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OPINIÃO

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Roberta Züge
Diretora administrativa do Conselho Científico Agrossustentável (CCAS)

Quando se fala em qualidade leiteira,
AS MULHERES PRECISAM SER MAIS OUVIDAS

Nesta última década, a internet mudou a vida e a gestão dos negócios, transformou as relações econômicas e sociais e diminuiu as distâncias entre as pessoas. De fato, tornou-se a mídia de comunicação mais popular. Estar fora da rede é quase não estar no planeta Terra.

Pode-se afirmar que, após a era da imprensa, o rádio e a televisão revolucionaram o compartilhamento de informações. Mas, de modo geral, eram um caminho de mão única, apenas transmitiam. Já a rede mundial permite receber e transmitir. Isso criou um ambiente que alterou profundamente a comunicação entre os indivíduos, tornando possível consolidar novos laços sociais, incentivar novos comportamentos e estabelecer comunidades específicas.

O acesso à internet também tem crescido, e muitos que achavam que nunca entrariam numa rede social sentiam-se excluídos e até pessoas com pouquíssima afinidade com informática encararam os smartphones, afinal precisavam estar no planeta.

Este cenário também se consolidou no meio rural. Há grupos de trocas de mensagens que são o maior meio de comunicação entre muitos moradores do campo. É um olho na lida e outro no celular. Pode ser tratando os suínos ou selecionando as variedades para serem plantadas. Uma dúvida em uma dosagem vira uma mensagem no grupo, ou uma linda bezerra, que nasceu com uma estrela no chanfro, vira uma postagem supercomentada e elogiada.

E as mulheres também resolveram se unir. Pode-se afirmar que há um movimento, ainda não tão ruidoso, de diversas mulheres que atuam no agronegócio interagindo fortemente. Como também sou uma pessoa muito “plugada”, faço parte de alguns grupos e participo nas redes sociais, fiquei curiosa em observar mais a fundo este fenômeno. Algo que havia percebido: as mulheres estão cada vez mais conscientes de seus papéis e querem ser representadas e ouvidas.

Para que eu pudesse colher alguns dos depoimentos que leio, criei um formulário e solicitei que preenchessem. Foquei nas mulheres que atuam na pecuária leiteira, área da qual estou muito próxima. Para minha surpresa, mais de uma centena dessas mulheres respondeu. Tive respostas de meninas de 15 a senhoras de 54 anos. Todas bem informadas e buscando o melhor da vida no campo.

Os depoimentos são intensos e demonstram que elas gostam do trabalho na pecuária, por permitir uma vida mais saudável e um maior contato com os filhos. Muitas afirmaram que a rentabilidade no campo é maior do que se estivessem numa atividade na cidade. Sentem-se felizes por trabalhar no campo e o amor aos animais também é muito citado. A seguir, as considerações de algumas das entrevistadas.

Essas mulheres estão conectadas, preocupadas com o valor do seu produto e exibem, orgulhosas, os resultados laboratoriais do leite. Elas citam o Leite 4.0, querem inovações e buscam conhecimento e aprimoramento de técnicas para melhorar o bem-estar animal e a produtividade. Entre as respondentes, Maiara Lohmann Neuberger, produtora do Rio Grande do Sul, que está numa propriedade com 100% de mão de obra familiar, buscou ficar no campo para trabalhar e conseguir conciliar os cuidados com a filha. Mas não deixou de investir em conhecimento, está fazendo uma pós-graduação e quer mais tecnologia no campo.

Rosemary de Best Aplewicz tinha formação em psicologia, mas não estava atuando na área quando seu pai anunciou que iria parar de produzir leite. Ela repensou e resolveu assumir a propriedade. “Sempre digo que foi como uma luz que veio à minha mente, quando eu estava indo me deitar, logo após colocar minha filha no berço, pensei: por que não eu?”, cita Rosemary. Muitas mulheres já assumiram este protagonismo e sim, por que não elas? Para esta produtora, a atividade não é uma simples “leiteria”, mas uma pequena empresa na qual pode ter qualidade de vida, proporcionar isso aos filhos e ajudar outras famílias, oferecendo trabalho e a vivência do dia a dia. Elas pensam muito além da receita do cheque do leite.

Após finalizar a faculdade de educação física, Karen Viana, filha de produtores de leite e que cresceu ajudando a ordenhar e a tratar os animais, viu-se desafiada quando se deparou com uma vaca com problema de casco, que tinha sido descartada. Após conseguir cuidar do animal, sob a promessa de que, se conseguisse, prosseguiria na atividade, ela e o namorado iniciaram a produção. Dos dez litros diários do início, hoje produzem 600. Mas o plano, para o curto prazo, é dobrar este volume. Para Karen, a produção de alimentos é uma das mais lindas profissões, e ela sente orgulho e motivação em fazer parte da população que sustenta e alimenta uma nação.

Lariane Bombo, nascida em São Paulo com formação técnica em metalurgia, após o casamento e mudança para o Paraná, encarou o desafio de trabalhar com leite. Sem afinidade com o tema, fez cursos e se aprimorou. Hoje se diz realizada, é seu próprio chefe, mas reforça que as vacas são as patroas. E elas retribuem a dedicação com uma produção boa. Caso os resultados não sejam os esperados, ela procura relatórios para entender o que aconteceu. Comemora cada bezerra nascida. Para Lariane, a vida no campo proporciona muita tranquilidade. Mas gostaria de mais facilidade para investimentos em tecnologias e reconhece que a internet ajuda a encontrar novas alternativas para a pecuária leiteira.

Muitas citaram o casamento como o momento que encararam a produção de leite. Este é o caso de Eliziane Basi, que após o matrimônio saiu da cidade e foi para o campo. Hoje se sente muito feliz em acompanhar o nascimento de uma bezerra saudável no seu plantel, fruto de todo um trabalho. Mas ainda cita muito preconceito por ser mulher, pois, para ela, ainda há um estigma de que as mulheres não possuem capacidade para a atividade

Algo que todas demonstraram é a utilização de redes sociais; o Facebook é a rede preferida. Isto é fácil de verificar pelos grupos e páginas de Mulheres do Agro que contam com milhares de curtidas e membros. A página “Agro Mulher Brasil” coleciona mais de 70 mil seguidoras e o grupo “Mulheres do Agro” outros milhares de membros. Elas interagem e sentem prazer em postar fotos das atividades de trabalho. O WhatsApp também é utilizado e o Instagram tem crescido, especialmente entre as mais jovens.

Como elas são plugadas, a grande maioria acredita que aplicativos e plataformas digitais são importantes na pecuária.

A forma de se comunicar com essas mulheres foi pela internet, assim, era esperado que elas respondessem ter mais facilidade em acessar a rede. Quando questionadas se há acesso fácil da propriedade, menos de 5% responderam que não.

Segundo pesquisa do IBGE, dados de 2016 e 2017, os mais recentes disponíveis, o acesso no campo ainda é menor. Em média, só 39%. No entanto, as mulheres são as que mais utilizam, quase 42% delas acessam a rede. E esses dados já devem ter aumentado.

Os dados do IBGE, da pesquisa de 2016 a 2017, demonstram que há uma diferença de acesso conforme a região do Brasil, assim como ainda há menos acesso no campo que na cidade

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