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Teste é capaz de identificar animais A2A2 com a análise de uma única gota de leite utilizando um dispositivo que se assemelha a um teste de gravidez, a partir de uma amostra de leite coletada do animal.

INOVAÇÃO

Um teste rápido para identificar o leite A2

Pesquisas de startup sediada em Santa Catarina resultam numa solução rápida para testar a qualidade e pureza do leite A2, com resultado em menos de 20 minutos, e para facilitar a triagem de animais com o genótipo A2A2 da beta-caseína, agregando valor à produção

João Carlos de Faria

O leite A2 é uma alternativa para os consumidores que excluíram o alimento da dieta por apresentarem desconfortos intestinais. Por isso, o crescimento do mercado para esse tipo de leite e seus derivados pode agregar valor à produção, com um grande potencial de consumo. Nesse cenário promissor, a recente disponibilização de um teste rápido para a identificação de leite A2 tornou-se uma das novidades que tem chamado a atenção de produtores, laticínios e indústrias de lácteos.

De acordo com o Anuário do Leite (Embrapa 2023), no ano passado, o mercado global do leite A2 e seus derivados alcançou cerca de US$ 8 bilhões, segundo a empresa canadense Precedence Research, com projeção de faturamento de cerca de US$ 25 bilhões para 2030. No Brasil, a estimativa atual é de R$ 100 milhões anuais, o que significa menos de 1% do mercado, enquanto o potencial de consumo está entre 30 e 40% do total geral de leite.

O teste rápido, à venda desde fevereiro e, por enquanto o único no mercado, oferece como principal vantagem a facilidade na triagem de animais com o fenótipo, utilizando-se de um kit simples e fácil de ser aplicado, exigindo apenas uma pequena amostra de leite.

Maria de Lourdes Borba Magalhães

Segundo a professora Maria de Lourdes Borba Magalhães, professora da Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC) e CEO da startup Scienco Biotech, sediada em Lages (SC), em apenas 20 minutos é possível determinar se o alimento é livre de beta-caseína A1.

O kit foi desenvolvido a partir de estudos elaborados pela Fundação de Amparo à Pesquisa e Inovação do Estado de Santa Catarina (FAPESC), através do Programa Mulheres Mais Tech, voltado exclusivamente para startups lideradas por mulheres, para o qual, neste ano, a entidade destinou cerca de R$ 1,8 milhão para o financiamento de 20 projetos.

“Somos uma empresa de biotecnologia, 100% nacional, que desenvolve testes de diagnóstico inovadores com baixo custo, que possam ser usados por todos os produtores, agregando valor, saúde e sustentabilidade à produção de lácteos”, explica a diretora de marketing da Scienco Biotech, Jheniffer Bianchini.

Jheniffer Bianchini

Ela conta que a ideia de desenvolver o teste surgiu, entre outros motivos, a partir do histórico da filha da própria CEO da empresa, que apresentava desconforto abdominal ao consumir leite, sendo posteriormente identificada a sensibilidade à digestão do leite comum. “A partir daí, foi iniciado um trabalho de anos de pesquisa, trazendo como resultado o teste rápido de leite A2”.

A empresa é a responsável pela fabricação e comercialização do sistema, que já vem sendo utilizado na seleção de úberes A2 em fazendas nos estados de Minas Gerais, São Paulo, Paraná, Tocantins, Espírito Santo e Rio Grande do Sul, além de produtores rurais na Costa Rica, Uruguai e Coreia.

As indústrias e cooperativas têm utilizado o teste principalmente para avaliar a pureza e garantir que não haja nenhum tipo de contaminação do leite A2 com leite comum e também para controle interno de qualidade, obtendo garantias adicionais de que o leite A2 não sofreu nenhum tipo de contaminação.

No Rio Grande do Sul, já são mais de dez propriedades fazendo a utilização deste mecanismo e, de acordo com o que vem sendo observado acerca dos resultados, entre 40% a 60% dos animais já são naturalmente A2A2. Durante a Expointer 2023, no seminário sobre inovações tecnológicas, promovido no espaço do Sindicato da Indústria de Laticínios (Sindilat), houve demonstração do teste, entre outras novas tecnologias.

Também, em Minas Gerais, recentemente a tecnologia foi aprovada para participar do programa Sistema InovaLácteos (SIL) formado por quatro núcleos de inovação no Estado.

Histórico e resultados – “O teste apresentou 100% de acurácia para identificar animais A2A2 quando comparado à genotipagem tradicional. É um teste inédito no mundo, o que mostra o pioneirismo do Brasil no desenvolvimento de inovações na agropecuária. O desenvolvimento dessa tecnologia para triagem de animais e controle de qualidade de leite A2 de forma instantânea e na própria fazenda coloca o Brasil em posição de vanguarda global”, afirma Maria de Lourdes.

Segundo ela, os estudos foram iniciados há cerca de seis anos, quando pesquisadores da UDESC decidiram criar um teste laboratorial de leite A2, mas encontraram dificuldades, por questões logísticas, do envio de amostras ao laboratório para testagem, dificultando a triagem dos rebanhos e despertando para a necessidade de encontrar um formato mais rápido no qual o leite pudesse ser analisado na própria fazenda. “Assim, unimos diversos especialistas para criar esse teste rápido.”

Ela explica que o teste é capaz de identificar animais A2A2 com a análise de uma única gota de leite utilizando um dispositivo que se assemelha a um teste de gravidez, a partir de uma amostra de leite coletada do animal, podendo também detectar nos produtos derivados de leite A2 qualquer contaminação com leite betacaseína A1.

Jheniffer Bianchini, por sua vez, afirma que a ideia é distinguir qual o tipo de leite que o animal produz a partir dessa inovação para que o produtor tenha acesso à informação e possa selecionar e reproduzir os animais que produzem leite A2. Por outro lado, para os laticínios, é possível averiguar mais rapidamente se o leite que está sendo entregue pelo produtor é realmente A2 ou, ainda, se apresenta alguma contaminação pela betacaseína A1.

Desenvolvimento do teste rápido, o único no mundo, é uma prova do pioneirismo do Brasil em inovações tecnológicas para a pecuária de leite

A proposta, segundo ela, não visa apenas a venda de um produto comercialmente, mas levar ao pequeno e ao médio produtor a oportunidade de ter essa tecnologia dentro da própria fazenda. “Nós queremos que essa tecnologia e o leite A2 cheguem a todos, sem distinção, para que no futuro todo rebanho brasileiro possa ser A2.

Maria de Lourdes reforça essa tese e afirma que por isso o teste é simples de ser feito e pode ser executado pelo próprio produtor. Pode ser muito útil também para a triagem de grandes rebanhos de forma rápida e barata, identificando com precisão os animais que produzem leite livre de betacaseína A1, sem a coleta de sangue ou de pelo dos animais. Hoje, para identificar os animais A2A2, o produtor precisa coletar o pelo ou o sangue e enviar as amostras para um laboratório para análise.

“Muitas vezes o pelo pode apresentar problemas com contaminações e os laboratórios acabam solicitando a coleta de sangue, que precisa ser feita por um profissional especializado, o que agrega custo adicional com tubos e dispositivos de coleta, além do transporte até o laboratório. As análises demoram cerca de 45 dias para obtenção do resultado, o que dificulta a tomada de decisão. Com o teste rápido, o próprio produtor realiza essa análise e obtém o resultado na hora, agilizando o processo e reduzindo custos”.

Além disso, segundo ela, ter acesso a essa ferramenta significa que o produtor terá nas mãos a possibilidade de produzir um leite de melhor digestibilidade e maior valor agregado, o que pode refletir em aumento de rentabilidade, maior conhecimento do seu rebanho, seleção genética e agregação de valor.

A diretora de marketing da Scienco Biotech explica que o teste rápido não substitui o teste de DNA, usado para certificação. O teste rápido é apenas para identificar rapidamente os animais A2A2 a um custo mais baixo e mais rápido. Se a fazenda deseja obter uma certificação, pode economizar dinheiro fazendo o teste completo de DNA apenas nos animais que já foram identificados como A2A2 no teste rápido, em vez de testar todos os animais.

“Ou seja, o teste permite a identificação imediata dos animais A2A2, agilizando a triagem e seleção dos rebanhos. Além disso, o teste detecta pureza do leite A2 e serve como controle de qualidade na indústria láctea para garantir que o leite A2 seja realmente livre de betacaseína A1”.

Avaliação – Dois médicos veterinários ligados à cadeia do leite, indagados pela Balde Branco, demonstraram boa receptividade ao teste rápido, com algumas observações.

Um deles, o pesquisador científico e diretor do Centro de Pesquisa em Genética e Biotecnologia do Instituto de Zootecnia da Secretaria de Agricultura e Abastecimento de São Paulo, Anibal Eugênio Vercesi Filho, entende que o teste funciona muito bem para a triagem do produto, mas não para a genotipia de animais.

João Bosco Junior

“Ou seja, é interessante para triar o leite na captação, ali antes de colocar no caminhão ou na plataforma do laticínio. Isso é importante para facilitar a logística de todo o processo, inclusive pela rapidez com que sai o resultado”. No caso da triagem de animais, segundo ele, obrigatoriamente precisa ser feito por teste de DNA para cumprir a legislação pertinente.

No caso do médico veterinário João Bosco Junior, que atua de forma autônoma em fazendas do Vale do Paraíba paulista, a avaliação também foi positiva. Ele conta que ficou sabendo do teste pela Internet e que logo entrou em contato para conhecê-lo na prática. “O teste funciona muito bem e pode agregar valor ao leite e derivados, principalmente para quem faz o processamento da sua própria produção”, afirma.

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