Ureia cara, imprescindível; nitrogênio abundante

Observe à sua volta, caro leitor: em qualquer propriedade leiteira você vai encontrar concreto; aço; plásticos e… amônia. Esta última principalmente na forma de adubos como ureia, oriundos da amônia sintética. Esses quatro materiais são considerados fundamentais para a existência do mundo como ele existe hoje, pilares da nossa civilização. Estudos indicam que os quatro materiais continuarão a ser usados em quantidades cada vez maiores durante as próximas décadas.

Paradoxalmente, o nitrogênio é 78% do ar que respiramos. Apesar de abundante, ele não é disponível dessa forma. Em 1898, o cientista William Crooke afirmou, perante membros da Sociedade Britânica para o Avanço da Ciência, que o desafio de obter fontes solúveis de nitrogênio seria vital para a humanidade não sofrer a falta de alimentos. Dez anos mais tarde, os professores Fritz Haber e Robert Le Rossignol, com apoio da empresa Basf sintetizaram amônia (nitrogênio mais hidrogênio) usando alta pressão. A escala industrial desse método, utilizado até hoje, foi obra do engenheiro Carl Bosch em 1913. As enormes quantidades de gás natural necessárias para sua produção são justificadas economicamente pela sua importância na agropecuária e na indústria.

Bactérias do solo que possuem enzimas chamadas nitrogenases quebram a ligação entre os átomos de nitrogênio gasoso, disponibilizando esse elemento essencial para as plantas. Como comentei na coluna de março de 2023, o trabalho de colegas da Embrapa e de universidades transformou o conhecimento científico nas tecnologias para a fixação biológica do nitrogênio que dão enorme competitividade à soja brasileira. Recentemente, outras culturas foram beneficiadas por esse conhecimento incluindo inoculantes para cana-de-açúcar e braquiária. Em breve outras forrageiras como o capim-elefante serão incluídas na lista.

Pouco mais da metade dos 220 milhões de toneladas de nitrogênio necessárias para a atual produção agrícola mundial é proveniente de amônia sintética. Isso porque é impossível encontrar esterco suficiente ou cultivar áreas para adubação verde (“perdendo” uma das safras anuais de grãos) para zerar a demanda por nutrientes atendida pelos fertilizantes químicos, sem falar da mão de obra e do gasto com combustíveis que seria necessário para espalhar/incorporar tudo. Contudo, cabe reforçar: práticas para aumentar a matéria orgânica no solo devem ser rotineiras, pelos seus benefícios na melhora da estrutura do solo, aumentando o armazenamento de água e favorecendo o bioma do solo; este, por sua vez, aumenta a tolerância das culturas de grãos e de forragens a doenças e pragas.

Se a amônia usada para a fabricação de ureia é imprescindível, por outro lado é possível diminuir a quantidade dos caros adubos nitrogenados aplicados nas pastagens e nas culturas. Aqui entram os produtores profissionais de leite (e carne): aqueles que adotam práticas de gestão e são receptivos às tecnologias inovadoras como inoculantes para pastagens e culturas são mais eficientes e sustentáveis. Têm como resultado mais lucratividade. E, de quebra, atendem às expectativas dos consumidores por produzirem com menor impacto ambiental. Vale lembrar que para que haver continuidade nessas entregas é essencial o apoio de toda a cadeia produtiva para o financiamento de pesquisas e inovação.

Tecnologias poupadoras de energia como bioinsumos são tendência sem volta para o Brasil aumentar a competitividade da sua cadeia produtiva de leite e lácteos. Sem depender de importações para atender seu crescente mercado interno, viabilizando o aumento da nossa produção e a exportação de lácteos de qualidade, no atual cenário de oferta mundial relativamente restrita de leite devido à limitação por terra, água e menor interesse pela produção em outros países.