtores na área gerencial, financeira e em manejos zootécnicos. No início de 2016 começou com consultoria em qualidade do leite, inicialmente em parceria com a CCPR/Itambé. Com Pâmela Furini, fundou a +Leite, uma empresa que oferece soluções em qualidade do leite principalmente para propriedades leiteiras, mas também para laticínios.

Balde Branco – O que motivou você a optar por essa atividade, criando a consultoria +Leite?

Mariana Brant – Desde a faculdade me identifiquei muito fortemente com o trabalho em fazendas leiteiras e, dentro das possibilidades, a consultoria me atraía muito porque queria levar o conhecimento técnico adquirido dentro da universidade para o campo. Facilitar o trabalho do produtor e melhorar a vida dele sempre me encantou. Ao longo da minha carreira, trabalhei em outras áreas, mas sempre a qualidade do leite era o que eu mais gostava e, há cinco anos, já venho desenvolvendo esse trabalho em parceria com laticínios. Há dois anos, eu e a Pâmela Furini, diante de um desafio com uma agroindústria, decidimos criar a +Leite para ampliar esse trabalho, aumentar a equipe e poder atender o maior número de fazendas com a metodologia que a gente já trabalhava e sabia que levava a resultados muito eficientes para eles.

BB – Como é constituída a +Leite – em que regiões atua, número de fazendas que atende e qual o perfil de produtores?

MB – A +Leite é constituída por duas sócias, eu e Pâmela, que gerenciam o negócio e que também são consultoras das contas-chave e responsáveis por todo o desenvolvimento e gestão de dados. Nas demais propriedades, trabalhamos com consultores parceiros que são monitorados e treinados por nós para desenvolver essa metodologia junto a eles. Atualmente, atendemos cerca de 45 produtores em Minas Gerais e sul da Bahia, com um perfil muito variado e uma produção de leite vai de 300 a 27 mil litros por dia. Nosso principal foco é qualidade do leite, sim. Isso porque ela é uma colheita de todas as áreas na fazenda, se ela não é boa, normalmente a fazenda também tem resultados ruins em outros pontos. Logo, nosso trabalho é dependente das demais áreas, o que nos faz sempre participar da fazenda como um todo junto com os outros técnicos para alcançar os bons resultados.

BB – Por onde começa a qualidade do leite?

MB – Ela começa na decisão e no comprometimento do dono da propriedade ou de quem tem o papel dele (gerente) em querer produzir um leite de qualidade. A partir dessa decisão, a propriedade toda olhará diferente para o seu negócio e vai atentar para a abertura ao nosso trabalho, a escolha e o treinamento da equipe, aos exames que devem ser realizados.

BB – Qual é o papel da indústria – privada e cooperativas – num trabalho em prol da melhoria da qualidade da matéria-prima? A indústria cumpre seu papel?

MB – O papel da indústria é fundamental, uma vez que ela tem o mapeamento de toda a rede de produtores e acesso ao resultado de cada um deles. Ela tem o poder de acessar esse produtor e levar a ele a informação e a capacitação. Muitas delas, como é o caso da CCPR (Cooperativa Central de Produtores Rurais), já desenvolvem muito bem esse trabalho tanto com a equipe interna quanto com a terceirização, por meio de parcerias com empresas como a +Leite e os resultados desse trabalho em conjunto são muito bons.

BB – No geral, no grupo de propriedades que você atende, quais os principais gargalos, problemas e falhas que você tem encontrado?

MB – O principal gargalo, não podemos negar, é a mão de obra. Ter uma equipe capacitada e motivada que execute o trabalho com atenção todos os dias da mesma forma. Ainda é muito comum a rotatividade dos colaboradores na fazenda, seja por incompatibilidade com o trabalho, dificuldade de relacionamento, seja por maior atratividade em outras áreas, etc. Na nossa metodologia, fazemos reuniões com a equipe e discussões para mostrar os resultados, a importância do trabalho deles para isso, os parâmetros que precisamos perseguir e o que fazer a cada mês para chegarmos lá. Usamos muito painéis com a gestão dos dados à vista, que são afixados em locais onde todos têm acesso e neles colocamos diagramas, orientações, fotos, gráficos, tudo moldado de acordo com a escolaridade das pessoas envolvidas e com o que cada fazenda precisa. Outro gargalo importante é o equipamento de ordenha. Precisamos garantir um bom funcionamento da máquina e as revisões em dia, tanto para controle da CBT quanto da CCS, pois é ela que entra em contato duas a três vezes por dia com o teto no processo de ordenha. Ações como montar um calendário de manutenções e trocas com base no dimensionamento do rebanho e da máquina e criar um check list para o responsável na fazenda conferir o processo de limpeza e funcionamento do equipamento facilitam muito nosso trabalho no dia a dia e auxiliam na prevenção de eventuais socorros na máquina e aumentos de CBT. Com o avanço do meio digital, o produtor e até os funcionários têm muito mais acesso à informação pelas redes sociais.

BB – Com as IN 76 e 77, você acha que tem sido significativa a melhoria da qualidade?

MB – As INs 76 e 77 estão pressionando sim o produtor a se enquadrar na legislação, principalmente pela interrupção na coleta do leite caso a CPP esteja acima de 300 mil UFC/ml de leite na média geométrica dos últimos três meses. Acredito que principalmente os laticínios menores, que ainda não se preocupavam muito com a legislação, após a divulgação das normativas passaram a ter ações mais efetivas junto aos fornecedores de leite e se enquadraram dentro do que está sendo exigido, o que é muito positivo também.

A qualidade do leite começa na decisão do dono da propriedade ou de quem tem o papel dele (gerente ou responsável) em querer produzir um leite de qualidade”

BB – Ao iniciar a consultoria numa fazenda, quais são suas primeiras providências e orientações ao produtor?

MB – O primeiro passo para o início da consultoria é o diagnóstico, é entender os desafios da fazenda específica e detalhadamente. Nessa primeira visita, acompanhamos toda a rotina de ordenha, de limpeza dos equipamentos, mapeamos os resultados dos anos anteriores, visitamos o ambiente dos animais, levantamos como é a relação entre as pessoas, como é o comportamento delas, como é a gestão na fazenda, como são os tratamentos e todos os outros processos ligados à qualidade do leite. Somente entendendo esses processos e estando com o máximo de informação na mão podemos traçar, junto ao proprietário, o gerente e os demais envolvidos, o caminho que se deve percorrer para alcançar os resultados almejados. Nosso trabalho começa sempre do básico, que é garantir uma boa rotina de ordenha para os animais. Focamos muito nesse ponto, pois mesmo nas fazendas mais tecnificadas sempre há detalhes que podem ser ajustados. Vale ressaltar a importância da capacitação da mão de obra, pois os resultados dependem desse treinamento e da constância na realização dos procedimentos e no dia a dia de trabalho fazemos capacitações em diferentes níveis junto da equipe.

BB – Quais os aspectos mais importantes para o controle eficiente da mastite (CCS), assim como na limpeza/higiene no processo de ordenha (CBT)?

MB – Como já falei antes, o principal ponto é o treinamento da mão de obra para garantir uma boa rotina de ordenha, que seja confortável para os animais, o que só vai ocorrer com um equipamento de ordenha que tenha um ótimo funcionamento e configurado para aquele tipo de rebanho. Parece simples, mas são 365 dias por ano que exigem persistência e motivação da equipe. Além disso, precisamos contar com boas anotações na fazenda para termos o histórico do rebanho de partos, secagens, tratamentos de mastite, entre outros. A gestão desses dados é essencial para a qualidade do leite. Outro ponto são as análises individuais mensais dos animais, seja pela realização de CMT, seja pela coleta do leite para CCS eletrônica, pois essas análises permitem identificar os animais que apresentam mastite subclínica, ou seja, que é imperceptível apenas no teste da caneca. Com isso, saberemos quem são os animais crônicos, isto é, que estão sempre com a CCS alta, e traçar estratégias para reduzir esse número de animais. Saberemos também como os animais estão parindo, qual é a CCS após o parto e como está a eficiência do medicamento que está sendo usado para a terapia de vacas secas. A realização da cultura microbiológica também é uma ferramenta necessária para saber quais são os agentes presentes no rebanho, controlar agentes contagiosos e descartar animais com patógenos com baixa taxa de cura, como é o caso do Staphylococcus aureus. Aliás, o descarte é também uma ferramenta importante, não insistir com animais que são problema, que têm muitos casos de mastite e até mesmo a CCS alta por muito tempo.

BB – O uso indiscriminado de antibióticos ainda é elevado?

MB – Hoje, uma boa parte das fazendas já tem esse olhar para a redução do uso de antibióticos, principalmente pelo custo que isso gera para eles e pelo acesso do produtor à informação. Há ainda uma parcela grande de produtores que resistem ou que não sabem a importância disso tanto para a fazenda quanto para a população que consome esse leite. O tratamento de mastite é o principal uso de antimicrobianos na fazenda e o uso responsável deles afeta muito a cadeia como um todo. Logo, nós orientamos sobre essa responsabilidade da escolha do antimicrobiano de forma adequada, usamos protocolos de tratamento rigorosos respeitando sempre o período de carência dos medicamentos, identificando corretamente os animais em tratamento para garantir que o leite seja desviado do tanque de resfriamento e também implementamos o laboratório de cultura microbiológica na fazenda. Esse exame permite saber qual é o agente causador da mastite para direcionar o tratamento para o animal de forma adequada e também permite redução do uso de antimicrobianos em cerca de 30% a 40% pelo fato de em muitos casos não fazermos tratamento.

BB – Por que é tão fundamental todo esse trabalho para a qualidade do leite na fazenda?

MB – A qualidade do leite está diretamente relacionada com a saúde financeira da fazenda, logo, se ela estiver ruim, o produtor está perdendo dinheiro. Animais com alta CCS e com mastite clínica produzem muito menos que animais saudáveis, podendo essa diferença chegar a 30%. O custo com o tratamento de mastite é o principal custo de medicamentos em qualquer propriedade leiteira, além do risco de mortalidade de animais e descarte precoce. Por isso, executando um bom trabalho nessa área traremos maior lucro para a fazenda, além de ter maior segurança no leite produzido, redução do risco de resíduo de antibióticos, atendimento à legislação vigente e em alguns casos recebendo maior bonificação por litro de leite do laticínio.

BB – Que recado você gostaria de deixar para os produtores de leite?

MB – Estejam interessados na qualidade do leite da sua fazenda, olhem os resultados, anotem o máximo que for possível das ocorrências do rebanho, treinem os ordenhadores e demais envolvidos com os animais, analisem seus resultados. Produzir um leite de qualidade é ter compromisso com o consumidor, é ter responsabilidade com sua fazenda, é colocar dinheiro no bolso!

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