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Produtor de Goiás comprova os ótimos benefícios do uso de silagem de milho reidratado na dieta de seus animais

NUTRIÇÃO

Silagem de milho reidratado

reduz custos sem afetar a produtividade do rebanho

Economia no custo da alimentação pode chegar a 15% ou mais, conforme a época da preparação da silagem, sem reduzir o volume de produção

João Carlos de Faria

Gerson Ascânio da Silva: “Eu era meio resistente às mudanças e uma das razões para isso era achar que o trabalho aumentaria”

Equilibrar receita e despesa era há tempos um grande desafio para o produtor Gerson Ascânio da Silva, da Chácara Recanto da Soneca, localizada em Corumbá de Goiás (GO), a 115 km de Goiânia. Até abril do ano passado, ele comprava cerca de 80 sacos de ração comercial por mês para complementar a dieta de seu rebanho de 21 vacas em lactação, gastando em média R$ 7 mil. A conta não fechava em sua propriedade de 9,3 hectares, que não se sustentava e o obrigava a colocar dinheiro do bolso para mantê-la. Mas tudo tomou outro rumo quando Silva decidiu seguir as orientações do engenheiro agrônomo Fausto Nogueira, técnico do Senar/GO.

Conta o produtor que, entre os desafios propostos pelo técnico, o principal era o uso de silagem de milho reidratado como fonte de energia para reduzir custos, sem afetar o volume de produção. Nogueira já vinha testando com sucesso essa receita com outros produtores atendidos por ele no projeto de assistência técnica e gerencial desenvolvido pelo Senar na região, onde ele assiste um grupo de 24 propriedades, localizadas nos municípios de Cocalzinho de Goiás, Abadiânia e Padre Bernardo, além de Corumbá de Goiás.

“Era o que eu precisava: parar de colocar dinheiro na propriedade, que precisava ser autossustentável”, lembra o produtor.

Passados oito meses, Silva foi incluído no projeto do Senar e o profissional trouxe- lhe ainda outras orientações e sugestões para melhorar as pastagens e investir no manejo reprodutivo das vacas, propondo a mudança da dieta do rebanho para a silagem de milho reidratado.

“Eu era meio resistente às mudanças e uma das razões para isso era achar que o trabalho aumentaria”, diz. Mesmo assim aceitou o desafio e nem precisou de grandes investimentos para começar, utilizando uma caixa d’água usada para fazer a reidratação e adquiriu alguns galões para guardar a mistura até fermentar.

O resultado foi muito positivo e animador, com a silagem sendo muito bem aceita pelas vacas, sem que a produção de 320 litros/dia fosse afetada, apesar de o custo ter se reduzido razoavelmente.

Além das vacas, as novilhas com mais de seis meses também passaram a consumir esse alimento. O efeito foi rápido e, entre fevereiro e maio, os gastos com ração, que representavam 46% do total de despesas, caíram para 35%.

Após passar pelo processo de moagem e ter suas partículas reduzidas a até 1,5 mm, os grãos são hidratados e posteriormente ensilados e compactados

Renata Apocalypse: “O resultado positivo está na conversão alimentar, ou seja, a vaca come menos milho e produz a mesma quantidade de leite”

Objeto de estudos – Mas, afinal, o que é a silagem de milho reidratado, forma mais correta para se referir ao concentrado rico em amido, utilizado na alimentação de bovinos leiteiros, conforme ensina a zootecnista Renata Apocalypse Nogueira Pereira?

Ela é pesquisadora, em Lavras, da Empresa de Pesquisas Agropecuárias de Minas Gerais (Epamig), e define a silagem de milho reidratado como “uma tecnologia inovadora de conservação do grão de milho moído, por meio da ensilagem, utilizada em dietas para vacas leiteiras. O processo consiste basicamente na reidratação do grão de milho moído, seguido por conservação na forma de silagem. Essa definição e outras informações e orientações constam de uma circular técnica publicada pela empresa em 2013.

O tema também é objeto de estudos da Epamig e da Universidade Federal de Lavras (Ufla) desde 2002, sob a coordenação do professor adjunto do Departamento de Zootecnia, Marcos Neves Pereira, e a participação da pesquisadora.

A iniciativa é pioneira e surgiu a partir da observação de resíduos de milho presentes no esterco dos animais, o que levou a uma constatação: “Quando você vê que os grãos de milho estão inteiros é sinal de que passaram direto e você está jogando dinheiro fora, porque do jeito que entrou, saiu. Com o fubá essa perda, embora um pouco menor, ainda vai existir”.

O objetivo dos estudos, segundo a pesquisadora, foi encontrar formas de reverter o alto grau de vitreosidade (dureza) das variedades de milho nacionais, que em geral apresentam baixa digestibilidade e reduzem a quantidade de amido disponibilizado para o consumo dos animais na forma de silagem.

Sendo assim, os estudos tiveram o intuito de reverter essa condição dos grãos nacionais e, não sendo possível “mexer” no seu padrão genético, a solução foi trabalhar para melhorar sua digestibilidade, aumentando, com a moagem, a superfície de contato dos grãos. Adiciona-se a água na proporção aproximada de 35 litros para cada 100 kg de milho moído, que, no ponto de armazenagem, tem apenas 12% de umidade, devendo atingir 35% quando ensilado, valor ideal para se ter uma ótima fermentação e estocagem do material.

“As bactérias assim conseguem atingir a parte moída e ajudar na hidrólise, combatendo as prolaminas, que impedem as enzimas de liberar o amido, o principal “tesouro” do milho, que aumenta à medida que o grão fica mais seco, podendo alcançar até 62%”, afirma Renata.

O que não se pode, segundo ela, é confundir a silagem de milho reidratado com a silagem de planta inteira, que é uma forragem, e tampouco com a silagem de grão úmido, que apresenta o índice de umidade ideal, entre 35% e 40%, mas tem janela curta de colheita e compete em área com a silagem de planta inteira.

“Tem toda a correria da colheita, chove muito e há pouca disponibilidade de máquinas e mão de obra. Na moagem não se consegue chegar a partículas menores e a umidade, que era muito boa, acaba reduzida devido a esses aspectos de processamento e de logística.” Diferentemente, no caso do milho reidratado, os grãos são moídos secos, antes de se colocar a água, tornando possível reduzir o grão a uma fração mínima de até 1,5 mm, sem o risco de “embuchar” o moinho, como ocorre com o grão úmido.

Segundo Renata, já existe até um modelo de moinho desenvolvido pela Nogueira pensado especificamente para o processamento desse tipo de silagem, mas, no caso de grandes quantidades, normalmente o ideal é usar misturadores. Ela também cita o exemplo de Ingaí, município próximo a Lavras, onde produtores se cotizaram e, por meio, da Associação dos Produtores Rurais de Ingaí (Aprin), adquiriram um triturador, para ser utilizado de forma compartilhada, atendendo hoje a cerca de 15 propriedades.

Gilson Sebastião Dias Junior: “A recomendação é de que fique pelo menos dois meses, mas o tempo de armazenamento sempre estará relacionado à necessidade de uso e à demanda do produtor”

Cuidados indispensáveis – Quem também fala sobre o processo de reidratação do milho é Gilson Sebastião Dias Junior, nutricionista da Agroceres Multimix, que enfatiza três aspectos que considera fundamentais para garantir maior digestibilidade.

“A hidratação precisa atingir em torno de 35% de umidade, devendo ser feita de forma uniforme, com a distribuição da água de forma homogênea e uso de inoculante, que é importante para aumentar os ganhos”, explica. Ele também recomenda que a medida das partículas seja em torno de 5 mm, para permitir uma melhor compactação, podendo ocorrer variações, a depender da dinâmica da propriedade e da fluidez necessária para dar conta da demanda.

O terceiro ponto, segundo ele, está relacionado aos dois primeiros e se trata exatamente do tempo de estocagem, sendo o prazo entre 7 e 14 dias o ideal para se obter estabilidade e 30 dias, no mínimo, para maior ganho de digestibilidade, que atinge seu pico em sete a oito meses.

“Como se trata de um produto caro e nem sempre o produtor tem capital para aguardar por um longo prazo, a recomendação é que fique pelo menos dois meses, mas o tempo sempre estará relacionado à necessidade de uso e à demanda do produtor”, afirma Dias.

Vantagens – Renata aponta como vantagens da silagem de milho hidratado a facilidade de preparação em períodos de menos chuva e fora da safra, quando há maior disponibilidade de maquinário e os preços dos grãos ficam mais em conta no mercado. Além disso, não precisa de grandes estruturas para o armazenamento, que pode ser feito em silos ou recipientes menores com maior facilidade para ser compactado (tambores de 240 litros), o que reduz os custos, os riscos de ocorrência de pragas, mofos e perda de matéria seca.

É o caso do produtor goiano citado no início dessa reportagem, que adquiriu inicialmente dez tambores, que são reabastecidos de acordo com uma escala de produção. Para cada tambor são usados 22 litros de água para 50 quilos de milho triturado, permanecendo a mistura por 22 dias no processo de fermentação, podendo a partir daí ser usada para alimentar o gado.

A mistura é feita numa caixa d’água de 1.000 litros e colocada depois nos tambores, onde é compactada, comportando três sacas cada um. No mês ele utiliza aproximadamente 45 sacas de milho moído. O custo dos tambores, segundo o produtor, que os adquiriu para serem pagos em duas parcelas, foi coberto logo no primeiro mês, apenas com a economia feita com o uso da silagem.

Silva afirma que, na composição dos custos com alimentação, sua despesa baixou pelo menos 10% logo no início, mesmo considerando o preço do milho que ele compra já moído.

Essa economia representa um valor anual de cerca de R$ 30 mil, conforme cálculos do médico veterinário Fausto Nogueira. “Ainda não é o ideal, mas já melhorou muito. É uma técnica que não é difícil de ser adotada e, em termos de custos, realmente vale a pena. O pequeno produtor tem que fazer essa experiência porque a questão do custo é crucial e a utilização da silagem de milho reidratado não exige tanto investimento para começar”, diz ele.

Tambores de 240 litros podem ser utilizados para o armazenamento, mas devem ser bem vedados e a silagem precisa ser bem compactada

PREPARAÇÃO DA SILAGEM DE MILHO HIDRATADO

 

1) Moer o milho em frações menores possíveis para obter boa digestibilidade

2) Incorporar água de forma uniforme para obter teor de umidade acima de 30% da matéria natural (ideal 35% a 38% de umidade) (>250 litros por tonelada de grão).

3) Usar inoculante bacteriano, encher o silo rapidamente e compactar bem, procedendo à correta vedação com lonas próprias (dupla face) ou, no caso dos tambores, com sacos de areia sobre a silagem.

4) Retirar camadas de pelo menos 15 cm/dia ao descarregar (densidade em torno de 900 kg/m³), estimando o gasto diário para dimensionar os silos.

5) A abertura do silo pode ser realizada poucos dias após a ensilagem, mas com o aumento do tempo de armazenamento ocorre ganho na digestibilidade.

6) Balancear a dieta dos animais, lembrando que milho é fonte de energia.

Fonte: Epamig

Impacto nos custos – Como se conclui, o maior impacto com o uso da silagem na alimentação das vacas é a redução da quantidade consumida, sem diminuir a produção de leite, o que representa menos despesas. “O resultado positivo está na conversão alimentar, ou seja, a vaca come menos milho e produz a mesma quantidade de leite ou até um pouco mais”, afirma a pesquisadora da Epamig.

Para Fausto Siqueira, o objetivo não é aumentar a produção de leite, mas reduzir as despesas sem perder a produtividade. As experiências que ele tem feito com pequenos produtores na região de Corumbá de Goiás, inclusive na Chácara Recanto da Soneca, lhe permitem calcular uma economia que atinge até 15%, no total de gastos com concentrado, um dos custos com maior impacto na renda da atividade leiteira, além do volumoso e da mão de obra.

“Com 50 quilos de milho seco triturado é possível obter 72 quilos de alimento com mais proteína e melhor digestibilidade”, explica. Se, além disso, conseguir comprar o milho na safra, o produtor terá, segundo Siqueira, uma economia adicional de mais 15% a 20%.

A maior digestibilidade, combinada com mais proteína e mais energia, é que faz esse tipo de silagem, segundo ele, ficar muito mais econômico e atrativo. Mesmo assim, Nogueira ainda observa certa resistência por parte dos produtores do grupo ligado ao projeto de assistência técnica e gerencial do Senar para aderir a essa prática, apesar da chance de reduzir custos e das demais vantagens apresentadas.

“Apesar de se interessarem, muitos apontam o possível aumento de mão de obra como um motivo para não utilizar, o que não corresponde à realidade. Mas é uma questão cultural e de falta de divulgação”, diz. Ele argumenta que o dinheiro economizado mensalmente poderia ser utilizado, por exemplo, na contratação de mão de obra para ajudar na propriedade.

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