A saúde do úbere para produzir muito leite depende dos cuidados no controle da mastite, principalmente no momento da secagem da vaca
VACA SECA
secagem
Hora certa de tratar e prevenir a
MASTITE
Estudos recentes indicam que a taxa de novos casos de mastite é maior durante o período seco do que durante a lactação. Infecções que se iniciam no período seco são geralmente causadas por bactérias de origem no ambiente
Marcos Veiga Santos
A secagem da vaca e o período seco são fases de grandes mudanças fisiológicas no ciclo produtivo da vaca leiteira. Em relação à saúde do úbere, esse período tem riscos de oportunidades, pois podem ocorrer novas infecções intramamárias. Mas, por outro lado, este também é um dos melhores momentos para o tratamento das mastites subclínicas, que se iniciam durante a lactação.
Desta forma, além de conhecer os riscos de novos casos de mastite durante a secagem e no período pós-parto, devemos também aproveitar esta fase como oportunidade de reduzir os casos de mastite subclínica e aumentar a imunidade da glândula mamária. De forma simplificada, o objetivo da secagem das vacas é ter o menor número possível de quartos mamários infectados na lactação seguinte e, desta forma, garantir ótima produção de leite com baixa contagem de células somáticas (CCS).
Após a interrupção completa das ordenhas, a glândula mamária passa por três fases fisiologicamente muito distintas. Durante as duas primeiras semanas após a secagem, se inicia a fase de involução ativa, na qual há grande acúmulo de leite, o que causa aumento da pressão intramamária e gotejamento de leite e, consequentemente, há maior risco de novos casos de mastite. Nesta fase, há intensa atividade das células do sistema imune, cuja atuação permite a reabsorção dos componentes do leite por até cerca de duas semanas. Ainda durante a fase de involução ativa, a maioria das vacas tem a formação do tampão de queratina, que é um tecido formado no canal dos tetos, com a função de fechamento completo da glândula mamária contra novas infecções. Após esta fase, a glândula entra em processo de inatividade, conhecido como involução completa, na qual o risco de novas infecções é baixo.
A terceira fase inicia-se cerca de duas semanas antes do parto, quando há estimulação da glândula mamária para a produção de colostro, o que envolve aumento da concentração de anticorpos no leite. Durante essa fase, ocorre a diminuição da eficácia do sistema imune e, em consequência, novamente há maior risco da vaca às novas infecções, principalmente aquelas por agentes ambientais.
Estudos recentes indicam que a taxa de novos casos de mastite é maior durante o período seco do que durante a lactação. Infecções que se iniciam no período seco são geralmente causadas por bactérias de origem do ambiente, as quais podem persistir até a lactação seguinte, manifestando-se no primeiro mês de lactação. O risco de mastite durante a secagem depende dos mecanismos de defesa da vaca leiteira e da intensidade de contaminação ambiental. Essas infecções originárias do período seco aumentam a ocorrência de mastite pós-parto, o que reduz significativamente o potencial de produção da vaca na lactação.
Quando não são aplicadas medidas eficazes de controle de mastite durante o período seco, há aumento de quartos infectados no momento do parto em relação à secagem. Vacas com histórico de mastite na lactação anterior têm duas vezes maior risco de desenvolver mastite na lactação seguinte. A maioria desses novos casos desenvolve-se no fim da lactação, durante as três primeiras semanas após a secagem e nos estágios finais do período seco.
Fases do período seco da vaca leiteira
Mastite na lactação seguinte – O método de secagem e o volume de produção de leite no momento da secagem afetam diretamente o risco de novas infecções intramamárias durante o período seco e na lactação seguinte. Atualmente, os dois principais métodos de secagem mais utilizados para vacas leiteiras são a abrupta e a intermitente. A secagem abrupta é realizada pela interrupção completa das ordenhas, cerca de 50 a 60 dias antes da data prevista do parto, independentemente do volume de produção da vaca. Após a última ordenha, as vacas devem ficar sob observação durante uma a duas semanas, para diagnóstico da ocorrência de novos casos mastite clínica. Este diagnóstico é feito visualmente, pelo aumento de volume em apenas um dos quartos mamários, o que indica mastite.
No método de secagem intermitente, faz-se a redução da frequência de ordenhas na última semana de lactação e, posteriormente, a ordenha da vaca é interrompida. Ordenhas intermitentes podem auxiliar na redução do volume de produção de leite de vacas com alta produção, o que facilita a involução da glândula mamária, reduz o risco de novas infecções (menor pressão intramamária após a secagem) e aumenta os fatores de defesa naturais contidos no leite. Este método pode funcionar bem, desde que a vaca seja ordenhada pelo menos uma vez ao dia, o que reduz a produção, mas não aumenta os riscos de novos casos de mastite antes da aplicação do tratamento de vaca seca.
O método mais simples e um dos mais utilizados é a secagem abrupta. Em vacas de alta produção, este método resulta em aumento da pressão na glândula mamária e canal do teto, o que leva ao gotejamento de leite e permanência do canal aberto por períodos prolongados. Sendo assim, uma alternativa é submeter a vaca a um manejo nutricional com a retirada do concentrado cerca de uma semana antes da secagem. Esta medida auxilia na redução da produção de leite e permite a secagem abrupta. Pela simplicidade e pelos bons resultados obtidos, quando associados ao tratamento de vaca seca, a secagem abrupta é uma das principais práticas de manejo em rebanhos nos países desenvolvidos.
Como controlar a mastite na secagem? – A formação do tampão de queratina no canal dos tetos faz parte do processo natural de involução da glândula mamária após a secagem, com a função de proteção contra a entrada de micro-organismos dentro do úbere. No entanto, em quase metade dos tetos, ocorre demora na formação desse tampão durante o período seco (até 50% dos tetos de vacas de alta produção permanecem abertos, sem a formação da queratina durante as primeiras semanas após a secagem), o que aumenta o risco de ocorrência de mastite logo após a secagem.
Além dos protocolos para a secagem correta, as vacas secas precisam estar em ambiente adequado
Para reduzir os riscos de novas infecções nas vacas nas quais não há formação do tampão de queratina nos tetos, foi desenvolvido o selante interno de tetos, que é um produto inerte, à base de subnitrato de bismuto. Ele deve ser aplicado no momento da secagem, com o objetivo de formar uma barreira física na extremidade dos tetos, que impede a entrada de bactérias causadoras de mastite. Um dos principais cuidados durante a aplicação do selante de tetos é fazer um garrote na base do teto para evitar que o produto se espalhe, pois a ação depende da permanência do selante na cisterna dos tetos (não se recomenda fazer a massagem dos tetos após a aplicação do selante). Este produto é insolúvel no leite e, portanto, não tem ação antimicrobiana. A retirada do produto pode ser facilmente realizada durante as primeiras ordenhas após o parto e não traz risco para a saúde do bezerro, caso ocorra ingestão pela mamada. Em termos gerais, o uso do selante interno em quartos sadios apresenta efeito preventivo similar ao do tratamento de vaca seca (aproximadamente 80%).
Para a terapia completa da vaca seca, além do selante de tetos, a secagem é uma excelente oportunidade de eliminar as infecções subclínicas existentes, o que para a maioria dos rebanhos é o único momento economicamente viável para eliminar as mastites subclínicas. Desta forma, o uso do selante de tetos deve ser feito em associação com a terapia de vaca seca, visando eliminar as existentes no momento da secagem.
Terapia da vaca seca – Essa terapia foi desenvolvida em 1950 e implantada no programa dos cinco pontos de controle da mastite em 1960, com o objetivo principal de controlar infecções existentes na secagem, por meio da utilização de antimicrobianos de longa duração. O uso da terapia da vaca seca no fim da lactação é uma das medidas mais importantes e recomendadas para o tratamento de novas infecções intramamárias na secagem.
Risco de novos casos de mastite
durante a lactação e período seco
Fonte: SANTOS, M. V.; FONSECA, L. F L. Controle de mastite e qualidade do leite – Desafios e soluções.
Pirassununga, 2019 (bit.ly/controledemastite)
Atualmente, considera-se essa terapia um componente indispensável para a eliminação de infecções subclínicas existentes na secagem. A terapia da vaca seca elimina em média 80-90% das infecções existentes no momento da secagem, o que comprova alta eficácia, sem a necessidade de descarte de leite.
As três propriedades dos antibióticos que indicam potencial de prevenção e cura da mastite na secagem são o tempo de ação, a concentração e a persistência do produto. Assim, um produto para secagem das vacas deve ter tempo prolongado de ação e boa difusão da droga no úbere. Adicionalmente, deve apresentar concentração suficiente para eliminar e prevenir micro-organismos causadores de mastite, com liberação lenta e que persista durante o período seco, sem causar irritações ou reações de hipersensibilidade ao tecido mamário.
O período seco é uma necessidade fisiológica da vaca leiteira e tem relação direta com a saúde da glândula mamária, produção de leite e prevenção de doenças do período de transição. O uso do tratamento de vaca seca e do selante de tetos, em conjunto com medidas de manejo para fornecer ambiente limpo e confortável para as vacas secas, são ferramentas indispensáveis de tratamento e prevenção da mastite durante a secagem. Práticas simples como essas garantem a sanidade do rebanho e promovem eficiência na produção e melhoria da qualidade do leite.
Marcos Veiga dos Santos é Professor Titular – FMVZ-USP e co-autor do livro Controle da mastite e qualidade do leite – desafios e soluções. Saiba mais em: bit.ly/controledemastite
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